Eu gostei de você, e você sumiu.
E levou junto a voz suave que arrepiava meu corpo. Tornou-me lembranças em uma tarde sozinha com a xícara de café e seus livros favoritos. Fiquei com suas músicas e seus contos, mas você levou tudo aquilo que ainda não havia me contado. Todos as reflexões que ainda não havia estimulado em minha mente, todos os finais de frases interrompidas ao meio.
Você sumiu e levou aqueles filmes que planejou ver comigo e nunca vimos. Aliás, eu ainda não sei o nome daquela música que você acordou cantarolando naquela manhã e ficou de procurar depois. E aquela promessa de que me ligaria um dia desses você levou também.
Você era interessante e é uma pena que eu não vou ver aquele seu sorriso torto de perto novamente. Eu tinha aquela sensação tola de que sua vida se encaixava delicadamente na minha, sem nada forçar. De que seu beijo era terno só porque era minha boca em que encostava, de que aquela sua paz era consequência da minha companhia. De vez em quando vem aquela sensação que deixei escorrer pelas mãos a melhor pessoa que eu poderia ter por perto, mas na maior parte do tempo eu sei, foi você quem quis partir.
Eu gostei de você, mas não se preocupe comigo. Outros virão. E é verdade, não serão como você. Terão cada um, características peculiares, algumas que até poderão me remeter a lembranças suas, mas outras excêntricas e inusitadas que vão me levar ao delírio como você o fez. Como os anteriores também fizeram. Em relação a isso eu, você e os que virão podemos ficar tranquilos: não sou de comparar, gosto de perceber o que há de extraordinário em cada um porque sempre há. Mesmo que eu não ache um olhar doce como o seu, olhares diferentes hão de me encantar. Eu irei satisfazer meus desejos em outro corpo, e eles poderão não ter o formato e a textura que o seu tinha, mas ainda vou sentir o prazer. Os cheiros novos que vão me invadir nunca se igualarão ao cheiro de café, cigarro e perfume que ficava no ar quando você passava o dia lá em casa, mas eu vou estremecer e sorrir ao senti-los também.
Eles poderão não gostar de café, mas vão gostar de chá. Ou suco. Ou cerveja. Se eu der sorte, até tequila. Eles podem não ouvir Radiohead e Beatles, mas meu gosto musical é eclético demais para limitar combinações. Eles podem não ter uma banda, mas vão ser escritores. Ou desenhistas. Quem sabe, encontro um ator por aí.
Porque sim, você foi único, mas não o meu único. Não desmereço aqui toda a sua gentileza, tudo o que aprendi e os dias que passamos juntos, não desminto que eu disse que você era especial. Ainda é, mas agora é passado também, e eu vou ficar bem. Sozinha, acompanhada pelo próximo, sozinha novamente e assim sucedendo-se. Eu entendo bem como essa bagunça funciona e não me frustra. Na verdade, eu sou fascinada por esse jeitinho no qual a vida decorre. Me deixa inquieta, me traz o dinamismo que eu tanto aspiro e me encanta. Então, se sua vontade não está de acordo, eu concordo que não me chame, que não volte. Vivemos momentos interessantes, tivemos um caso inusitado, mas eu sei que ás vezes acontece que fogo apaga de repente. Você também não foi o único que fez isso comigo e eu também o fiz com outros.
Confesso que ainda vou refletir muito se me entreguei demais, se entendi errado, se vivemos muito em muito pouco tempo. Mas, cedo ou tarde, eu chego numa conclusão e arquivo mais esse caso naquela gaveta que já é cheia.
Eu gostei de você, e você decidiu sumir.
Mas não se preocupe, eu entendo. Acontece.
E eu vou ficar bem.
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