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TODOS OS HOMENS CONTRA DEUS
Vicente da Silva Junior -

Certo dia, "ainda por acontecer", muitos homens de pouca crença e poucos homens de muita fé equivocada discutiam fervorosamente sobre a existência ou não do tão polêmico "Todo Poderoso"- criador de tudo e de todos - e de como ele ordenava, mesmo ausente, as formas certas das pessoas agirem para... agradá-lo. A bendita guerra santa de palavras tolas entre aqueles de múltiplas religiões travava-se num grande campo aberto maravilhosamente coberto por flores de todas as cores possíveis e sob um inigualável céu azul rasgado por indescritíveis raios dourados do indescritível sol. Bem próximo a esse campo havia uma praia de beleza também irretocável, banhada por um mar tão lindo, calmo e cristalino quanto se possa sonhar. Nela uma única criança brincava feliz e sossegada, alienada a tudo e totalmente desatenta a agitação inútil dos estúpidos adultos. Fazia seus "castelinhos de areia" com invejável empenho, apesar de sozinha e diante da indiferença absoluta dos falantes ali próximos, pois contentava-se com os sinceros elogios tecidos a eles pela sua boquinha só para os seus próprios ouvidos."Olha... que lindo", dizia repetidamente para si mesma. E eis que, de repente, em um momento de sabedoria inquantificável e paciência acima de qualquer compreensão, Deus, indignado com o que diziam equivocadamente sobre ele mesmo e em desnecessário tom áspero de voz, decidiu intervir ao seu tradicional silencioso e discreto modo... Decidiu "tentar" direcionar os raciocínios para um único ponto consensual: o simples e correto. E eis que, de repente, inexplicavelmente a linda e inocente garotinha de cabelinhos loiros levantou-se e começou a caminhar por entre os agitados adultos de fisionomias enraivecidas. Enquanto andava por aquela desnecessária Torre de Babel de opiniões divinas ela puxava levemente as roupas de cada um com quem cruzava, na simples tentativa de um mínimo de atenção para a sua simples pergunta: "gostou do meu castelinho, tio?". Mas, as respostas de todos eram secas, curtas, indelicadas e iguais: "vá pra lá, não vê que estamos ocupados demais para bobagens!". E eis que, de repente, por algum motivo, o tom de voz da pequena também tornou-se um pouco mais acentuado e, apesar de calmo, muito imponente. "Sim, eu vejo que estão mesmo bem ocupados... Ocupados tentando impor aos berros uns aos outros que a simplicidade da existência 'Dele' deve ser inutilmente tornada uma complexidade extrema sob ótica egoísta!" Diante dessa inesperada e indigesta intromissão em nível intelectual alto demais para sua fonte, um a um foi se calando. Nenhuma arma jamais será tão poderosa quanto palavras corretas proferidas nos corretos momentos. Proferidas com suavidade, pois não se consegue razão alguma só por aumentar o volume da fala. "Aliás, vocês estão sempre ocupados demais", prosseguiu ela em meio ao silêncio atônito e generalizado. "Ocupados com os seus 'castelos' os quais julgam reais, pois a ganância desenfreada há muito os tornou cegos e a tolice imposta por vocês mesmos às suas almas não mais permitirá ver que eles sim são bobagens bem mais passageiras que os meus ali na praia". "Ocupados demais para pisotearem as flores sob seus pés, sem ao menos se darem conta da beleza e graça que elas proporcionam sem nada lhes pedir em troca". "Ocupados demais para receberem indiferentes os raios do magnífico sol que os ilumina e aquece, como se essa tarefa abençoada já fosse uma desprezível obrigação, e não algo digno de agradecimento diário". "Sempre ocupados demais com as matanças e atrocidades que promovem entre si mesmos, muitas até em nome 'Dele', como se dor e sofrimento proporcionado intencionalmente a um semelhante fosse desejo e criação conivente a pureza e magnitude de quem lhes deu esse indescritível mar de presente. Aliás, mar o qual vocês pouco cuidam, assim como todo o resto do seu imprescindível meio ambiente. Afinal, estão sempre tão ocupados com a destruição generalizada em benefício pessoal, que a natureza nada mais é que mais uma das suas vítimas indefesas". O silêncio continuou a ensurdecer o belo campo e a pequena, em meio aos questionamentos necessários que não se formavam nas cabeças dos seus interlocutores prosseguiu: "vocês se ocupam demais com desocupações premeditadas... Matam por futilidades e enganam por prazer. Dizem que amam mas traem suas parceiras e parceiros com requintes clássicos de cinismo. Dizem ser tementes a 'Ele' e respeitá-lo acima de tudo, mas não são capazes de respeitar seus próprios filhos dentro das suas casas. Ajoelham-se inutilmente diante de altares pomposos, enfeitam-se em demasia com espalhafatosos adornos religiosos, fazem cultos teatrais e até circenses, transformando a simples fé pura em algo tão estúpido quanto as próprias mentiras que tentam contar às suas almas; mas são incapazes de estender a mão a um faminto que rasteja à olhos vistos em frente aos faraônicos templos erguidos em nome 'Dele'. Vocês necessitam de intermediários reconhecidos só por vocês mesmos, os quais imaginam conduzir suas palavras até o alto, pois a fraqueza das suas convicções há muito roubou a pureza e a simplicidade que suas crenças deveriam possuir e isso abafou o teor das suas preces pessoais." "Se querem duvidar da existência de algo ou de alguém superior, primeiro 'existam'... Mas existam de verdade e com o real propósito para o qual foram criados, e não sempre buscando desculpas para inocentar a si mesmos diante de qualquer falha ou da incapacidade. Acreditar 'Nele' somente em alguns minutos, para encontrar alguém a quem culpar quando as coisas não dão certo ou quando trechos difíceis da vida precisam ser superados, torna vocês somente cruéis inquisidores da própria 'luz'." O imponente tom carregado com simplicidade dela foi lentamente voltando ao estado infantil e, mesmo assim ainda concluiu: "é inútil tentar enxergar o horizonte, se alguns centímetros além dos olhos ainda não foi descoberto. Para os que querem crer de verdade em algo, nenhuma prova se faz necessária. Mas para os que não querem, nenhuma jamais se fará suficiente, muito menos algumas simples palavras de uma... criança." Em seguida a pequenina os deixou com seus pensamentos e voltou às suas obras na linda areia branca. Alguns minutos de silêncio indigesto ainda se seguiram, mas rapidamente os homens voltaram a mesma desconecta discussão, novamente em inútil grosso tom de voz. Todos mais uma vez contra o criador. E então Deus chorou... Chorou muito em forma de uma forte tempestade que dispersou a multidão há tempos sem rumo certo. Ondas maiores se formaram e varreram os castelinhos como mais um sinal de tristeza. Entretanto a garotinha não se importou, pois a visão dos inocentes vai além do simples momento. "Ele" chorou pois mais uma vez sentiu que jamais conseguirá mostrar a "todos" os homens que eles devem procurá-lo na humildade e na simplicidade real de pequenos detalhes, mesmo que sejam as palavras de uma... simples criança. Buscá-lo na leviandade das complicações ilógicas ou nas criações que não são dele, jamais será o caminho para encontrá-lo...

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Este texto é administrado por: Vicente da Silva Junior
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