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A VINGANÇA DA VIDA
Wilson Luques Costa

Agora que o ódio se apoderou

De mim.

Agora que me encontro

Com todas as

Minhas vísceras

Em sobressalto.

Agora que meu ódio

Não cede nem relaxa.

Agora que minha bílis

Sobe à cabeça e escorre esse azedo rastro.

Agora que não tem mais jeito.

Agora que desnudo

A minha hybris,

A minha volúpia e o meu nojo.

Quero estar a sós comigo.

Quero me despir

De toda minha

Misericórdia

Compaixão.

Quero o ódio

Sobre esse colchão

Escarmentado

E a volúpia

Da noite insone.

Quero desferir

O meu amargo nojo,

A minha revolta, o meu fel.

Sim, amigo!

Eu traio a mulher que eu amo!

Eu cuspo no rosto de quem me adula!

As mulheres não deveriam me amar, mas me amam.

Os homens deveriam odiar-me, mas se subjugam.

Os hipócritas não merecem meu indulto, mas eu os

Perdoo.

A nobreza deveria ser posta abaixo da linha da torpeza.

A dignidade deveria esconder-se atrás dos amontoados

Da mentira.

Ó sim!

Abandonemos todos os tipos de sistemas.

As regras.

Métricas.

Rimas.

As aliterações.

Os jogos de sintaxe.

A ordem estabelecida.

Os cânones.

Os hipérbatos.

As antíteses.

Sínteses.

Teses.

Sub-teses.

As figuras de linguagem.

Oh, amigo!

Não me perguntes como deveríamos

Falar. Não me perguntes como deveríamos proceder.

Como deveríamos nos comportar.

Sim,

Abandonemos os bons modos.

Abandonemos as

Finuras...

As imposturas das posturas.

Abandonemos as moralidades

Desgastadas.

O respeito cortês com os nossos inimigos.

Admitamos, amigo!

O mundo não terá salvação.

O que procuramos nos livros e

Enciclopédias?

A mentira do mundo?

Toda a história é um fragmento

Da mentira do mundo.

O que pretendemos agora?

Criar clones do

Fracasso?

Multiplicar as nossas misérias?

Saiba, amigo!

A guerra

Nunca estará ganha.

A batalha nunca estará ganha.

O amor é uma quimera.

O ódio...

Uma inveja coligida.

Oh, amigo!

A lógica há muito

Que se contradisse.

O que é o amor para um cadáver em meio à guerra?

O que é a compaixão para um mutilado das virtudes Bélicas?

Sim, amigo!

Não devemos alimentar mais a esperança.

Sim, amigo!

Eu vou suprimir todo tipo de esperança.

Ficaremos nus

Sem mais nenhuma esperança.

Veremos sim como somos ridículos.

Desajeitados.

Estorvados.

Sem compostura.

Somos obcecados por uma estética

Que não possuímos.

Para que então precisam de mim?

Oh, amigo!

Posso dar sim todo o meu ódio.

Esse meu abjeto desejo de destruição.

Quero destruir os nossos sonhos.

Os nossos desejos...

Não há salvação, amigo.

Não esperemos por uma nova era.

Somos a síntese do nada...

Da destruição...

Do reconhecimento da incapacidade de todo homem.

Esse ser mimético e complacente.

O que desejamos?

O aplauso da posteridade?

Não, amigo!

Nós seremos vaiados.

Seremos apupados

Na arena da Vingança.

Somente um idiota

Poderá aplaudir outro idiota.

Como poderemos sobreviver

Nos séculos dos imbecis que virão?

Não, amigo!

Não virão homens de bem.

Apaguemos esse sonho doentio.

Essa ilusão mórbida.

A posteridade é uma farsa.

O que queremos que falem de nós?

Que fomos uns homens de bem?

Não!

Não fomos os homens de bem.

Que fomos uns sábios?

Não!

Não fomos sábios.

Gênios?

Homens delicados?

Oh, amigo!

Não há homens delicados.

Há pulhas como eu e você.

Pensa que com os nossos escritos salvaremos a

Humanidade?

Não, amigo!

Nossos escritos não salvarão a humanidade.

É por que nos

Julgamos superiores

A nossos contemporâneos?

Sonhamos que

Sobreviveremos no futuro?

Não, amigo.

O futuro não chegará.

Nossas

Obras serão pisoteadas

Pelas traças dos sebos e

Alfarrábios.

Morreremos na mendicância

Solitários e esquecidos.

Os homens do futuro rirão de

Todos nós.

Oh, Amigo!

Talvez eles dirão:

‘Oh, mas que belos idiotas’.

‘Oh, mas que charlatões da obsolescência’.

E em nossos escritos...

E em nossas tolas

Palavras

Soprará o antifogo de prometeu.

Os nossos fígados serão

Debicados pelos corvos do não

Reconhecimento.

Gritaremos em vão

Pelos píncaros do deserto.

Nossos soluços não serão

Ouvidos nem

Pelas belas Valquírias

Apaixonadas pelos nossos cadáveres.

Nossos sangues escorrerão

Pelo rio do arrependimento.

Arderemos nas

Brasas do esquecimento.

Culminaremos no vazio do deserto.

Oh, amigo.

Seremos o superlativo do excremento.

Seremos seres abandonados.

Seres sem simetria.

Nuança.

O nada será o nosso próprio êmulo.

De que jaez seremos

Quando nos olharmos

No espelho da angústia?

Aí então perguntaremos: por que fomos viver de modo exaustivo?

Por que agora permeia o nada junto a nós?

Seremos lastreados pela discórdia

Dos nossos atos.

O infausto nos acolherá.

A opulência do infinito nos

Acobertará.

Seremos os indigentes dos tártaros.

A nossa transcendência

Será o intocável.

Viveremos do alimento

Da paucidade.

Seremos parcimoniosos

Com os nossos atos.

Mas de nada adiantará.

Viveremos da minudência.

Da remissão de nossos atos.

Teremos o parco como

Recompensa.

O ínfimo e o reles serão os nossos melhores amigos.

O nosso suprimento será a fome.

A miséria.

Haverá uma vazante e

Depois o refluxo.

A dor sobressalente.

O eterno será o indissolúvel.

Teremos o pleno insulamento.

A infusão da phisys em nossa

Putrescência.

Teremos que resolver o nosso próprio litígio.

Antes de nos esvairmos nas brumas voláteis.

Teremos que arrostar a lama.

O tédio.

A imensidão.

Seremos açoitados

Pela noite invernal.

Habitaremos
O pórtico da ignorância.

Viveremos enfim sem mim:

A vida.

A quem o ódio se apoderou

De vez e por onde

Sobressaltam

As vísceras da vingança.


Biografia:
Wilson Luques Costa nasceu em São Paulo, SP, Brasil. Jornalista, professor, poeta e escritor. Eleito pela Academia Internacional de Literatura Brasileira - NY um dos Top Five nos Destaques Literários Awards Focus Brasil NY na Categoria Ensino e Pesquisa com o ensaio O Paradoxo do Zero.
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