A Oração de Castro Alves
Já se foram tantos lustros, tantos
Desde que se partiram os grilhões
Que cerravam crianças, mulheres e santos
Aos cargueiros, amontoados nos porões.
Quando a gente, gente mesmo não era
Tinha dono, tinha açoite, tinha choro
Na outra ponta do látego, a fera
Regia nas senzalas um noturno coro.
Foi quando veio o sublime poeta
Ensinar a cada um daqueles coitados
Oração que tocava a alma mais abjeta:
Senhor Deus dos Desgraçados!
Hoje, talvez nem tantos anos passados
Oremos: Senhor Deus dos Desgraçados!
Por todos os infantes nunca encontrados:
Senhor Deus dos Desgraçados!
Pelos muitos soluços amordaçados:
Senhor Deus dos Desgraçados!
Por cada pai e mãe desesperados:
Senhor Deus dos Desgraçados!
Por aqueles que olham para outros lados:
Senhor Deus dos Desgraçados!
Por aqueles que duvidam, desconfiados:
Senhor Deus dos Desgraçados!
Por mim, por nós, que permanecemos sentados:
Senhor Deus dos Desgraçados!
Senhor Deus!
Senhor!
Sss...
(J. Miguel - 03/abr/2007)
Obrigado, Castro Alves! Ainda estamos em dívida.
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