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A distancia da Lua
Matteo Brenta

Resumo:
Se a distancia entre a terra e a lua mudasse o universo inteiro teria que achar um novo equilíbrio. Nessa peça o aproximar-se da lua á terra, passando tão perto que um homem poderia pular nela, representa com simplicidade uma mudança épocal: a evolução do ser humano do Sapiens á Espiritualis. Através da subida e o aprisionamento de um homem quase banal na lua, levaremos de volta á terra algumas tensões metafísicas necessárias por uma representação holística da humanidade. Essa peça quer ser um espetáculo que comunique a sua mensagem independentemente do preparo cultural e da idade do espectador: por isso enfrenta com imagens facilmente intelegíveis só alguns aspectos dessa complexidade. Contrapondo teatralmente a palavra com o sonho, os desejos materiais aos alentos espirituais, entendemos envolver a platéia não através do racionalismo secular, mas apelando á sua infantil natureza transcendente. A comunicação entre as três personagens será a maior evidencia da evolução deles: passarão da uma frustrante incomunicabilidade feita de palavras á uma imediata e total comunicação espiritual. Outras sugestões encostadas á ação principal completam a mensagem da peça; sempre com grande simplicidade serão resgatadas dá o moderno esquecimento a imanência do Universo, a fraternidade universal e o amor qual motor principal da existência.

Personagens. Um casal: Mariana e Luis. Caio: irmão de Luis
Sena: uma copa com varanda.
Mariana e Caio estão sentados ao redor da mesa. Mariana é nervosa, Caio a observa atento porem impassível.
Mariana: Assim não da, chega! Você que è o mais velho não pode negar, ele mudou, não é mais ele. Trabalhar nem pensar, fica aqui, olho perdido, desbundando de cueca na cozinha. Quando me atrevo e abro boca, ela dá uma de machão. (Mariana imita a voz masculina) Já trabalhei até demais! Até um jegue tem direito a sonhar! “A vida não é feita só para puxar o saco do chefe e pagar as contas”. Então eu entrego as contas vencidas na mão dele e ele as olha como não tivesse nada a ver com isso: as deixa cair no chão e volta a se perder não sei aonde. Caio, eu não aguento mais! Agora inventou uma nova moda, repete baixinho sem parar sempre as mesmas palavras: (Mariana imita a voz masculina) “Paralelos. Esféricos. Siderais”. Também falando de arroz e feijão ele encontra um jeito de enfiar lá dentro Paralelo, esférico, sideral. É obsessivo, me deixa loca! Para não falar de quando me olha e me diz (Mariana imita a voz masculina):” Não há conflitos entre evolução e criação!”. Acho que ele também quer uma resposta, mas o que deveria responder?
Lembra? Quando a gente se casou não era assim, aliás, até o outro mês era o de sempre: trabalhando duro para realizar nossos projetos, a gente compartilhava tudo... bom ,claro, nem sempre tudo era perfeito, mas o casamento é assim mesmo, altos e baixos...Mas agora estamos no fundo do poço!
Mariana se levanta, se vira dando as costas para o Caio que fica desorientado, apavorado.
Mariana: Você que é seu irmão, o que você pensa disso?
Mariana se vira, os dois se olham curiosos. Mariana perde a paciência.
Mariana: Pombas! Mas que família é essa! Um fritou os miolos e outro nasceu surdo!
Mariana chega perto de Caio, mexe muito a boca para facilitar a leitura dos lábios.
Mariana: O que você acha?
Caio procura a concentração ante de responder. A sua voz é esquisita, plana. A entonação discorda, quase sempre, com a mímica e as expressões do rosto. Quase nunca da para entender se quer duvidar ou afirmar.
Caio: Tá sonhando! Pode ser importante?
Mariana: Como estou sonhando? Te digo que ele é todo dia sempre mais lunático! E claro que é importante! Se continuar desse jeito acabo matando ele!
Caio: Você sonha? Pode ser importante!
Mariana: Não, não, há séculos que não tenho tempo para isso. Deixa os sonhos para lá e me dá uma dica para fazer seu irmão com os pés no chão.
Caio: Ele gosta muito do amor com Lua! Chama ela? Você, ele e Lua.
Mariana: Sabia! Tem outra no pedaço! E você cafetão tem a coragem de propor um joguinho a três!
Caio: Sim! Não? Espera, não!... Sim? Não Lua, a Lua.
Mariana: Para com isso ou vou jogar uma cadeira na sua cabeça, não tente remediar! Eu sentia! Todas aquelas carícias, novas idéias na cama... essa nova super potencia inesgotável. Tá na cara! Ele aprende essas coisas com aquela puta e depois, para limpar a alma, volta para casa e quer fazer o mesmo comigo! Bastardo filho da puta! Assim que voltar...
Caio, frustrado, baixa a cabeça e vai em direção da porta.
Mariana: vai aonde? Ainda não acabei com você! Merda! Sempre esqueço que é surdo!
Mariana segura Caio por um braço.
Mariana: desculpa. Por favor fica, sei que não é louco...
Caio com gestos tenta explicar que é inútil tentar se entender, que ela é nervosa demais.
Mariana: Ah! Então agora é culpa minha! Não é que você não acerta interrogativos e exclamativos e não dá para entender p... patavinas nenhuma do que quer dizer! Sou eu que sou nervosa!
Mariana se acalma e volta sentar se
Mariana: Vai, me ajuda a entender.
Caio se submete a vontade de Mariana como alguém que prevê uma catástrofe. Senta, procura longamente as palavras. Tenta ir embora, mas Mariana o segura.
Caio: eu e a Lua...
Mariana: Como! Você também vai com aquela puta?
Caio: Sim! Não? Como dizer, Não!...Sim? Espera (se esforça com medo) Eu chamo a Lua, eu fico de olho? Sonho! E ele vai?
Mariana fica uma fera, se levanta para bater o Caio que foge em direção a porta.
Mariana: e tem a cara de pau de me contar! Vocês nojentos, os dois! Essa de você não esperava! Porco! Saia da minha casa! Não volte mais, pervertido!
Caio: Sim! Não? Para! Não!...Sim? Entendi? Entendeu! (Sai de cena tentando evitar as pancadas)
Mariana se movimenta nervosa na cena: troca coisas de lugar, pega uma flanela e lustra qualquer coisa.
Mariana: Caio não é desse jeito, não pode ser a verdade, mas então qual é a verdade? Ou tem puta no meio ou viraram lobisomem além de doidos. Vai ver que essa Lua é um trans... Lua, típico nome por um trans... Mas o que estou falando! Especialmente o Caio sempre foi incapaz de mentir ou manter um segredo... E é por isso que confessou! Também aquele cretino do meu marido, quantas vezes se ferrou por falar a verdade! E agora só fala besteiras e transa com um trans? Não, não pode ser verdade. Com certeza é só um pastelzinho fora do forno, uma fraqueza, a crise do terceiro ano... Vai ver, não é um trans, mas uma vadia muito normal... Puta! Escroto!
Luis entra em cena: está embriagado.
Luis: A coisa melhor é o pôr pra fora. Ah sim, não tem coisa melhor que por pra fora. Porque esta me olhando com aquela cara? Sabe, meu amor pensei... Porque não levamos o colchão, melhor, a cama inteira lá pra fora, assim a Lua pode nos ver...
Mariana: Não vou te bater só porque está bêbado. Tenho pena de você.
Luis: Sim, é verdade! Estou bêbado, mas tive que beber! Eles me forçaram!
Mariana: Como você mudou, agora inventa desculpas esfarrapadas.
Luis: Eu juro! Tive que beber para desaparecer, ser como eles, me mimetizar. Você não os viu! Encaravam-me cuspindo fogo como dragões! (Choraminga) Sou um covarde, amarelei. Eu seu que tudo vai mudar, que a lua esta chegando para revelar seus segredos, mas tive medo. “Louco! Subversivo!” Um cara, vai entender porque, me gritou “Comunista!”. Levei também uns cola brincos, teriam me matado se não bebesse!
Mariana: Mas que bobagens, tudo mundo te conhece por lá, quem iria te machucar?
Luis: Nem você me acredita.
Mariana: Acreditar o que?
Luis: Tentei explicar muitas vezes, mas você não quer escutar. ela está chegando.
Mariana: Ela quem?
Luis: A Lua.
Mariana: Lindo nome pra uma vaca.
Luis: Porque chama de vaca uma coisa linda, misteriosa, grávida de mudanças bem aventuradas?
Mariana: E como deveria chamar aquela puta que você come enquanto seu irmão fica olhando? E ,olha, vou fingir não entender que está grávida também, se não te mato. Não quero saber mais nada. Vou para cama, nem tente aparecer na porta que se não te acerto com o lustre! Porco, pervertido! Bem que minha mãe me disse...
Mariana sai de cena.
Luis: mas do que está falando? Puxa, mas quem é o bêbado aqui dentro?
Luis, pensativo, se movimenta na cena.
Luis: Seria tão maravilhoso, eu e ela pulando na cama! Sempre mais alto, ate mexer na lua. Tenho certeza, é só tocar para entender tudo; eu e meu amor tocando a Lua! Devo falar com ela, tem que entender. (Vai em direção a porta, mas assim que mexe a maçaneta se ouvi o barulho de um lustre em pedaços.) Acho melhor deixar para amanhã.
Luis se prepara por passar a noite na cop. acabará se deitando na mesa com um travesseiro e um cobertor.
Luis: Amanhã reforço as molas da cama... Chamo o Caio para ajudar. Quando ela a ver tão perto terá que acreditar. Se ela tiver medo pegarei um pedacinho e a convenço a ficar perto de mim. Quero mesmo ver quando botará seu dedinho na Lua, quero ver mesmo se depois disso não vai acreditar. (Deita e cai no sono rapidamente) Quero ver... Quero ver mesmo.
Durante a noite, uma luz leitosa sempre mais intensa deixa intuir o se aproximar da Lua. Luis agita se no sono. A luz branca diminui deixando espaço aos primeiros raios de sol. Mariana entra em cena, olha Luis e sai batendo a porta de casa.
Mariana (fora de cena): Aqui está o outro putanheiro! Fale para seu irmãozinho que eu fui trabalhar, porque alguém nessa família precisa trabalhar!
Caio entra em cena. Observa o irmão dormindo. Cutuca-o cada vez mais forte. Luis não acorda. Caio fica perplexo, hesita antes de dar um tapa na cara do irmão. Luis, assustado, levanta-se da mesa com um pulo.
Luis: Eu não tenho nada a ver! Tava bêbado, falando burrices! (Luis olha ao seu redor) Porque me bateu?
Caio: Bem, pensei? Desmaio! Melhor acordar?
Luis: Não tinha outro jeito? Hein? O que esta fazendo aqui tão cedo?
Caio: Mariana entendeu tudo? Pensa que a Lua é uma mulher!
Luis: então foi você que enfiou essa minhoca na cabeça dela!
Caio: Já tinha na cabeça?
Luis: Afirmativo ou interrogativo?
Caio: Afirmativo?
Luis: Mas ao menos você acredita em mim?
Caio: Sim?
Luis: Sim? Ou sim! Agora você vai me ajudar. A Lua está chegando. Temos que por a cama na varanda, reforçar as molas e treinar os pulos! Anda, vamos!
Luis arrasta Caio fora da cena. Voltam empurrando a cama até a varanda.
Luis: No teto do prédio seria ainda melhor, mas...
Caio: Mariana joga você abaixo?
Luis: Agora ela não pode entender, mas é só porque não quer entender. Expliquei mil vezes. Já já vai acontecer alguma coisa, algo importante e eu, não sei porque, farei parte disso.
Caio: ela diz que parece um poeta louco?
Luis: Agora não pode entender...
Caio: E os poetas acabam na sarjeta.
Luis: Agora ela vai ver, ver o impossível acontecer, um astro chegar a terra e não tem nada a temer, só a descobrir. (Luis fica excitado, pula na cama) Junto a mim milhares de pessoas estarão prontos para recebe-la: cientistas, poetas, sonhadores...
Caio: Certeza! Quebra a cama?
Luis para de pular e desce da cama.
Luis: Vou tomar um banho, estou fedendo pacas. (Sai da cena)
Caio sobe na cama, começa a pular fazendo poses sempre mais esquisitas. Mariana entra da porta e fica de queixo caído vendo a cena.
Mariana: O que que isso! Enlouqueceu? Sai da minha cama!
Caio indica os pés descalços.
Caio: Tirei os sapatos.
Mariana: é a estupidez que você precisa tirar da sua cabeça! Aonde está o outro lunático?
Caio: Chuveiro?
Mariana: Caio, faça o favor, volte outra hora que preciso trocar umas ideias com seu irmãozinho.
Caio (saindo): Luis! Tem uma onça na copa?
Mariana: E ainda faz piadinhas! O Luis! Vê se se mexe, ou preciso ir até ai?
Luis entra em cena.
Mariana: Foi visitar seu pai.
Luis: Ele vai bem?
Mariana: Bem. Ele me contou muitas coisas. Sabia que o Caio não nasceu surdo?
Luis: Não.
Mariana: Um aninho antes de você nascer ele fugiu de casa: o encontraram só no dia seguinte, surdo. O que acha?
Luis: Não sei, uma doença improvisa... ou se cansou de escutar, sabe, tipo os autistas... Sempre foi um esquisitão, mas ele é do bem.
Mariana: Ao contrario, eu já entendi tudo. Você quer ser como ele! Um loco sem responsabilidade! Um eterno adolescente!
Luis: Calma Mariana, já te falei mil vezes o que está acontecendo, mas você não quer entender.
Mariana: Tem coisa para entender?
Luis: Lembra de quando a gente se ama na cama... As coisas que te sussurro.
Mariana: Quais? As baixarias ou as poesias?
Luis: Oh, meu amor, para com isso...
Mariana: Eu parar com isso? Faz semanas que você fala besteiras dentro e fora da cama!
Luis: Não são besteiras, loucuras, é real, você vai ver. A lua está chegando. Passara tão perto da terra que com um pulo dará para tocar nela.
Mariana: Vou chamar um medico (vai em direção ao telefone, Luis a segura) Como poderia acreditar que a lua vai passar encima do prédio? E assim você pode mexer nela? Fala, me diga, quem poderia acreditar? você precisa de ajuda! Agora sim dá pra entender porque ontem você teve que beber. Essa estória tem que acabar ou vai dar em uma encrenca feia.
Luis: Tá bom. Me da só dois ou três dias. Se a Lua não chegar, pode me fechar em um hospício e jogar a chave fora; mas se chegar, pulará comigo?
Mariana: Se a lua se mexer só um pouquinho será o dia do juízo universal. Um pulinho uma ova! Vamos todo mundo para o hiperespaço!
Luis: Acredite, chegara e não vai fazer mal nenhum.
Mariana: Luis, o que te aconteceu? Não te conheço mais.
Luis: É verdade, não sou mais o mesmo. Ainda me ama?
Mariana (hesita): Não sei, agora não sei. Tenho medo de você, tenho medo do que diz, do que faz.
Luis: Mas e se a Lua chegar...
Mariana: Chegar ou não chegar, nada vai ser como antes.
Luis: Tem razão... Vai ser melhor.
Os dois ficam calados, não conseguem se olhar. Mariana senta-se à mesa e Luis, depois de varias hesitações, vai controlar as molas da cama; tira os sapatos e começa pular. Mariana observa – o piedosamente depois sai de cena gesticulando. Luis continua pulando sempre mais alto. As luzes simulam o por do sol, em seguida, a lua chegando perto. Luis grita de alegria; desce da cama, pega o telefone. Mariana volta em cena sem fôlego.
Mariana: Não pule Luis, por amor de Deus não encoste nela! Você tinha razão, vou pedir desculpa para sempre, mas por favor não pule!
Luis: porque não deveria? Chegou até aqui por mim e eu não deveria pular? Força! Vem comigo!
Mariana: tenho muito medo, por favor não pule.
Luis: Medo do que? Se quisesse destruir...
Mariana: Te peço, por favor não pule; alguma coisa vai acontecer...algo que não podemos prever...meu amor, fica, tenho medo...posso sentir, vai acontecer alguma coisa...
Luis: claro que vai acontecer! Vou mexer com a lua!
O clarão aumenta. Luis começa a pular.
Luis: Devo, devo conseguir... é só pegar um pedacinho... Vai ver, vai dar sorte!
Mariana: Para Luis! Pelo amor de Deus, para! Você não sabe o que esta fazendo!
Luis: ninguém sabe!
Um relâmpago deslumbra a platéia. O clarão da lua diminui rapidamente. Luis sumiu.
Luis (fora de cena): Mariana! Mariana! Não consigo voltar! Mariana!
Blackout
Mudança de cena
O palco volta devagar a ser iluminado. No fundo, uma luz azul faz intuir a presença da Terra. O empoeirado chão lunar brilha de luz.
Luis entra em cena, anda mexendo o chão com os pés, parece procurar algo. Faz gestos, murmura com a boca fechada.
Luis: Com tudo aquilo que eu vi por aqui é bem difícil acreditar em uma razão. Eu não sei o que estou fazendo, mas alguém sabe?
Pega um punhado de areia, joga-o com raiva; vai em direção do fundo do palco. Olha para cima.
Luis: Se deu conta que está falando sozinho, tá fazendo poeira. Sim, sei. Perdi o senso do tempo, talvez já tenha enlouquecido. Sabe me explicar porque fico horas olhando para as sombras que me visitam, ficam um pouquinho, abrem um belo sorriso e vão embora? Sabe... começo a ter ideais esquisitas como... e se tivesse poupado o Verbo? Tudo não seria mais fácil? Ficava calado, fazia tudo só com o pensamento... ficava calado invés de falar e eu não estaria aqui no lixeiro do universo.
Luis volta em direção da platéia, pisa em algo, para e a pega. É uma pequena estátua que ele observa atentamente.
Luis: Minha querida, quem te desejou não era um esteta! Melhor se calar, poupar as palavras para quem precisa de palavras, se não queremos ficar enterrados.
Luis vai ate o limite do palco, observa a plateia como esperando alguma coisa acontecer.
Luis: Olha ai vocês! Os sonhadores! E uma bela dose de criadores de desejos e poeira. Sei, chegastes até aqui para sorrir, mas hoje vão se dar mal. Hoje eu vou falar! Não posso escutar vocês e, por amor àquele que brincou com a lama para ter companhia, fiquem calados! Aqui as palavras fazem poeira! Só eu falo e isso já é bem arriscado. Não acreditam? Não sacastes? Prestem atenção.
Luis vai ate um raio de luz. Leva a mão do lado da boca.
Luis: Estou muito feliz de estar aqui!
Durante a fala nuvens de poeira formam-se na frente da boca dele. Escuta-se um forte barulho de poeira que cai.
Luis: Chutei uma pesada para vocês enxergarem direito. Aqui as palavras produzem poeira. Por isso não posso jogar conversa fora, mas hoje eu quero falar. Ele nos criou com as escorias do próprio desejo e nós fizemos a lua com as nossas. Essa é a única coisa que entendi ficando aqui e nem tenho certeza disso. Todo resto... um breu! Eu sou só um instrumento, um papagaio! Um oráculo cheio das duvidas que nem as sua profecias conhece! Agora, quem não quiser sonhar acorde e volte para os seus lençóis. Aqui nada se explica com palavras.
Luis volta no limite do palco, procura na plateia.
Luis: Todos ficaram? Claro que não posso proibir os desejosos de chegar e ficar! Você é um cara que vive os próprios sonhos? Pode chegar. Você é um que quer concretizar os próprios desejos? Alto! Fique em casa, não venha aqui me sufocar!
Durante a fala punhados de areia formam-se aos pés dele: ele os chuta longe com raiva.
Luis: Viu? Se falar muito fico como lá embaixo! Bloqueado, enterrado nos meus desejos! Mas dessa vez falarei, seja a minha primeira e ultima decisão desde que estou aqui!
Escuta-se um forte barulho de poeira que cai. Luis atua como um apresentador de circo.
Luis: Senhoras e senhores, adultos e crianças, vamos demonstrar como o Universo sé um lugar de conceitos puros e como as palavras são todas grandes ou pequenas mentiras! Não tenham medo, não cubram os olhos das crianças. Esse é um espetáculo para todas as idades. Damas e cavalheiros, grandes e mirins, um momento de atenção. Não é truque, não é ilusão, eis a pureza do Universo!
Luis leva as mãos á boca, respira fundo.
Luis: Espírito!
Uma grande nuvem de poeira sai da boca do Luis, os seus pés são cobertos de areia, escuta-se um forte barulho de areia que cai.
Luis: E agora, senhoras e senhores, por favor, notem a diferença.
Luis leva as mãos à boca, inspira.
Luis: Dor! Luz! Escuridão!
Quase não dá para ver a poeira saindo da boca dele.
Luis: Não é truque, não é ilusão! As palavras, para viajar no universo, devem perder a nossa imperfeição. Como nos são feitas de poeira e quase todas não vão além da lua.
Pensativo caminha. Senta-se, deita-se na poeira e mexe com ela.
Luis: Quantas vezes aqui sonhei sem entender? Não sei dizer. Não consigo livrar-me da suspeita que somos um descuido, pior, uma brincadeira cruel. Depois de tanto falar para criar um mundo maravilhoso sobrou um monte de poeira inútil e assim nasceu o homem. Prisioneiros da matéria na qual estamos. Forçados a desejos que só criam outros desejos, livres só nos sonhos.
Luis cala-se. Mexe a areia tentando dar uma forma; não consegue, joga todo para o ar. Levanta-se.
Luis: Chega! Não tenho mais nada a dizer! Se mandem, me deixe em paz! Tô cansado! Quero dormir! Não quero mais ver vocês!
Muita areia cai na cabeça de Luis, que com ela faz um travesseiro, deita-se e dorme. A luz diminui até a penumbra. Sentada na plateia, Mariana, de pijama, fica iluminada. Essa parte do dialogo é gravada: os atores recitam sem abrir a boca.
Mariana: Luis, meu amor estou aqui, mas você não pode me ouvir. Como são demoradas as noites sem você: muitos dias já se foram e cada um tentei entender porque a lua te levou, mas ainda não sei. Todas as noites procurei as palavras para te convencer a voltar, gritei em direção à lua como uma louca até perder a voz, mas não tem palavras. Só sei que sinto a sua falta, me faltam os seus sonhos, o seu jeito esquisito de me amar.
Luis: Mariana? É você? Mariana, se pode escutar, quero te dizer que sinto muito a sua falta, que nunca teria te deixado se não tivesse sido forçado por não sei o que.
Mariana corre e sobe no palco.
Mariana: Luis, Luis! Esta me ouvindo! Graças a Deus, te procurei, nunca parei. A lua ia e voltava, mas nunca te via. Morri de medo.
Mariana caricia Luis e abraça-o como uma piedade.
Luis: Mariana, a minha única lua.
Mariana: porque ainda não voltou, meu amor sem você lá aconteceram muitas coisas, você tem que voltar. Ainda não encontrou o que procurava? E afinal, o que procurava?
Luis: Não encontrei nada, desde que estou aqui nem lembro mais o que eu procurava; só sei que as palavras são mentiras e que aqui soltam poeira, mas nem disso tenho certeza.
Mariana: então porque não volta, sua vida esta perto de mim.
Luis: tenho medo.
Mariana: medo do que?
Luis: Da volta, da derrota, das pancadas dos amigos quando, bêbado falarei que o Universo não escuta as preces feitas de palavras... Pior, que o irritam como os vendedores ambulantes que batem na porta domingo de manhã.
Mariana: então não fala pra eles, só fala pra mim que sempre acreditarei.
Luis: Tenho medo Mariana, estou com muito medo. Tenho medo de ficar pior que antes. Medo de que o que imaginei ser um premio seja uma terrível punição.
A luz da terra, rapidamente, fica sempre mais intensa. Uma vibração sonora revela o magnetismo dela.
Mariana: Luis... Não sei o que... (Mariana comporta-se como uma sonâmbula, volta em direção da plateia) não tem mais tempo, preciso ir, acordar. Pense em mim, tenha Fé, não posso ficar... a terra... preciso ir.
Fim do dialogo gravado
A superfície da lua volta a ser iluminada. Luis acorda.
Luis: Mariana!
Procura Mariana, mas não a vê.
Luis: Você estava aqui, eu sei. Ainda tem o seu perfume no ar... Era um sonho, me apareceu como um anjo.
Luis vai ao limite do palco, procura na plateia.
Luis: Estão aqui ainda, quase todos, eu também; inútil se perguntar por quê.
Luis dobra-se tossindo.
Luis: Se meu destino for me sufocar, que seja; mas tenho alguma coisa mais para dizer. A lua é feita de desejos, desejos inúteis, um material do qual o Universo não sabe o que fazer. Aqui em cima, condensados sob a superfície estão as representações deles: sexo, dinheiro e violência, não encontrei outras coisas.
Luis remexe a superfície lunar; cava duas pequenas estátuas: Um carro e uma representação erótica.
Luis: Um carrão bem poluente, uma sodomia que, julgando a cara do estuprador, não tem nada do amor. Dinheiro, sexo e violência. Só tem isso.
Ah, essa não vão acreditar! Aqui chegam todas as cartinhas enviadas ao Papai Noel e uma eu preciso contar para vocês, diz: “Querido Papai Noel, hoje me levaram na igreja porque é a sua festa e não entendi uma coisa: porque atrás do altar, invés daquele cara na cruz, não tem o seu trenó? E porque no lugar daquele caras com a luz na cabeça não tem as suas renas?
Luis dobra-se tossindo.
Luis: Não pode ser assim, não pode ser só isso, deve ter uma razão, um mundo além das palavras. (tosse) Quebrar a corrente dos desejos, das ilusões. (tosse) Um contato. (tosse) O Espírito. (tosse) Uma vida sincera.
Luis desmaia. No fundo aparecem imagens de avatares, a luz simula o passar do tempo.
Mariana sobe correndo no palco
Essa parte do dialogo é gravada: os atores recitam sem abrir a boca.
Mariana: Luis! Luis, respire!
Mariana levanta-o um pouco e libera a cara dele da poeira.
Luis: Oh amor, me perdoa, nunca deveria ter te deixado, a minha única verdadeira lua, meu anjo.
Mariana: Você é meu anjo, você me fez sonhar.
Luis: Não encontrei nada, não entendi nada, só poeira; porque fui levado ate aqui? Só queria voltar, esquecer, voltar perto de você e do meu irmão. Só quero esquecer essa loucura sem sentido.
Mariana: Eu sei o porquê de tudo isso. Para trazer os sonhos de volta à terra. Sonhos que ultrapassaram a lua. Volta e os encontrarás. Meu amor, não pare de sonhar, fica comigo, não saia desse sonho, fica, continue sonhando.
O clarão e a vibração denunciam a chegada da Terra. Luis continua tossindo sem acordar; Mariana o arrasta até o fundo do palco.
Mariana: Força Luis... aguenta firme, a terra está perto... me ajuda, é a ultima oportunidade para você voltar. Me ajuda Luis!
Luis arrasta-se ate o fundo do palco. Um relâmpago deslumbra a plateia. Os dois sumiram.
Luis (fora de cena): Quero esquecer, só quero esquecer.
Black out.
Parte 3
Mesmo cenário da parte 1
A luz volta devagar. Luis esta na cama com Mariana. Dormem. Luis acorda, olha ao seu redor; levanta-se, se cossa, sai por uma porta. Pouco depois se escuta o barulho da descarga do banheiro. Entra em cena da porta, estranha a poeira no corpo dele e a tira. Mariana acorda.
Mariana: Luis! É verdade, voltou! Graças a Deus conseguiu!
Mariana levanta-se da cama e corre por abraçar Luis. Cobre-o de beijos. Luis fica perplexo.
Luis: Bem... Só dei uma voltinha...
Mariana: Me pareceu uma eternidade, tive tanto medo, meu amor.
Luis: Fiz o que tinha que fazer e voltei... não tem nada especial em... mas eu também estou muito feliz de te ver.
Mariana: Nada especial? Você mudou o mundo, o meu mundo!
Luis: Fazendo xixi?
Mariana olha Luis com terna censura.
Mariana: Sei que não acreditei em você, eu não podia acreditar, mas agora eu sei!
Luis olha ao seu redor amedrontado; examina o seu corpo com atenção.
Luis: se for por essa poeira... não sei ...
Mariana: Não precisa explicar nada meu amor, sei tudo, eu te vi!
Luis: Ah sim? (vacila) fazendo o que?
Mariana: quando estava lá, eu te vi. Você parecia um anjo. Sentia o Universo fluir dentro de mim! E muitas outras pessoas te viram! Quando souberem da tua volta tudo mundo vai querer te ver!
Luis: como assim, muita gente me viu? Como é que você sabe? Você não estava ai comigo. Tem alguma coisa que não bate; você que se empolga me olhando fazendo... Tudo bem, pode até ser, mas eu dando espetáculo... Imagina uma multidão observando a minha concentração para m...
Mariana: Luis é um dever! Como pode pensar em dar pra atrás? Você, o único escolhido entre todos?
Luis: Escolhido pra que?
Mariana: pra subir na lua!
Luis respira aliviado
Luis: Ah! Aquela estória... Parecia-me bastante esquisita essa estória do mundo querer assistir eu fazendo xixi! Tudo bem, fica fria, tudo passou. Dei uma bela dormida e agora tudo bem, tudo vai voltar ao normal.
Mariana encara Luis surpresa, apavorada.
Luis: Porque esta me olhando desse jeito? O que eu fiz? Que foi, perturbei seu sono? Poderia ser ...desculpa... fiz um longo sonho esquisito, mas já esqueci quase tudo.
Mariana: não lembra mais nada?
Luis: Quase. Sabe como são os sonhos, logo quando acorda ainda lembra alguma coisa, mas pouco depois tudo sumiu.
Mariana: Não! Não pode ser!
Luis: Agora esta me assustando. O que não pode ser?
Mariana: Você não pode ter esquecido tudo!
Luis: Mas era só um sonho, o que pode mudar se for esquecido ou não?
Mariana: Significa tudo! Você não pode destruir tudo, fingir que nada aconteceu. Não percebe dentro de ti que mudou a vida de milhares de pessoas?
Luis: Agora chega! Se essa for a sua vingança por aquilo que aprontei no mês passado, tá bom, conseguiu. Até demais. Foi cruel me beijar daquele jeito só para tirar um sarro de mim. Me dá licença, agora preciso ir trabalhar.
Mariana: Hoje é sábado.
Luis: Para com isso, já se divertiu as minhas custas, mas agora chega. Ontem foi quinta, então hoje é sexta.
Mariana: Hoje é sábado, vinte e oito.
Luis: Imagina, hoje é o dia dois, dia de pagar as contas. Acha que não sei? Faço isso todo mês!
Mariana: Já paguei todas vinte e sete dias atrais. Se enxerga! Ainda está coberto de poeira lunar! Jura que não lembra de nada? Você ficou na lua por vinte e oito dias!
Luis chocado, apavorado, pede para Mariana ficar calada. Vai à janela e olha para baixo.
Luis: Bom dia! Tudo bem!... Saberia me dizer que dia é hoje?
Uma voz (fora de cena): Hoje é sábado, sábado vinte e oito!
Luis anda vacilando chocado até a mesa e senta-se.
Luis: Mas como é possível? eu não me lembro de nada.
Mariana: Tem que lembrar! Nada pode ser como antes! Deve lembrar de tudo aquilo que você me fez sentir nos sonhos! Não pode ser! Seria uma catástrofe!
Luis: Exagera! Sim, vagamente, lembro ter sonhado com você... e tinha muitas outras pessoas... mas o que eu poderia ter dito para causar uma catástrofe!
Mariana: Não dizia nada, nos sonho você transmitia paz e harmonia; apesar de dar pra ver que estava sofrendo, parecia um anjo.
Luis: Não lembro.
Mariana: Não lembra que as palavras fazem poeira?
Luis: Não me lembro. Lembro só que o meu cérebro fez água hoje de manha cedo.
Mariana: Não pode ser. Você voltou ao de sempre! Tem que lembrar! Você me levou até a lua, me fez sonhar e agora...
Luis: Me ajuda invés de gritar. O que te dizia no sonho?
Mariana: Me transmitia a ideia do Universo... a palavra é o desejo da ideia de concretizar-se na terra. Mas a palavra não pode satisfazer a perfeição e por isso gera outras palavras, outros desejos que nos aprisionam...
Luis: Chega! Chega! Como poderia ter falado essas coisas? Eu que te explico isso? Eu? Eu nem entendo o que está me falando! Parece uma lunática!
Mariana: Agora que me lembro! Quando estava sonhando, te tirei da lua, senti que queria esquecer tudo, que tinha medo de voltar. Por isso que agora não lembra de nada!
Luis: (Irônico) Mas é claro! Claríssimo!
Mariana: Não lembra? Que a gente pode se comunicar com o Universo graças aos sonhos? Que o Universo é dentro e fora de nós, o mundo paralelo do espírito? Que nos sonhos dos outros somos anjos e demônios?
Luis: Vou chamar um medico.
Luis pega o telefone. Batem na porta. Entra Caio.
Caio: Eu sabia! Você voltou!
Caio abraça Luis e depois Mariana.
Caio: Estava começando a amarelar! Nossa! Poderiam ter te matado! Se você não tivesse voltado já... Nossa! Ainda bem!
Luis olha varias vezes alternadamente Mariana e Caio. Vai bem perto da cara do irmão e movimenta muito os lábios falando.
Luis: o que está dizendo? Estas são afirmações ou dúvidas?
Caio: Não precisa mais gritar na minha cara, não sou mais surdo!
Luis da uma volta e fica atrás dos ombros do irmão.
Luis: Meu irmão e minha mulher são loucos.
Caio: Loucos de alegria! Agora sim que a vida tem um sentido e isso graças a você!
Caio abraça o irmão com força.
Luis: Mas como? Você nunca escutou nada e falava daquele jeito...
Caio: Assim que você foi para a lua desmanchou aquele meu desejo de criança.
Luis, com andar cansado, volta a sentar-se.
Luis: Pelo amor de Deus, agora que dá para entender o que diz, me explica o que está dizendo.
Mariana: Caio, seu irmão apagou todas suas lembranças. Por medo ele não lembra de nada.
Caio senta perto da mesa.
Caio: Coitado, mas sempre tem um jeito do bem voltar à tona. Deixa te contar como tudo começou. Eu tinha quatro aninhos, os pais brigavam. Como sempre diziam um monte de mentiras um ao outro, eu tinha medo, me sentia sozinho e então fugi. Corri, corri até perder o fôlego, até chegar às lavouras. Quando as pernas não me sustentavam mais, caí no sono observando a lua cheia. Aquela noite sonhei com um senhor, que agora sei ser você, que parecia com um anjo, que me dizia que logo teria chegado para brincar comigo. Eu estava super feliz! Depois você, aquele anjo, me olhou e me perguntou se eu não teria escondido no fundo do coração, outro desejo. Eu te falei que não queria mais escutar ou dizer mentiras por toda minha vida porque me assustavam. Acordei surdo e mudo e voltei para casa.
Luis: Entendi.
Caio prepara-se para continuar a historia.
Caio: Faz pouco mais de um mês, escutei vocês dois brigando. Tive medo como quando era criança e então andei debaixo da lua para meditar. E ai, bom, você entendeu o que foi?
Luis: Não.
Caio: Sem querer caí no sono e te vi na lua. Sem falar, me dizia que eu teria sarado e outras coisas.
Luis: Que outras coisas?
Caio: Quanta pressa, dá um tempo! Vai ver, você também vai sonhar com elas.
Luis levanta-se e caminha.
Luis: E como sabia que eu voltaria justamente hoje?
Caio: Não sabia! Aliás começava a ter medo de ter te matado. Mas o teu patrão tinha te dado as férias pagas até hoje e então...
Luis: Férias pagas? Aquele atormentador sem coração?
Mariana: Ele chamou pouco depois da tua subida na lua, me disse que você apareceu-lhe em um sonho passando pra ele os números da sena. Jogou, ganhou e te deu as férias pagas.
Luis: E pra você? não passei os números? Não teria sido nada mal.
Mariana: Você voltou a ser o babaca de sempre! Claro que não! Você me deu e vai me dar muito mais!
Da rua escuta-se um barulho de muita gente chegando.
Luis: Deve ser atropelamento, vou ver.
Luis vai à janela. Assim que ele se debruça para olhar, escuta-se um clamor.
Multidão (fora de cena): An-ge-lo! An-ge-lo!......
Luis: Nossa! Tá fazendo o que, toda essa gente aqui?
Caio: Deve ser o pessoal que sonha contido... mais uns jornalistas... pode ser que souberam da sua volta e assim...
Luis: E como souberam da minha volta?
Caio: Alguém deve ter dado um palpite.
Luis: E quem seria esse alguém?
Caio: Alguém que te quer bem e também quer a felicidade de tudo mundo.
Luis: E que, por acaso, chame-se Caio.
Caio: Como poderia saber que você teria se esquecido de tudo? Pensei ter feito a coisa certa!
A multidão parece querer arrombar a porta de casa. Muitas vozes reclamam a presença de Ângelo.
Multidão (fora de cena): An-ge-lo! An-ge-lo!......
Caio: Melhor sair se não queremos uma porta arrombada!
Luis: Mas eu não sei o que dizer! Não me lembro de nada!
Mariana: Eu lembro tudo.
Caio: Melhor sair já! Eles vão derrubar a porta!
Luis: Eu, hein? Eu que não queria lembrar por medo de ser excluído, zombado e levar pancadas? Mariana, Caio, sem ajuda de vocês, não...tenho medo, mas se vocês me ajudarem...
Caio abre a porta, escuta-se muita gente gritando, os três saem.
O tempo passa. Chega o por do sol e a escuridão. Os três voltam em casa.
Luis: Não dá pra acreditar, te falei mesmo todas aquelas coisas?
Mariana: Me transmitiu puras como as águas das antigas.
Luis: São coisas lindíssimas, mas na multidão me pareceu ver também uns caras me encarando muito feio.
Caio: Ah! Aqueles? São os que não querem sonhar: são aqueles do fazer. Fazer dinheiro, fazer sexo, fazer amizades, fazer a guerra... Gente sem espírito. Tente contar uma piada para eles. Vão te olhar como um cretino. Se, ao contrário, eles te contam uma piada de mau gosto, você tem que rir.
Mariana: Pode ser que entenderam que entre vocês tem algo em comum e querem entender como levar vantagem disso.
Luis: Eu com aqueles não quero ter nada em comum, não tenho nada em comum!
Mariana: Tem sim.
Luis: E o que seria?
Mariana: O medo.
Caio: Para mim chegou a hora de dormir. Sabe, desde que fui para lua, sonhar é bem melhor que assistir a TV. O que será que sonharei agora que você voltou?
Mariana: Sonha com os anjos!
Caio: Boa noite e que ela nos leve à sabedoria.
Caio sai da porta, Mariana sai de cena. Luis começa a se despir.
Luis: Estou curioso, o que vou sonhar? Mas tem certeza que sonharei?
Mariana (fora de cena): Claro, tudo mundo sonha, só que logo esquece.
Luis veste o pijama, Mariana volta em trajes noturnos.
Luis: porque então todo mundo lembra ter me sonhado?
Mariana: Não sei. Vai ver que hoje sonharemos o porquê.
Luis e Mariana deitam-se na cama.
Luis: Você e Caio falam dos sonhos como se fossem melhor que cinema.
Mariana: Vai ver é muito melhor do que qualquer cinema. Boa noite.
Luis: Boa noite.
Dormem abraçados. O tempo passa.
Luis acorda-se de repente.
Luis: Mariana! Mariana! Sonhei! Foi lindo! Éramos eu e esse garotão em um lugar lindíssimo, tudo ao nosso redor era brilhante de limpeza, o ar puro como nas altas montanhas. Incrível ainda me parece podê-la respirar! Estávamos brincando com uma pipa estranha, gigante; tinha um monte de gente alegre ao nosso redor. Eu olhava para pipa e me sentia em paz, sem medos. Ai, de repente, me viro para o garotão e pergunto para ele: “A gente não passou um pouco da idade de brincar com pipas?” Ele me da uma olhada divertida e responde: “Mas como, eu nem nasci ainda!” E ai acordei.
Mariana: E não reconheceu o garotão?
Luis: Não, mas agora repensando melhor, ele parecia um pouco com você. O que esse sonho poderia significar?
Mariana: Era o Ângelo, o nosso primeiro filho. Bonitinho não é?
Luis: Como primeiro filho? Teremos outros?
Mariana: Muitos!



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Outros títulos do mesmo autor

Teatro A distancia da Lua Matteo Brenta


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