Um dia, à revelia da minha sina,
amei uma mulher de tal forma
que larguei o hábito de rezar
e desvesti-me da batina...
Pus-me à serviço de um mosteiro,
de dia rezava e rezava e rezava
e de noite usava o banheiro...
Criei feridas nas partes pudendas,
feridas essas que nomeio de horrendas,
nenhum designer desenharia,
nenhum pintor faria...
Fui posto porta afora por incitação
ao prazer robusto e à procriação,
que não seria capaz de sair do eu
e menos ainda tornar-me oferenda a Deus...
No mundo vasto e desumano fui lançado,
sem possuir bens e nem profissão definida,
aceitei ser o pecador e fiel ao pecado,
assim modifiquei de vez minha vida...
Tornei-me frequentador de prostíbulos,
curei-me à força de magia e unguentos,
tão são fiquei por fora, belo Narciso,
que adquiri beleza igual por dentro...
Domei os que à minha volta impunham força,
construí o espetáculo da fortuna,
os que me afrontavam mandei à forca,
cerquei-me de feiticeiras e runas...
Bateram à minha porta, um dia,
de leve e com ar de urgência,
abri, lá estava a minha poesia,
amada outrora, em minha presença...
Abracei-a como se abraça o passado,
fiz com que se recuperasse dos males,
tornei-a minha amante, amor renovado,
nos casamos em outubro, em Manisales...
Lua de mel em Las Vegas, dinheiro a rodo,
chamei um padre para a união sacramentar,
padre esse que não veio, deu-nos um logro,
tinha largado a batina para se casar...
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