Ouve-se um disparo ecoar os ouvidos; e naquele bar de fronte ao ocorrido, os comentários, cochichos e caquetes; tornaram-se freqüentes em volta da mesa, de onde as garrafas de cerveja sustentavam os bêbados e abastecia os que só apreciavam. O corpo caído ali à mera distancia do entardecer daquele dia; que morreu de olhos abertos em direção ao local da bebedeira. O furduncio quase tomava conta do estabelecimento; as pessoas ficavam um pouco amedrontadas, e outras davam gargalhadas; por fim, o assunto era este:
- É divida. Só pode ser divida...Quem deve teme. Disse um senhor de barba mal feita, dando “talagadas” em seu copo:
- Não. É briga, acerto de contas...é o amante da safada, o chifre pesou mais que a arma atirada há há há. Indagou um moço de boné sujo sentado a frente do senhoril das “talagadas” na mesma mesa:
- O moço entende de traições é. Perguntou um senhor de roupas claras e coloridas, que parecia voltar de uma festa, sentado em outro móvel aos desconfios:
- Eu nunca traio minha esposa, sou fiel até com o pé nas costas. E tornou a dizer: - Mas tem um primo meu que já fez isso. Respondeu o de abas sujas. Um outro rapaz ao lado, cutucou-o o cotovelo:
- Fez o que?...O seu primo?. Indagou. O de boné tornou novamente a dizer:
- Arrancou do amante com uma foice, os culhões...Depois o matou decepando a cabeça. O senhor da comemoração lhe disse:
- E ainda foi pouco pro amasio do seu primo...Deveria tê-lo picado e jogado aos cães...Há há!. A traição é uma coisa muito banal, um pecado imperdoável. O senhor de pêlos mal feitos, retrucou:
- O amo mataria o amante “filho da mãe” da sua mulher?!...Você não pensa não?, Isso dá xilindró... É xadrez na certa, e por homicídio culposo. O senhoril que voltada da festa exclamou:
- Eu quero que se dane a policia...Eu sou um corno cara!, E a reputação masculina onde é que fica?!. Um outro moço de óculos escuros entrou no meio do bafafá, enquanto todos golfavam seus copos de bebida:
- Machismo hoje em dia num ta com nada, a mulher ta dominando tudo; se você bate na mulher por causa disto ou daquilo...Tu é um covarde e ainda por cima vai preso. E deu a sua engolida no copo.
O povo passava por entre o corpo caído; olhavam, sentiam nojo, pena, susto e partiam; o cadáver continuou ali já no meio de moscas. Não havia policia, não possuía bombeiros, não se obteve ambulâncias; ninguém fez coisa nenhuma para tirar o tronco das condições da viela:
- Aposto que vai apodrecer ali mesmo!...Já estou sentindo até o cheiro de carniça!. Disse um sujeito que saiu dos Correios por onde trabalhava como carteiro:
- Impressionante como esse povo num faz nada...Se vê só que situação; cadê a funerária?. Segredou o da frente que também era empregado postal. O senhor da barba falha, ouviu o comentário e respondeu:
- É a “lei do silencio” meu amigo...Ninguém viu nada, ninguém sabe de nada, ninguém diz nada; só a família dele vai tirá-lo de lá!.Ascendendo um cigarro e depositando o isqueiro na mesa. O moço de boné manchado comentou com o rapaz ao lado sobre o incidente, na qual ele o conhecia:
- Eu conheço o ser-humano que matou o canalha?. O jovem ao lado cutucou-o novamente:
- Conheçe?!...Quem que é?...Quem que é?. Disse indiscreto. O moço lhe respondeu cochichadamente:
- “Lei do silencio”, não vou contar...Num sei de nada...E você vai acabar abrindo a sua boca e sair contando pra meio mundo; tu não honra o sangue que tem não? Hein!? O sujeito não disse nada, só acrescentou:
- Eu não sou mexeriqueiro não!. O garoto mostrou-lhe uma arma que carregava na cintura e declarou:
- Tu queres ficar sem dente?, Fique quieto, mude de assunto!...Se não te mato aqui mesmo. O rapaz ao lado se assuntou de repente, suou frio, sua garganta secou matando-o todo o gargalo do copo, levantando-se sem dizer uma palavra e saiu. Conversa vai, conversa vem aos poucos o boteco vai se esvaziando, todos vão se dispersando; o tempo passa, a madrugada chega, e o moço de aba suja mata o ultimo gole da cerveja, pois é o ultimo individuo ainda sentado no local. Estava totalmente embriagado, perdeu as contas de quantos havia tomado; mas levantou-se até o balcão, jogou um punhado de dinheiro e foi embora caminhando em direção ao corpo morto. No trocar de pernas, o rapazola se aproximou do corpo dizendo para si mesmo: - Você não poderia ter feito isso comigo. Dando uma cuspida que saiu de tua boca seca, caindo ao corpo com a bala cravada na cabeça. O moço de boné sujo tirou a arma da sua cintura e elevando-a próximo ao peito dizendo:
- Eu num vou pra cadeia nem no inferno. E se matou com um tiro fulminante no queixo, falecendo em cima do primeiro cadáver, na qual o teu sangue se misturava com o dele...Empossando a viela toda em que ninguém sabia de nada; ninguém.
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