Todos estão de terno azul bem cortado;
eu tenho uma perna com o joelho parafusado...
Todos tem diplomas em suas mãos bem limpas;
eu tenho que furar os buracos
na minha própria cinta...
Todos riem uns com os outros e estão mansos;
estou todo sujo por fora com meus ossos brancos...
Todos vão às casas de campo no fim de semana;
tenho vivido uma vida, vamos dizer,
bem insana...
Todos tem relógio de pulso de última geração;
o mais barato em mim é o meu pobre coração...
Todos fazem convênio com Deus para o futuro;
todo santo dia espio a linha do horizonte
por sobre o velho muro...
Todos me cumprimentam
para o desespero
da educação;
abro o livro da agonia e lá está:
pise devagar em cada pedaço de chão...
Todos creem que há algo depois do céu azul,
isto é, pressentem um quiosque entre estrelas;
faço o papel de tolo cantando um velho blues
que diz que a vida é um campo de cerejas...
Todos me aplaudem quando parto, repartido;
eu, na horizontalidade, espio pelo vidro...
|