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Atualização jurisprudencial
Isadora Welzel

Embora o estudo da jurisprudência seja permeado por dificuldades, em muitos concursos públicos, há questões discursivas e orais sobre casos já discutidos em tribunais superiores, além disso o estudo dos precedentes favorece uma bagagem jurídica que proporciona entender o perfil das decisões e melhorar a argumentação jurídica, visto que muitos julgados possibilitam entrar em contato com o raciocínio jurídico do julgador. Nos últimos 5 anos, as provas dos concursos em maior ou menor grau cobraram questões já discutidas pelo STJ e pelo STF.

Jurisprudência enquanto conceito é um conjunto reiterado de decisões proferidas por um tribunal, mas isso mudou com o tempo, já os informativos são publicações semanais em que o tribunal divulga as principais decisões recentes, de modo que é importante manter-se atualizado e consultar os sites oficiais. Necessário ter uma estratégia para filtrar quais são os informativos são de maior relevância a depender do tema, considerando-se os assuntos mais cobrados conforme a carreira pretendida. Ainda, outra dica é reler os julgados e revisá-los periodicamente, visto que eles são fonte de explicação sobre o direito aplicado.

Ainda, o estudo ativo facilita que o estudante conecte as decisões, nos casos em que um julgado destoa, por exemplo, de uma decisão já preestabelecida, então mais que estudar e memorizar os principais precedentes, é fundamental conjugar esse conhecimento com o estudo da legislação. Ressalta-se que aquilo que os tribunais decidem nem sempre é a redação literal da lei, isto porque muitos estudantes estão acostumados com a lei em si sem considerar outras interpretações apresentadas pelos tribunais.

Quais julgados merecem estudo especial no estudo da jurisprudência?
R: Além de ter em mente a carreira com suas respectivas particularidades, essencial definir que há julgados decididos pela sistemática de recursos repetitivos (STJ) ou sob a sistemática da repercussão geral (STF). São temas selecionados pelos tribunais superiores a partir de vários julgados semelhantes, criando as teses, que são de extrema importância, porque elas são uma predileção do examinador. Ainda, necessário conhecer as súmulas e as súmulas vinculantes, editadas pelo STF.

Até quando é preciso retroceder nos estudos dos julgados?
R: Recomenda-se o estudo de até no máximo informativos de 2 anos atrás, antes disso não seria estratégico, já que os informativos mais antigos estão incorporados a outros textos, doutrinas, além do fato de que podem levar a se questionar se o seu entendimento ainda está em vigor.

Sobre as decisões que não são matéria de informativos:
R: É bastante raro que um julgado cujo assunto não foi matéria de informativo seja cobrado em provas de concurso. De 15 em 15 dias, o STJ divulga uma edição de jurisprudência em teses, listando os entendimentos sobre determinado assunto, é um material excelente para revisão, já que é bastante sucinto e separado por temáticas.

Técnicas de revisão de jurisprudência, inclusive no pós-edital:
R: identificar após análise do edital quais são os temas e a partir deles, buscar os julgados mais importantes, ainda, estudar os conteúdos sem se apartar dos entendimentos jurisprudenciais, porque o estudo da jurisprudência além do acompanhamento dos informativos envolve a sua inserção na teoria já consolidada, tal é a sua razão.

A cobrança mais incisiva da jurisprudência nos concursos reflete a prática forense e as tendências decisórias, em um movimento que se consolidou com o Novo CPC, que valorizou os precedentes. Se há um precedente vinculante que não ampara o pedido do autor, por exemplo, a pretensão em sentido contrário à jurisprudência possivelmente encontrará óbices à sua satisfação.

1. Novidades jurisprudenciais em direito processual civil
• Tutela provisória
Fixação da tese em repetitivo (Tema 692) pelo STJ em 2014, com base nos arts. 320 e 520 do CPC (responsabilidade objetiva). A primeira turma do STF chegou a decidir de modo contrário, mas em outros julgados, o Supremo definiu que não lhe compete a análise do tema, inclusive decidindo que o assunto não tem repercussão geral - Tema 799. Portanto, mantém-se o entendimento do STJ, que reafirmou a Tese 692 em reapreciação em 2022, e que foi complementada em 2024.

Antes de 2019, o STJ entendia que o INSS deveria cobrar judicialmente os valores recebidos a título de tutela de urgência, o que foi superado com as atualizações previstas na L. 13.846/2019, que permitiu o desconto pela via administrativa (art. 115).

IAC 17: possibilidade de rediscussão em ação individual de coisa julgada formada em ação coletiva. IAC 14 cancelado em razão do Tema 1.234

Salienta-se em breve adendo para melhor compreensão, que a tutela provisória divide-se em tutela de urgência (antecipada ou cautelar, sendo que ambas podem ser requeridas antecedentemente ou incidentalmente) e tutela de evidência, que apenas pode ser incidental. Apenas a tutela antecipada antecedente gera estabilização, conforme o art. 304 do CPC, havendo a estabilização da tutela em caso de não interposição de recurso de agravo de instrumento. No entanto, outra turma divergiu e entendeu que não apenas o agravo de instrumento é impeditivo da estabilização, mas qualquer forma de irresignação ou impugnação também a impede

• Procedimento comum
Hipótese de morte de umas das partes (art. 313) - súmula 642 do STJ no caso de direito transferível. No caso de intransmissibilidade, impõe-se a extinção do feito sem resolução do mérito - ex: demanda de alimentos e divórcio. Em 2024, um julgado do STJ bastante peculiar considerou ser possível a decretação do divórcio quando um dos cônjuges falece após a propositura da respectiva ação, quando manifestou-se indubitavelmente concordando com o pedido que fora formulado em seu desfavor, tendo os herdeiros do cônjuge falecido legitimidade para prosseguir no processo.

Ainda, o art. 313, §2°, II fala em não atendimento no prazo designado: prescrição da pretensão de habilitação é diferente do não cumprimento do comando judicial, levando à extinção sem mérito. Quanto à pretensão de habilitação, se a morte suspende o processo, não corre a prescrição, inclusive em execução. 2024: Tema 1254 do STJ, buscando uma definição ante a obscuridade da lei

O direito do autor de desistir de ação de oferecimento de alimentos não pode se sobrepor ao direito da demandada pela busca de uma decisão de mérito, ainda que o pedido tenha sido apresentado antes da contestação, quando a homologação da decisão prejudicar pessoa com deficiência (síndrome de down) - art. 485, §4°.

Outro julgado interessante de 2024: definiu-se que não incide a obrigatoriedade de prévia audiência de conciliação prevista no art. 334 do CPC, no procedimento especial da ação de busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente, não resultando sua ausência em nulidade. Nos casos em que a audiência é obrigatória mas o magistrado não a designa: STJ entende na linha do pas de nulité sans grief (não há nulidade sem prejuízo). A pacificação do assunto ocorrerá no Tema 1271, afetado no ano passado.

Nos termos do Código Civil e do CPP, sabe-se que as instâncias são independentes, contudo o juízo cível ficará vinculado à conclusão do juízo criminal se este decidir pela inexistência do fato ou negativa de autoria. A lei de abuso de autoridade (L. 13.869/2019) acrescentou que também faz coisa julgada em âmbito cível e no administrativo-disciplinar, a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em estado de necessidade, legítima defesa ou estrito cumprimento do dever legal + Informativo 828 do STJ (sobre medida de segurança - sentença absolutória imprópria). Se a absolvição for por outro motivo, a decisão no juízo penal não vincula o cível.

• Coisa julgada
Coisa julgada progressiva: há uma corrente (STF e TST) diz que existe coisa julgada progressiva. Incorpora a teoria dos capítulos da decisão, devendo ser a coisa julgada progressiva sua decorrência lógica. No caso de existência de capítulos autônomos em ação rescisória, a primeira turma do STF já decidiu que o prazo decadencial deve ser contado do trânsito em julgado de cada decisão (cada capítulo) + Súmula 514 e Súmula 100, II do TST. Outra corrente (STJ) posiciona-se no sentido de que não há - Súmula 401 do STJ, que se assemelha ao art. 975 do CPC. Mas em 2024 o julgado admitiu a coisa julgada progressiva, sendo albergada pelo Diploma processual.

O STJ não admite a relativização da coisa julgada quando houve reconhecimento do vínculo na primeira demanda pela recusa do investigado ou de seus herdeiros em comparecer ao laboratório para a coleta de material biológico, não sendo possível uma segunda demanda (negatória de paternidade), pedindo agora o exame de DNA. Todavia, em um caso diferente e interessante, o STJ entendeu pela relativização da coisa julgada em um caso no qual desconsiderou a primeira coisa julgada para privilegiar a verdade real obtida por meio de prova científica em junho de 2024.

• Procedimentos especiais
Ação possessória: quando o litígio envolve quantidade significativa de pessoas, os juízes não estão mais concedendo liminar para desocupação massiva, mas sim remetendo os casos para comissões de conflitos fundiários, a fim de reduzir os impactos habitacionais e humanitários, buscando-se uma solução autocompositiva.

Divórcio e separação: caso haja acordo, os cônjuges podem pleitear ao juízo a homologação do divórcio ou da extinção da união estável. Em caso de não haver acordo sobre a partilha, o art. 731 prevê que esta se fará após homologado o divórcio. Ainda, a súmula 197 do STJ afirma que o divórcio pode ser concedido sem que haja prévia partilha dos bens. Segundo o STJ, a partilha é direito potestativo que não se sujeita à prescrição ou à decadência, podendo ser requerida a qualquer tempo. Até 2024 podia-se realizar o divórcio por meio de escritura apenas se não houvesse nascituro ou filhos incapazes, devendo constar neste documento as informações do art. 733. O CNJ publicou a Resolução 571 permitindo divórcio e inventário extrajudicial mesmo quando envolver filhos menores de idade

Ação de exigir contas: fase de certificação e de apresentação de contas e verificação de débitos e créditos. Ao julgar improcedente a primeira fase, torna-se impossibilitada a segunda, no caso de procedência, trata-se de decisão interlocutória contra a qual é cabível agravo de instrumento. O STJ afirmou que essa procedência pode ser total ou parcial.

• Fase executiva
O STJ não permite mais a penhora de salário para pagamento de honorários, sendo tal posição pacificada no Tema 1153

A ausência de comprovação pela parte executada de que o imóvel penhorado é explorado pela família afasta a incidência da proteção da impenhorabilidade, sendo tal posição reafirmada no Tema 1234 do STJ.

A corte especial prolatou uma sentença importante no início do ano passado, pacificando que deve haver uma diferença a depender da modalidade de reserva financeira para fins de impenhorabilidade: se o dinheiro foi depositado exclusivamente em caderneta de poupança, a impenhorabilidade aplica-se automaticamente, mas se o dinheiro for mantido em conta corrente ou quaisquer outras aplicações financeiras, o executado terá que comprovar que o montante constitui reserva de patrimônio destinado a assegurar o mínimo existencial, sob pena de penhora. O STJ possuía alguns precedentes aduzindo que a impenhorabilidade do art. 833 era matéria de ordem pública cognoscível de ofício, mas no outubro passado, a corte pontuou que a impenhorabilidade de quantia inferior a 40 salários mínimos não seria matéria de ordem pública, não podendo ser reconhecida de ofício pelo juiz (Tema 1235)

Incidência da Súmula 410 do STJ para obrigações de fazer ou não fazer (não vale para obrigação de pagar quantia). Parte da doutrina vem lançando críticas a esse entendimento, o STJ disse que a súmula se mantém na vigência do NCPC/2015, mas afetou o Tema 1296.

O STJ acolhia a possibilidade de alterar e revisar o montante arbitrado a título de multa cominatória a qualquer momento, tanto as multas vencidas quanto as vincendas, mas após críticas à postura do STJ, a Corte especial se inclinou para uma visão mais restritiva da multa aplicada, indicando que incide a preclusão consumativa sobre o montante acumulado da multa cominatória, de forma que já tendo havido modificação, não seria possível nova alteração, preservando-se as situações já consolidadas.

2. Novidades jurisprudenciais em direito constitucional
• Nomeação do Procurador Geral de Justiça
O procurador geral da República é indicado pelo presidente da República dentre integrantes do MPU com mais de 35 anos de idade, esse nome é sabatinado no Senado em arguição pública e depois é realizada uma votação secreta para aprovação ou não do procurador indicado com quórum de maioria absoluta. Uma vez nomeado, passa a exercer mandato de 2 anos sendo admitida a recondução (podem ter vários mandatos seguidos). Vale ressaltar que não se trata de cargo de livre nomeação/exoneração pelo presidente, tendo em vista a independência funcional do Ministério Público, sendo que a sua destituição antes de completar o mandato depende de decisão do Senado.

Diferentemente da escolha do procurador geral de justiça (chefe do MP do estado), na qual será feita uma lista tríplice pelo MP, dos 3 nomes selecionados, o governador escolhe apenas um. Há estados que entenderam que somente será nomeado por meio de lista tríplice aquele que já foi procurador de justiça, de modo que não poderia ser procurador geral de justiça, por exemplo que ainda for promotor (primeira instância). Questiona-se se esse entendimento é constitucional.

O STF entendeu que não há norma dispondo em sentido contrário, de forma que o regramento constitucional prevê a autonomia do estado e da instituição da MP, não havendo inconstitucionalidade. Mas caso a Constituição do estado defender que a escolha do procurador geral de justiça será feita em lista tríplice, o governador seleciona um nome e a assembleia legislativa escolhe por maioria absoluta, há inconstitucionalidade no processo de escolha. O mandato do procurador geral de justiça também é de 2 anos admitindo-se uma única recondução, e a sua destituição somente se dá por meio da assembleia legislativa com quórum de maioria absoluta (art. 128, CF).

O MPDFT, por sua vez, compõe o MPU e também possui um procurador geral de justiça, cujo procedimento se dá igualmente por lista tríplice, mas o que se discutia era acerca da competência para a escolha, se seria do governador ou do presidente da República. O STF decidiu que competia ao Presidente, porque a estrutura do MPU é da União, com mandato se 2 anos e admitida uma única recondução, podendo ser destituído pela maioria absoluta no Senado (ADI 6.247/DF e Informativo 1.159).

Ainda, entendeu-se que não viola o princípio da igualdade norma de lei orgânica do MP estadual que restringe a escolha do chefe da institução aos procuradores de justiça, pois há razoabilidade na exigência de maior experiência dos candidatos (ADI 6.551/SP e Informativo 1.143).

• Emenda constitucional 19/1998 (reforma administrativa) e revogação da obrigatoriedade de instituição de regime jurídico único para o funcionalismo público, no âmbito do direito administrativo.
Um dos artigos da CF que foi modificado por esta emenda foi o caput do art. 39, havia a exigência de que a administração pública adotasse para seus servidores o regime jurídico único. Isto vigorou de 1988 (promulgação da CF) até 1998, com o advento da EC 19, que suprimiu essa necessidade de regime jurídico único. Em 2000, foi proposta ação direta de inconstitucionalidade pelo partido dos trabalhadores. Da promulgação da emenda até a concessão da medida cautelar passaram-se 9 anos, que quando foi deferida pelo STF, suspendeu-se a modificação do caput do art. 39, sendo concedida a medida cautelar com efeitos ex nunc em razão de uma alegação de vício formal.

O STF ao julgar o mérito, entendeu pela constitucionalidade do trecho da emenda, afastando a arguição de vício formal, mesmo não havendo votação duas vezes nas casas legislativas, o que seria considerado um vício do procedimento. O Supremo fundamentou sua decisão ao alegar que a mudança não foi substancial a ponto de ser necessária a devolução do texto para a casa completar a devida votação, visto que a alteração foi apenas redacional.

No entanto, o julgamento de mérito em ADI, tem, em regra, efeito temporal ex tunc. O STF, ante as consequências de se retroagir, modulou os efeitos da decisão por segurança jurídica, fixando que a administração pública pode escolher, caso queira, adotar mais de um regime jurídico para seus servidores.

• Liberdade religiosa e o fornecimento de tratamento médico alternativo compatível com a crença do paciente
O que gerou discussão nos tribunais superiores foi o caso das testemunhas de Jeová. Sabido que a CF garante o livre exercício da fé religiosa, sendo que por motivo de crença religiosa, ninguém é obrigado a se submeter a tratamento médico, considerando que essa escolha cabe a pessoa plenamente capaz, pois a escusa de consciência não se estende a terceiro (ex: pais que não autorizam tratamento de saúde para filhos incapazes, menores de idade por motivos de crença religiosa) - Teses fixadas em RE 979.742/AM e RE 1.212.272/AL.

• Símbolos religiosos em órgãos públicos e a laicidade do Estado
Decidiu-se que a presença desses símbolos, desde que com o objetivo de manifestar a tradição cultural da sociedade brasileira, não viola os princípios da não discriminação, da laicidade estatal e da impessoalidade (Tema 1.086 Repercussão geral) - ARE 1.249.095/SP. Entende-se que o Estado é laico, entretanto, não é laicista, de forma que convive harmoniosamente com as várias formas de expressão religiosa, inclusive devido ao aspecto cultural das crenças.

• Iniciativa legislativa concorrente quanto à definição do limite para requisição de pequeno valor (RPV)
Cada estado, município define em lei própria o que é considerado pequeno valor para gerar RPV e impedir a incidência de precatórios (art. 100, CF). Quando a Fazenda Pública é condenada a pagar valor que não é considerado pequeno, aplica-se o regime de precatórios. No entanto, quem teria a competência para fixar os parâmetros do pequeno valor? Não é apenas o presidente da República a prerrogativa para de iniciativa legislativa - questão sanada em Tema 1.326, RG RE: 1.496.204/DF.

• Limitação de vagas para mulheres em concurso público da polícia militar
Por algum tempo o STF admitiu a limitação de vagas com base em diferenciação de gênero nas carreiras militares em razão das especificidades do cargo - STF entendeu inconstitucional, afirmando que as mulheres têm direito de concorrer a 100% das vagas. Não se trata de iniciativa para criação de cotas para mulheres, mas apenas igualar as oportunidades - ADI 7.492/AM e Informativo 1.123.

• Inconstitucionalidade das eleições concomitantes para o primeiro e o segundo biênio da mesa diretora de assembleia legislativa
É vedada a recondução para o mesmo cargo, conforme prevê a CF, sendo interpretado na prática como vedação à recondução dentro da mesma legislatura - STF entendeu pela inconstitucionalidade, sob pena de violação ao princípio republicano da alternância (ADI 7.350/DF, Informativo 1.128).

• Cancelamento da Súmula 421 do STJ
A súmula dispunha que os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando ela atua contra a pessoa jurídica de direito público à qual pertença. Válido dizer que a Defensoria Pública faz jus a honorários sucumbenciais, mas quando a ação se dá contra o ente federativo ao qual a defensoria se integra, o Supremo entendeu que ainda assim a DPE tem direito aos honorários, restando cancelada a súmula em comento. Lembrando que honorários sucumbenciais devidos à Defensoria pública destinam-se à defensoria como instituição, e não ao defensor público atuante na causa necessariamente, não sendo rateada a verba sumcumbencial entre os defensores.

3. Novidades jurisprudenciais em direito penal
• Eficácia da sentença estrangeira
Tema que surgiu à tona recentemente na mídia em razão do caso do jogador Robinho. A interpretação defendida pelo MP foi a vencedora perante o STJ, e o Supremo proferiu um julgamento em HC que manteve a decisão do STJ. No caso de brasileiro nato que comete crime no exterior e posteriormente retorna ao Brasil, o país não realiza em regra a extradição, isso porque crime cometido fora do Brasil pode ser julgado aqui, sendo um caso de extraterritorialidade. O código penal já previa duas possibilidade de executarmos uma sentença penal estrangeira no Brasil (art. 9°, I e II).

O inciso I trata dos aspectos privados, enquanto que o inciso II diz respeito à medida de segurança, sendo necessário tratado de extradição ou requisição do ministro da justiça. A homologação da sentença estrangeira era feita pelo STF antes da emenda constitucional que repassou a competência ao STJ. Há efeitos, no entanto, que não dependem de homologação, como para reincidência, por exemplo, gerando o efeito automaticamente.

Lei 13.445/2017 - art. 100: possibilidade de transferir para o Brasil pena já em execução e que está sendo cumprida por brasileiro no exterior, respeitando-se o bis in idem foi o que ocorreu no caso do jogador Robinho, que cumpria pena na Itália. O MP entendeu no sentido de que é possível aplicar a previsão dessa lei de forma imediata, considerando o sistema de cooperação penal internacional. Alguns doutrinadores e a defesa, entretanto, afirmavam que se a pessoa não estivesse presa necessariamente, não seria possível transferir a pena. O STJ decidiu pela tese da acusação (MP), ao entender que pode-se realizar a transferência mesmo em casos em que não houve encarceramento.

No caso do jogador, não existe a possibilidade de extradição, o que gerou divergências, restando acolhida pelo STJ a tese do MP, lembrando que para esse assunto, a competência para a execução será da justiça federal, e que a Lei 13.445/2017 autoriza a transferência da pena imposta tanto a brasileiros natos ou naturalizados quanto a estrangeiros que tiverem residência habitual ou vínculo pessoal no Brasil, com o fim de evitar a impunidade sobre os crimes cometidos no exterior. Sendo norma de cooperação internacional, o art. 100 da Lei em questão também se aplica aos fatos anteriores a sua vigência.

• Roubo e simulacro de arma de fogo
Um simulacro é um objeto que imita uma arma de fogo, ex: arma de brinquedo. No caso de roubo, o crime é majorado de ⅓ a ½ quando praticado por arma branca, que abrange arma imprópria, ressaltando que arma imprópria é qualquer objeto que não foi criado para servir como arma, mas que pode se prestar a esse fim. Se for arma de fogo de uso permitido, o crime de roubo é majorado em ⅔ desde 2018, e o pacote anticrime prevê que a pena será duplicada se ocorrer com arma de fogo de uso proibido ou restrito.

O simulacro, vale dizer, não tem potencialidade lesiva, de forma que não seria cabível aplicar as mesmas majorantes que se aplicam aos crimes praticados por meio de armas reais. Mas no caso de por algum motivo não ser possível realizar a perícia da arma, o depoimento testemunhal é suficiente e o STJ admite a aplicação da majorante. Não obstante, o uso de simulacro demonstra uma atitude que pode se enquadrar como grave ameaça. Portanto, entende-se que havendo grave ameaça, não pode haver a substituição da pena, nos termos do art. 44 do CP - REsp 1.994182-RJ - Tema 1.171 - Informativo 799.

• Descaminho, bagatela e reiteração
Descaminho é transportar mercadoria permitida para o Brasil ou para o exterior sem o pagamento dos tributos devidos - ex: IPI. Já no contrabando, a mercadoria é proibida ou que precisava de autorização especial - ex: cigarro. A súmula 599 do STJ afirma que não se aplica o princípio da insignificância aos crimes contra a administração pública, mas a natureza do crime de descaminho tem viés tributário, então o STJ e o Supremo o realocaram para junto dos crimes tributários federais, e têm aplicado a insignificância até R$ 20.000,00. No caso do contrabando, o STJ decidiu aplicar o P. da insignificância para até mil maços de cigarro, no entanto, a reiteração afasta a insignificância independentemente do valor do tributo não recolhido (ex: pessoa que todos os dias vai e volta com mil maços de cigarro - habitualidade), ressalvada a possibilidade de no caso concreto, se concluir que a medida é socialmente recomendável, sendo que a contumácia pode ser aferida por meio de procedimentos fiscais e penais pendentes de definitividade - Tema 1.218 STJ.

• Pena de multa e extinção da punibilidade
A pena de multa é bastante polêmica em matéria penal, antes do pacote anticrime, o polêmico art. 51 do CP já dispunha que após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, a multa seria considerada dívida da Fazenda Pública, sendo que as causas interruptivas e suspensivas da prescrição correspondem às da dívida ativa. Ainda na vigência da redação antiga do artigo em comento, o STF entendeu que em primeiro lugar o MP teria a competência para a cobrança, e subsidiariamente a Fazenda Pública. O pacote anticrime, contudo, reforçou a natureza penal da multa, ao afirmar que a execução será perante o juízo da execução penal (VEC), reforçando a legitimidade do Ministério Público. Após o pacote anticrime, o STJ manteve a interpretação anterior do STF - ADI 7.032/DF - Informativo 1.129

• Cadastro de condenados por crimes sexuais
No fim do ano passado sobreveio nova lei criando um cadastro público de predadores sexuais e permitindo que o juiz levante o sigilo de réus por crimes sexuais. Essa proposta de monitoramento já existe em outros países, mas o ponto polêmico nessa nova Lei foi o fato de o legislador ter falado sobre essa possibilidade após condenação em primeira instância, não exigindo o trânsito em julgado para a divulgação do réu como criminoso sexual. Sobre o cadastro estadual de condenação definitiva enfrentado pelo STF na ADI 6.620/MT, o Supremo entendeu pela constitucionalidade da lei estadual de cadastro de pessoas com condenação definitiva, preocupando-se também com as vítimas, ao evitar sua publicização/identificação.

• Retratação da vítima em crimes sexuais
O standard probatório que torna possível a condenação é dificultado em razão da natureza dos crimes sexuais, que costumam ocorrer de forma sorrateira, e até mesmo na clandestinidade, envolvendo na maioria das vezes apenas o autor do crime e a vítima. O STJ entendeu que a retração da vítima pode dar azo à revisão criminal para absolvição do réu, quando o conjunto probatório se limita à declaração e a testemunhos, sem outras provas materiais - Informativo 806

• Erro de proibição em estupro de vulnerável
Para lembrar: o erro de tipo está previsto no art. 20 do CP e é uma falha de representação, fastando o dolo. Por sua vez, o erro de proibição está veiculado no art. 21 e se trata de um erro de interpretação da norma, se inevitável, o erro de proibição isenta o sujeito de pena, e se evitável, a pena é diminuída de ⅙ a ⅓. Para o entendimento dos tribunais superiores, a prática de ato sexual envolvendo menor de 14 anos configura crime de estupro de vulnerável, em absoluto.

Em um julgado polêmico, um jovem de 20 anos, trabalhador rural e com pouca escolaridade entendia não estar cometendo crime em razão do consentimento da vítima de 12 anos e da aceitação do relacionamento amoroso pelos familiares da moça, além de que ambos tiveram um filho juntos. Neste caso, considerando as circunstâncias fáticas, o STJ posicionou-se favorável à aplicação do erro de proibição, entendendo pela ausência de culpabilidade - Informativo 807.

• Orientação sexual da vítima - homofobia
Xingamento homofóbico proferido contra vítima que na verdade era heterossexual não descosntitui crime de injúria. A questão é: tal injúria é qualificada pelo preconceito? O STJ definiu que independentemente da orientação sexual da vítima, o delito de injúria se caracteriza pela utilização de insultos preconceituosos e homofóbicos que ofendem a honra subjetiva do indivíduo - Informativo 814.

• Agravante em lesão corporal contra a mulher
Lesão corporal qualificada em razão do sexo feminino. Antes de o § 13 dispor especificamente sobre a lesão corporal contra a mulher, o § 9° do art. 129 do CP era válido tanto para o sexo masculino quanto para o feminino no concernente à lesão corporal. Entendeu-se que a aplicação da agravante genérica do art. 61, inc. II, alínea f do CP, em conjunto com as disposições específicas da Lei Maria da Penha, não configura bis in idem - Tema 1.197.

• Ameaça em contexto de cólera
O fato de ameaças serem proferidas em contexto de cólera ou ira entre o autor e a vítima não afasta a tipicidade do delito

• Estupro X importunação sexual
Sobre a desclassificação do crime de estupro para o delito de importunaçao sexual quando não há violência ou grave ameaça na conduta do réu de apalpar as partes íntimas da vítima: entendeu-se que a ausência de violência ou grave ameaça do réu ao apalpar a vítima com o intuito de satisfazer sua lascívia, impõe a desclassfiicação do crime de estupro para o crime de importunação sexual. Assim, permitam-me uma breve comparação entre a elementares dos crimes contra a liberdade sexual e dos crimes patrimoniais: o estupro está para o roubo assim como a importunação sexual está para o furto, se presente ou não o fator da violência ou da grave ameaça. Ressalta-se que não se pode desclassificar crime sexual contra vulnerável para crime de importunação sexual, vez que esse último pertence à categoria de crimes contra a liberdade sexual, podendo transpor apenas o estupro comum.

• Injúria e seu elemento subjetivo
A injúria é crime contra a honra subjetiva, e ocorre quando há animus injuriandi, de modo que não basta mera intenção de fazer uma brincadeira. Todavia, necessário atentar que a nova lei da injúria racial definiu que o racismo recreativo (animus jocandi) é crime e ainda possibilita o aumento da pena. O caso emblemático na jurisprudência recente envolveu um discurso proferido no exercício do mandato de um governador de estado, em situação de embate político, mas com ausência de dolo de difamar ou de injuriar. Entendeu-se que expressões eventualmente contumeliosas, quando proferidas em momento de exaltação ou no exercício de crítica/censura profissional, ainda que veementes, atuam como descaracterização do elemento subjetivo peculiar dos tipos penais definidores dos crimes contra a honra.

• Aborto, atipicidade e síndrome de Edwards
O STF assegurou a atipicidade do aborto nos casos de anencefalia, tendo em vista que a vida do feto nessa condição é inviável fora do útero materno. No entanto, entendeu-se que não é possível a concessão de salvo-conduto autorizando a realização de procedimento de interrupção da gravidez no caso de desenvolvimento da síndrome de Edwards, sendo vedada a analogia com o entendimento firmado no célebre julgamento da ADPF n. 54/STF

• Sugar baby
O relacionamento entre adolescente maior de 14 anos e menor de 18 (sugar baby) e um adulto (sugar daddy ou sugar mommy) que oferece vantagens econômicas, configura o tipo penal previsto no art. 218-B, § 2°, I do CP - Informativo 825.

• Dosimetria da pena - reformatio in pejus
É obrigatória a redução proporcional da pena-base quando o tribunal de segunda instância, em recurso exclusivo da defesa, afastar circunstância judicial negativa reconhecida na sentença. Todavia, não implicam reformatio in pejus a mera correção da classificação de um fato já valorado negativamente pela sentença para enquadrá-lo como outra circunstância judicial, nem o simples reforço de fundamentação para manter a valoração negativa de circunstância já reputada desfavorável na sentença - Informativo 827.

Resumo elaborado com base nas videoaualas disponibilizadas no canal no Youtube do Estratégia Carreira Jurídica: Retrospectiva de Jurisprudência.


Biografia:
Além de grande admiradora da escrita e da literatura, sou estudante de Direito na Universidade Federal de Santa Catarina e meu propósito no Recanto das Letras é traduzir conteúdos do mundo jurídico para a comunidade leitora, de modo a propagar conhecimentos sobre o Direito e propor reflexões. 
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