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O Soldadinho de Chumbo sem Cabeça
Ney Sampaio

Encontrei-o no lixo, lá no prédio onde morava. Estava de uniforme azul brilhante, portava um fuzil caprichosamente pintado de prateado, calça grená com uma listra branca do lado. Ostentava um boné vermelho... boné vermelho? Bom, pelo menos era isso que eu imaginava porque faltava-lhe a cabeça! Um soldadinho de chumbo sem cabeça! Para quem aos sete anos não tinha nenhum, era fascinante aquele boneco pesadinho, diferente daqueles de plástico. Não que faltasse outros brinquedos mas este tornou-se muito especial. Dormia com ele por baixo do travessseiro e nas noites de pesadelo era ele quem me acudia. Herói das minhas aventuras solitárias, era leal e destemido!! Foi com este companheiro acéfalo que descobri que a falta de alguma coisa não impedia a realização de um todo.
Numa sexta-feira, enquanto todas as mulheres da família se reuniam na casa da minha bisavó para o chá da tarde, eu brincava nos grandes jardins que rodeavam o velho casarão. Por lá existiam pequenas calçadas ladeadas com uma grama chamada pelo-de-urso. Eram tuchos compactos e compridos a formar uma bainha verde-escura emoldurando todo o gramado. Distraído com meu predileto imaginava que aqueles tuchos eram florestas inespugnáveis, cheias de tesouros e aventuras a serem vivenciadas. Em dado momento, o pequeno plúbeo escorregou de minha mão e perdeu-se naquele emaranhado verde! Socorro! Socorro!! Gritava ele desesperado! Parecia escutá-lo. Pela primeira vez seria eu a socorrê-lo! Mas quanto mais procurava mais o pânico me roubava o sentido de direção! Logo surgiu minha tia-avó ranzinza a reclamar que estava destruindo as plantas! A partir deste dia, sempre o procurei durante dias, meses...até cair no esquecimento.
Muitos anos depois minha bisavó foi de encontro ao criador e logo após, minhas tias. A enorme casa e o seu entorno ficaram à revelia do tempo.
Já rapaz, passeando naquele cenário de abandono, eis que vejo no meio do que fora um dia a espessa pelo-de-urso o meu soldadinho sem cabeça! Com suas cores desbotadas a revelar seu conteúdo cinza, ainda estava lá em pose solene a ostentar o fuzil!
Imitação da vida! Muitas vezes Deus faz calcinar nossos jardins para que possamos reencontrar os tesouros esquecidos, os valores pétreos que foram lançados e perdidos nas aventuras mundanas. Amigos, familiares, amores, sonhos... todos esquecidos no meio da relva temporal.
No mesmo dia que o encontrei adormeci com aquele amigo por baixo do travesseiro. Quando amanheceu ele havia desaparecido. Me senti um pouco mais pesado mas com o coração mais leve. Finalmente corpo e cabeça estavam juntos...














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