“Mas por que será que, no meio dos momentos mais leves, alegres e despreocupados, às vezes surge por si mesma uma corrente estranha?”
Nikolai Vasilievich Gogol, em "Almas Mortas"
O presente está gasto; o futuro, incerto; o passado, questionado. Nosso século avança às pressas, porém, sem poder olhar para frente, avança de olhos fechados, sem saber se vai ao abismo ou ao céu. Mergulhamos numa espécie de decadência alegre e inofensiva; e rimos de tudo, desesperados que somos. Não podemos amar, pois conhecemos a mentira de tudo e a verdade do nada. A dor que sentimos é nosso bálsamo. Nossos sonhos são sepulturas. Nosso coração é um poço sem fundo: um buraco negro do qual nem Deus pode escapar. Mas ele Ele está morto e nós suspiramos em sua ausência, sem coragem de chorar. Carregamos ainda a aparência de órfãos austeros, que pensam ser capazes de crescerem sós. O pensamento se exibe de forma parda, como uma luz que se esvai e se entrega à própria impotência. Já não pode existir poesia, sobram apenas os esforços inúteis de almas opacas que temem o esquecimento. Politicamente perfeitos, os homens soçobram. A política é um sintoma da derrota. O partido é o começo do fascismo. O crescimento prenuncia a queda. O messianismo de nosso tempo é vil e seus cristos são banais a perder de vista. A felicidade estúpida parece ser o único “universal”, a humanidade é coadjuvante na peça dos desvalidos. A arte começa a morrer quando lhe tiramos o verbo, que é nossa carne: a palavra aviltada encerra nosso crime e nossa punição.
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