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Fábula sem moral.
Conversa (des)afinada.
Alexandru Solomon

Resumo:
O bobo-adjunto faz graçolas que, por vez, arrancam um sorriso real. O bobo-adjunto sonha tornar-se , um dia, o bobo-pleno.

· Revelações de um antigo manuscrito, encontrado por um arqueólogo amador. A autenticidade do documento suscita profundas controvérsias no mundo acadêmico. A hipótese de tratar-se de um documento apócrifo têm uma legião de partidários. Vamos ao papiro, ainda em excelente estado de conservação, antes que seja confiscado.
·       
Num reinado, onde em se plantando, tudo dá, o bobo da corte está fazendo anotações num caderno... Não para de escrever. Está concentradíssimo. O bobo-adjunto faz graçolas que, por vez, arrancam um sorriso real. O bobo-adjunto sonha tornar-se , um dia, o bobo-pleno.
· – O que escreve aí, companheiro bobo? – pergunta – intrigado – o monarca Lulix I, o gaulês. O queixo do monarca treme – sinal de profunda impaciência. Os olhos majestáticos emitem relâmpagos no espectro ultraviolento.
· – Anoto os nomes dos tolos do reino. A propósito, acabei de colocar o nome de Vossa Majestade nessa relação... com todo o respeito que jamais me faltará.
· O queixo do monarca quase cai. Mal consegue reprimir a fúria que o acomete. O crime de lesa-majestade está tipificado.
· – Mas que ousadia, verme imundo! Antes de mandar açoitá-lo, até seu lombo sangrar, esquartejá-lo ou atirá-lo num calabouço de onde jamais sairá com vida – ainda não decidi – pergunto-lhe qual o motivo dessa insolência? Já é um bobo estável no emprego. Quer perdê-lo, ficar sem o fundo de garantia? – a voz tonitruante da Majestade indignada faz vibrar os cristais do lustre do palácio real. Cesse tudo que a antiga musa canta, quando essa voz se alevanta. Um bardo caolho, de passagem, acha bonita essa parte e jura em sottovoce aproveitar essa observação.
· O bobo faz uma profunda reverência e retruca, pálido ao perceber o quanto irritou o rei, arrasado pelas negras perspectivas quanto ao seu futuro próximo. Finalmente articula:
· – O motivo é simples: Vossa Majestade entregou o Ministério X ao seu súdito, o Sr. Z da chamada base aliada. Ele vai roubar até cansar, se é que roubar cansaria o Sr. Z. Fraudar e roubar é só começar.
· – Jamais prejulgue, serviçal indigno! E se não roubar, miserável fofoqueiro? Chega de dar ouvidos às maledicências do PIG! Por acaso grampeou as ligações telefônica do impoluto Sr. Z? Sua função – consta no job description, homologado pelo ISO – é divertir-me. Repito a pergunta: E se ele não roubar (ou pelo menos se o malfeito não for comprovado, por ser bem feito)? Responda, candidato à forca!
· – Nesse caso retirarei o nome de Vossa Majestade e colocarei o dele...
A partir desse ponto, o manuscrito torna-se ilegível

· ***************
·       
... A substituição dificilmente acontecerá, dizem as más línguas.


Biografia:
Alexandru Solomon nasceu em Bucareste (1943), mas vive no Brasil desde os 17 anos. Ao lado de uma sólida carreira empresarial, de uns tempos para cá passou a se dedicar a uma nova paixão: a literatura. Através da sua escrita nunca deixa o leitor indiferente. Um contador de histórias na velha tradição, empregando recursos que vão mostrar ao mundo em que vivemos, algo que pudesse estar perdido. Preparem-se, portanto, para uma surpresa que virá atrás da outra. Pois, Alexandru Solomon, além de humor, vai mais fundo. Autor de ´Almanaque Anacrônico`, ´Versos Anacrônicos`, ´Apetite Famélico`, ´Mãos Outonais`, ´Sessão da Tarde`, ´Desespero Provisório` , ´Não basta sonhar`, ´Um Triângulo de Bermudas`, ´O Desmonte de Vênus`, ´Bucareste` (contos e crônicas) e ´Plataforma G`, além de vários prêmios nacionais e internacionais por sua escrita.

Este texto é administrado por: Celso Fernandes
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