Andar de ônibus é realmente uma arte. Ou melhor, um esporte. Todos os dias eu sinto aquela angústia enquanto caminho em direção ao ponto. Penso em distrair lendo um jornal enquanto espero. Mas desisto logo, pois já perdi um ônibus assim. Então distraio pensando em como vou dividir entre a familia o prêmio da mega sena. "Tanto pros irmãos, tanto pro meu pai, minha mãe", e juro por Deus que até os sogros eu coloco na listinha. Decido construir um prédio e dar 4 apartamentos pra cada filho, sobrinhos e enteada. E por aí vai... o tempo passa rapidinho e o dito chega. Pisssssssssssssssss... aquele barulho na cara da gente.
Descem três, sobem nove, deixando matematicamente injusta a viagem. Faz aquele trenzinho rumo a roleta, vai lotando o corredor de trás e sempre quando chega a minha vez de passar fico impedida. Pronto, virei a anta da roleta. Isso sempre acontece comigo.O motorista fica puto, o cara atrás de mim sabe que a culpa não é minha, mas a mulher gorda logo depois não. Então dá aquela cutucada nele, que ricocheteia em mim. Mas ainda tem o consolo que o problema é do excesso de população. Pior mesmo é quando entalo por causa da minha bolsa. Nossa como ela é enorme. Tem tanta coisa indispensável que não uso , "que só cê vendo". Dou aquele passinho pra trás, jogo ela por cima e empurro com a barriga, perna e quadril. Menos 300 calorias. Arranca, sacode, freia.
Cheguei no corredor lotado e aí vem a serventia dela. Fica quase impossível arrumar um encosto de banco pra segurar e como sou baixinha nem sempre alcanço o ferro do teto. Por isso a bolsa é indispensável, Ela me ajuda a encalhar entre os passageiros e ser transportada em segurança. Vou equilibrando, fazendo aquele movimento de surfista, alternando a inclinação do corpo de acordo com o movimento do "balaio". Isso mesmo, balaio, não encontrei definição melhor pro transporte urbano. Deveria inclusive ser legalizado como esse o nome oficial.
Começa então o exercício de previsão do futuro. Analiso criteriosamente a cara dos passageiros sentados, tentando advinhar qual vai descer no próximo ponto. Não é difícil. É mais ou menos assim: O que levantar o pescocinho pra enxergar a rua é porque tá chegando a hora do desembarque. Então vou pra perto dele, incomodando a todos com a bolsa, e fico do lado na espreita. Sempre dá certo. Sento e mais uma vez evito ler alguma coisa. Já perdi o ponto assim também.
Teve um dia que fui puxar a cordinha e levantei de uma vez. Esqueci que além da mega bolsa, estava transportando uma segunda bagagem com uma garrafa de café (as vezes levo isso pro trabalho). Não é que ela caiu, (não satisfeita) quebrou e aquele cheirinho gostoso invadiu o ar ao mesmo tempo que escorria e fazia lambança pelo chão. Morri de vergonha, fiquei chateada pelo café, desci sem olhar pra tras e escapuliu aquele risinho sacana. Aquele de canto da boca sabe? Me senti vingada!
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