Violência Doméstica
Maria José levantou-se muito cedo, vestiu-se rapidamente e já tinha em mente as bijuterias que iria usar naquela manhã. Foi a casa de banho, fez sua higiene pessoal, penteou os cabelos, pegou sua velha mala desbotada pelo tempo e dirigiu-se a paragem mais próxima. No baloiço do auto-carro, fez e refez sua maquilhagem,
para esconder as marcas do sofrimento. Quando deu por si já estava no centro da cidade.
Rumou ao primeiro café, e estava em dúvida quanto a ementa.Pensou, pensou e depois pediu ao mal-humorado empregado de mesa, uma bica cheia e uma bola de Berlim. Comia e lia ao mesmo tempo uma revistinha cor-de-rosa que trazia na capa a imagem de uma estrelinha de segunda grandeza. Passado um quarto de hora, pediu uma chávena grande de carioca de limão. Pagou a conta e saiu apressadamente e quase trombou numa velhota que estava parada na calçada.
Maria João estava completamente perdida, foi até a estação, tomou o primeiro comboio e desceu numa zona duvidosa e foi bisbilhotar as montras. Praticamente tudo era “made in China”. Passou por ela, um cabo-verdiano e lhe disse alguma coisa em crioulo, ela fez que não ouviu e seguiu o seu caminho.
Sentou no banco da Praça da Figueira, e a solidão bateu no seu coração. Tirou do saco um maço de tabaco e ao mesmo tempo que fumava, chorava, chorava e chorava. Havia sofrimento em sua alma. Estava cansada de sofrer violência doméstica, estava saturada de tudo e consigo falava: “a cada três mulheres uma sofre de violência doméstica” e ninguém faz nada.
O tempo passou rapidamente, e entrou numa tasca familiar, pediu bitoque e uma jarra de vinho. Comeu sossegadamente, pois sabia que era a sua última refeição pois em sua mente de mulher sofrida já tinha um plano. Pediu a velha senhora alentejana um abatanado e um pastel de nata, depois dirigiu se a retrete e arrumou o cabelo, olhou-se no espelho e viu em seu rosto marcas de dor e sofrimento, e começou a chorar.
Enxugou as lágrimas dos olhos, retocou a maquilhagem e saiu apressadamente. Sentou-se no primeiro banco que encontrou e lá estava um exemplar de Maria.Abriu numa página qualquer, e lá encontrou um fútil artigo que explicava a diferença entre ser pirosa e ser pindérica. Riu-se pela primeira vez naquele dia, há tempo que não ria assim. Por um momento sentiu-se mulher, sentiu-se feliz, sentiu-se livre. Aquela liberdade levou a sonhar por um instante, pensou em fugir para um lugar distante. Não teve coragem, estava sozinha, tinha medo de voltar pra casa, pois o seu algoz estava a sua espera.
E para cessar o seu sofrimento, atirou-se de corpo, alma e espírito nas águas tranquilas do Tejo. No outro dia, aparece sua história no jornal,
“Maria José já não sofre nas mãos de José Maria”,
|