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A Torta
Natasha Yeva

Yve acordou de manhã,ouvindo a máquina de lavar.
Eu sei que já passou por isso. Despertar ao som de ' batendo a roupa na maquina' ou ' lavando pratos na cozinha'.Provavelmente ,isso foi na época em que cuidavam de roupas e pratos por você
A garotinha sonhara com uma coisa mais do que exuberante,em sua mente infantil e determinada.
Uma torta de maçã.
Sim,Yve queria uma torta de maçã e não desistiria antes de comê-la.
E quanto antes,melhor!
    Saltou da cama sem se preocupar em arruma-la ,e bateu ligeira os pés descalços na cerâmica do corredor,chegando ao quarto dos fundos
-Mãe,Mãe!Me faz uma torta de maçã?- Yve puxou a manga da camisa social que a mulher vestia.
-Yve,agora não.- Negou,sem realmente ouvir o que a filha requisitara - Eu tenho que ir ao escritório.
-Oh!Então me leve junto!
Aquele protótipo de gente tinha um apreço incomum por transitar no escritório com suas perninhas flexiveis e seu tamanco barulhento.O mesmo gosto servia para as obras de arte feitas com clips de papel,dizer para os clientes como admirava as obras de Van Gogh,perguntar 'Mãe,sobre o que é este processo?' ou fazer o uso do mágico 'branquinho'.
'Branquinho',também chamado de corretivo líquido.Algo que Yve usou para pintar sua barriga inteira na ultima visita ao escritório.Uma substancia que pode causar muita preocupação aos pais,quando os mesmos descobrem que o produto não sai com muita facilidade e se vem obrigados a ligar para deus e o mundo procurando uma solução,que no caso,seria um pouco de removedor.
-Não!Eu tenho que atender um cliente.
-Então quando você voltar,fará a torta?
-Tá. - A mãe respondeu ,calçando os sapatos de couro.
-Mãe,você promete?
-Tá,Yve
-Mãe,você está me ouvindo ?
-Estou,Yve.Mas não adianta me pedir nada agora,estou indo trabalhar.- A mulher saiu as pressas do quarto,tilintando os scarpins como martelos nos azulejos que forravam o corredor.
Yve apoio o rosto no parapeito da enorme janela,observando os cabelos longos e dourados de sua mãe atravessarem os portões da casa
Algumas horas se passaram ali.
A garota distraia-se assistindo alguns desenhos de ação que seriam classificados 'para meninos',devido aos esteriótipos que envolvem a infância.
No entanto,ao final do episódio em que o herói da vez encontra todas as esferas do dragão,Yve perde a paciência e telefona para o escritório da mãe.
- Escritório de advocacia,pois não?-O homem atendeu,do outro lado da linha.
-Pai,minha mãe está ai?
-Ela está com um cliente.
-É rapidinho,deixe eu falar com ela.
-Yve,acho que não.
-Mas é questão de vida ou morte.
-Diga ,que depois eu falo pra ela.
-Depois será tarde demais!
-Yve!Oque você quer ,hein!?Não pode ficar atrapalhando sua mãe!
-É que eu acabei de olhar na cozinha e não tem maçã.
-E o isso é questão de vida ou morte?
-Sim!Por que eu não posso ter uma torta de maçãs Sem as maçãs!
-Ela compra as maçãs amanhã.
-Mas eu quero a torta hoje!Não amanhã...
-Ok,eu aviso pra ela.
-Você não vai esquecer?
-Yve!Tchau!
A garota foi até o quarto,ler alguma história sobre espíritos ,cujo o titulo do livro ela não fazia questão de gravar.
Não ,pais normais dificilmente presenteariam uma criança com uma obra literária envolvendo assombrações.
Mas Yve foi rápida o bastante para rouba-los do sotão,durante um 'feriado da faxina'
É. Feriado da faxina. Aquele em que você ,seus irmãos e pais dão um jeito nas coisas que estão empoeiradas ou naqueles objetos que não tem utilidade.Cadernos antigos,roupas velhas,moveis desgastados,televisões que não funcionam,livros que você não faria questão de ler novamente.
Como era o caso de 'A exorcista '.
Yve entretia-se no capítulo sobre o espectro gordo devorador de crianças,quando seus pais chegaram em casa.
-E as maçãs?-Yve correu até a sala,ansiosa.
-Oh filha,esqueci.- A mãe desmanchou o sorriso que trazia nos labios cobertos de batom.
-Eu não disse pra você avisar ela,Pai?
-É ,mas eu também esqueci.- O homem justificou-se,observando os movimentos projetados na televisão.
-Vocês tem Alzheimer?
-Yve,você tem 9 anos,não sabe o que é Alzheimer.- Seu pai manifestou-se ,indignado.
-Não faz mal,amanhã é outro dia.- A mãe tentou enrolar a criança.
-Quando você diz: 'Amanhã é outro dia',é por que não quer fazer o que eu estou pedindo,e tem esperanças que eu desista com o tempo.Eu preciso dessa torta!Hoje!
-Então eu compro as maçãs e você para de berrar!- O pai esbravejou.
-Ah...-Yve cruzou os braços tentando fazer-se indiferente- Pode ser.
Apesar da chuva que tomava conta daquela noite em novembro,as maçãs foram compradas.
Mas isso não foi o suficiente para Yve.
-Você não vai faz a torta,mãe?- A garota sentou-se no sofá,cutucando o braço da mulher.
-Yve!Sua mãe é feita de carne e osso!Eu preciso descansar!-A mãe esquivou-se - Vou tirar um cochilo aqui no sofá,você me acorda lá pelas 21:00 horas,que eu faça a torta.
Yve aceitou a oferta,esforçando-se ao máximo para alcançar a devida paciência ao longo das horas.
Ela não seria o tipo de criança/moça/mulher feita que rolaria no chão e berraria algo do gênero :
'Eu quero!Eu quero!TORTA!Agoraaaa'
Não,Yve se julgava uma dama. Venceria pela persistência e jamais pela potencia de sua birra.Era uma questão de orgulho.
-Ou!Mãe!Acorda,Mãe!E a torta?
-Que?!- A mulher estreitou seus olhos cansados- Ai que inferno!Já está tarde!São 23:00 horas Yve,eu não vou fazer torta!
-Mãe,sua traidora!Você prometeu!Todo o que eu queria era provar uma torta de maçã!O meu sonho!Tarde seriam 3h da manhã.E outra,faltam 15 minutos para as 23:00 horas-Apontou para o relógio na parede da sala.
-Então peça ao seu pai.
-Mas mãe ,ele não sabe fazer...
-Sabe sim,sabe sim - A mulher levantou-se batendo os calcanhares até alcançar a cama em seu quarto.
Yve foi até seu pai,fazendo-se de criancinha inocente,do tipo 'Papaizinho querido,faz uma tortinha pra mim?'
O pai sabia que já era tarde para assar doces,mas acabou cedendo.
De acordo com as estatísticas da casa,o pai de Yve era um osso mais fácil de se mastigar.Simples de se convencer.Enquanto sua mãe tinha o incrível dom de contornar pedidos que não lhe interessavam.
Depois de 2 horas, o cheiro de açúcar,misturado com o aroma das maçãs ,cravos e canela,imundaram os corredores da casa.
A torta finalmente se tornara real.
Yve correu para a cozinha.
Seus olhos brilhavam.Era capaz de ouvir anjos gritando 'Vitória' ao pé de suas orelhas rosadas. A saliva dominava sua boca.
Assim que colocou o primeiro pedaço entre os dentes,o engoliu dizendo :
-Ai...nossa...Está muito doce...Não gostei-Torcendo a cara por dois segundos,antes de disparar ao seu quarto,prevendo uma bronca tão colossal quanto sua persistência.
Deitou em seu travesseiro de penas,ainda com o sabor do açúcar derretendo-se sobre a língua.
Até que este tornou-se inexistente .
Não estamos falando de torta.
Nós nunca estivemos.
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Crônicas A Torta Natasha Yeva


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