Novamente estou aqui sentado em meu lugar de sempre.
A cada dia passa por mim um figura diferente. Anteontem o engraxate. Ontem o vendedor de doces. Hoje, por ser quarta-feira, o pamonheiro.
E lá está ele, com o seu carrinho todo caracterizado parado sobre a calçada. Um guarda-sol e banquinhos. Transeuntes passam de um lado para outro, ora desviando-se do insistente vendedor, ora parando e comprando o produto. Alguns consomem ali mesmo. Outros levam para seus lares ou talvez para seus locais de trabalho, pois aqui ao redor existem enormes office-edifícios.
E o pamonheiro fala pouco. Às vezes um chamado aqui: — “Olha a pamonha!” Às vezes outro chamado de atenção ali — “Quer experimentar?” O moribundo se dá ao luxo até de oferecer uma rápida degustação. Acredito que tem funcionado, pois às vezes dezenas de pessoas o cercam e, quando elas se dissipam, o observo contando dinheiro e o metendo nos bolsos. Agora ele está mais esperto: toda sua féria ele não mais coloca em um só bolso... depois do dia que fora assaltado e levaram tudo que havia lucrado, distribui então em vários bolsos. Assim, se alguém o visitar, perderá pouco.
De vez em quando uns fiscais da prefeitura param lá. Verificam sua licença e depois se vão. Em outra ocasião para uns policiais. E o pamonheiro lhes oferece o seu produto. Consomem, conversam, sorriem. Parece um novo mundo, um mundo de gente feliz... feliz? Como as pessoas podem ser felizes, andando, trabalhando, comprando, comendo... de manhã, uma linda manhã. De repente já meio dia e depois tarde... vem a noite e... bem o dia passa rápido. Tudo passa rápido, mas não para o meu pamonheiro. Lá continua ele vendendo o seu produto derivado.
Pergunto-me que sorte de pessoa eu sou. Não me imaginaria vendendo pamonha. Quando é época de safra, o milho barateia, mas quando está fora de safra, o milho sobe de preço e, daí, a choradeira dos clientes:
— Ih! Tá muito caro essa pamonha!
— O preço tá amargo!
— Hoje não!
E lá vai o pamonheiro, sorridente, sem perder a placidade, explicar tal motivo; repete tudo para cada questionador e não se cansa e nem se amofina.
Eu não teria tal paciência. Mas ele tem. Às vezes o flagro me observando. Deixa resvalar um sorriso, joga a toalha nas costas que é um trejeito seu e logo se ocupa em higienizar o carrinho com seus produtos.
E mais pessoas chegam. Observam. Degustam e compram. E depois o pamonheiro sorri, conta o dinheiro, distribui pelos bolsos e depois organiza novamente. Uma repetição sem tamanha para ele nada enfadonha.
Eu continuo aqui, sentado, sem me mover muito. As pessoas passam por mim, me observam. Algumas meneiam a cabeça penosamente, outras nem me olham.
Fico mesmo observando o pamonheiro, enquanto o tempo vai passando. Como persevera em sua labuta. Pobre coitado! Como é incansável. E o dia vai terminando.
Então o pamonheiro recolhe os bancos e a cobertura do carrinho. Sorri. Vendera tudo! Mais um dia concluído com sucesso.
Vejo ele então atravessar a rua e vir em minha direção. Quando se aproxima de mim, abaixa-se um pouco e joga três moedas no chapéu aos meus pés, com olhar penoso e talvez pensando quanta sorte ele tem!
Eu lhe agradeço com um — “deus lhe pague!” e ele vai embora, empurrando seu carrinho, todo feliz por ter feito uma boa ação ou talvez sorrindo pela boa féria do dia e ansioso para chegar em sua humilde casa e rever a família. Daqui a pouco rastejarei para uma marquise e ali pernoitarei.
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