A matéria deste Canto tem o riso da boca
e, no entanto, do sal pressuposto,
a salgada palavra louca
que escapa por entre os dentes
e se oferece aos que pensam
pensamentos que se dizem sãos
e aos dementes
e, por nefasta que seja a referência,
cozida ou crua a matéria nua
serve ao simples e à ciência
praticada por aqueles que buscam o culto
por detrás do escuro vulto
que caminha, demiurgo,
salvo os manuais de fabricantes de relógios
que criam a partir do tempo os solilóquios
que só astutos momentos dá aos augustos
homens do acaso que procuram
dentro do barro
os diamantes perdidos de um deus
perdulário
que grita, preso,
de dentro de seu santuário...
Este Canto se contenta, no entanto,
de não possuir dentes podres
e nem mau hálito,
mas, por outro desconsiderado encanto,
tem o hábito
de verter vinho em vez de água
no Santo Graal
que cada um possui em casa,
mesmo que não saiba,
mas, por outro lado,
isso não causa nem bem e nem mal,
nem aos pequeninos
que vão às igrejas rezar aos santos
e nem aos que servem ao Diabo
e vertem pequenos prantos,
isso é o que diz e prega
este que se denomina Este Canto...
Mas, por desvio de conduta,
rogo aos perdidos e às putas,
a quem prezo sagrada comunhão de caminhos, que fundem
uma igreja devotada totalmente
às belezas oriundas
dos astros perdidos no espaço
que traçam traços
pelas mãos de algo/alguém
que desenha sois sem mormaço,
sabe que a raça que aqui exposta
está mais e mais se afunda
no banquete de quitutes que descobre
por detrás da cortina celeste,
seja terremotos, tsunamis, deslizamentos, qualquer tipo de peste,
já que sois seres imantados atraindo
a cólera do mais vil pecado
ou qualquer outro tipo de maldição
que abunda no campo cósmico
que jamais um dia iremos dominar
com nossas mãos devotas,
jamais saberemos como santos
curaram suas próstatas,
nós, apóstatas, guardadores
de mantimentos nos cilos,
perversos senhores do sentimento
a escondermos por dentro
o verdadeiro tempero de cada coisa
que usamos em momentos
em que temperamos nossa loucura
com alguma partícula escura
que chamamos de negra matéria,
obra de um demoníaco em férias,
que a muito tempo nos persegue
e que em nós a eras dura...
Este Canto tem em si o vago
e o filosófico que resiste à beira
dos pórticos por onde passam
desumanos transfigurados
como fossem santos que escaparam
da voraz fome do pecado...
Este Canto e não outro traz a si o louco que habita cada mente
perfilada bem em frente ao Anjo Devorador como fosse ele o guardador
de rebanhos perdidos em paragens portuguesas, de um ser doente
de vida que espalhou migalhas de comida como se perdido estivesse
entre ovelhas e cabalas pastoris,
isso foi o que eu, humilde de mim, vi,
quando de ler escritos apócrifos
de gente que vive sem sócios
ou gerentes de suas vidas,
espelhos cosmológicos em dissensão,
homens de conquistas variadas
sem nenhum brasão ostentado,
fura-bolos de um deus brincalhão,
algo como pedras na imensidão...
Este Canto e não outro se provém
do pouco que come ou bebe,
mas, por outro fato,
vive de desregulagens ou furiosa febre,
corpo de um Cristo sem corpo pregado
na estrela tatuada no coração...
Este Canto permanece aceso
como lanterna de um que procura outro,
vivo e resplandescente como a viva brasa
do coração do morto vivo
que permanece entre nós como fosse
o muito de todo o nosso pouco...
Neste Este Canto variadas vozes
ouço como fosse um coro tríptico,
vitrais da alma que recebe o sol
da transfiguração que me habita,
Este Canto tem a morte como consorte, muito, muito além desta vida...
|