Eu não tenho medo dos mortos,
eles estão lá para dizer que devo seguir,
andar a cavalo, tomar o trem, me embriagar,
beber da aguardente que servem no bar,
comer o pudim ou a melancia, o atum;
eles estão lá para me dizer
que meus medos serão enterrados, um dia,
como todos os meus pecados,
sem favor algum,
sem poesia...
A terra foi feita para senhores e escravos,
foi assim desde o começo e será assim
até que se acabem os martelos e os cravos,
até que o homem pare de aprisionar
seu semelhante,
tudo recomece num dia de sol,
quente, brilhante...
Enquanto isso nasce um herói aqui, outro ali,
que morrem por ideais altruístas, soberanos,
nem sabem dizer se era melhor ficar ou fugir,
foram levados pela correnteza, sem planos...
Enquanto isso o oceano bebe óleo e gasolina,
as florestas comem salada de fogo e brasas,
o campo para o centeio se torna a esquina
para aqueles que derrubam, dos outros,
as casas...
Eu, que ainda estou vivo,
passo os dias escrevendo sobre o futuro,
essa coisa que só vemos os olhos sobre o muro,
eu, mero escrevinhador, que vivo cá comigo...
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