Olá pai,
Tentei começar esta carta milhares de vezes mas não conseguia encontrar a forma certa de o fazer. E isso aconteceu porque não existe uma forma certa para isto.
Então eu vou apenas falar, falar o que eu nunca falei…
Tantos anos a tentar perceber o porque das suas ausências, tantos anos a tentar perceber o porque do presente do dia dos pais ser oferecido a mulheres, tantos anos a tentar perceber porque não o tinha nos meus dias de anos...
Tantos anos a tentar acreditar que era um bom pai, tantos anos tentando compensar a ausência com presentes, tantos anos de desculpas...
Discussões, distância, confusão, sentimentos mistos...
"Seria a culpa minha?", "Eu não sou boa o suficiente para ele?", "Eu devia ser um bom motivo para ele ficar". Milhares de perguntas feitas em noites escuras, deitada em uma cama com a almofada completamente molhada e gelada com lágrimas descontroladas que eram controladas a frente dos outros, sempre que o seu nome era o assunto.
Demasiadas responsabilidades para uma criança lidar, uma infância destruída pela força com que teve que crescer para poder lidar com problemas que deviam ser de adultos.
Situações passadas em pequena que ficaram marcadas na memoria adulta, para sempre.
18 anos a tentar perceber, mas essa compreensão acabou com o seu: "Eu não quero saber de nada".
Agora, eu também não quero.
A inocência da criança acabou, a consciência das coisas reinam agora.
Brincou de esconde-esconde o quanto quis durante tanto tempo mas as escolhas agora sou eu que as faço.
Não quero mais vindas e idas surpresas, entradas e saídas da minha vida quando bem lhe apetecesse, palavras fofas em bons dias e desprezo na maioria dos dias. Agora o controlo sou eu que o tenho.
Escolheu a ausência na maioria da minha vida, mas a distância definitiva, escolho eu agora.
Podia dizer que o perdi mas simplesmente não se pode dizer que se perdeu algo que raramente se teve.
Houve amor, ainda há amor, sempre haverá amor, foi ele um dos motivos da minha existência neste mundo, mas a raiva e o ódio simplesmente abafam esse amor..
Pai, palavra que na vida de a maioria é motivo de felicidade, na minha foi motivo de sofrimento.
Desde pequena que o meu sonho sempre foi ter uma família como todas as minhas amiguinhas. Poder ter a sensação do que era ser a menininha do papa, a princesinha da sua vida. Nunca realizei esse sonho, sempre vivi num pesadelo que trazia os sentimentos completamente opostos aqueles que sempre desejei…
Mas esse sonho acabou quando a inocência da criança que tinha em mim foi destruída por adeus sem data de reencontro, uma saudade do seu abraço nunca saciada, e palavras de carinho sem retorno.
Não vale a pena querermos ser a princesa na vida de alguém quando essa pessoa se comporta como se nem conhecida eu fosse.
Hoje eu não quero ser mais a princesinha da sua vida.
Hoje eu quero ser a rainha da minha vida, onde ele simplesmente não faz parte…
Comprimentos da Flávia, que
foi um dia tua princesa.
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