pequena prosa poética



Sento-me no degrau da porta, a voz de minha mãe já faz eco cumprimentando os vizinhos, cresce a minha alegria enquanto os raios do sol dourados desaparecem no horizonte.
Esta noite tive um sonho, minha mãe me olhou, mas nada me disse, encostou-se à lareira negra do fumo de tantos invernos, parece que me perdeu ou serei eu que a perdi a ela? O sol pôs-se, foi-se embora como sempre e eu sombriamente também me vou sem saber se voltarei.
Penso nesta coisa estranha que é a nossa aproximação no sonho aos que partiram, também meu pai está na eira joeirando o trigo, passo por ele mas não me vê. a noite aproxima-se e dentro do peito levo a dor inconsolável da solidão e a boca levo a moer rezas para que o sonho não seja ilusão. Há-de brotar em mim a força de novo e serei passarinho voando em liberdade bailando no vôo, e ninguém me roubará a esperança de continuar a sonhar...
No mar salgado das minhas lágrimas, já não há mais para chorar, caí do baloiço, bati com o nariz no chão e o choro afogou-me as palavras.
Amanhã vou tomar banho ao rio, vestir uma roupinha nova, que domingo é o primeiro dia das festas da Srª da Vitória, calçarei sapatos novos...não há nada que crie mais expectativa do que a véspera da festa na aldeia, as pesssoas ficam mais afectuosas, há uma epidemia de optimismo, esquecem-se as amarguras da vida, então todos tomam banho no alguidar de zinco, menos eu, que prefiro o rio, e lá vamos à festa onde há sempre um bardo com rimas e a filarmónica tocando .........«os souvenirs».
Ainda me prende o cordão umbilical a este lugar, nasci com tão poucos quilos que é de espantar que tenha resistido, às vezes me debato com os sonhos, por não me deixarem continuar... sobe a saudade, e há uma voz que me canta e me embala e lá no fundo do sonho, bem lá no fim...regresso à saudade de mim.

natalia nuno
rosafogo

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