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Prisioneiros
Anderson Cristiano da Costa

O fato aconteceu na pequena Nortebelo. A criminalidade na cidade estava aumentando assustadoramente, todos os dias uma das 400 residências era violada. Era um fenômeno curioso, e ninguém sabia explicar a razão daqueles crimes. Bem, a verdade é que, passado algum tempo, todas as residências de Nortebelo já haviam sido violadas e, todos os cidadãos, já haviam cometido algum ato ilícito.
A prefeitura construiu um grande galpão, e o cercou com muros altos, coroados com arame farpado. A última pessoa que foi trancafiada naquele lugar foi o próprio delegado — já que, na falta das outras pessoas da cidade, que eram todas prisioneiras no enorme galpão, o delegado estava aproveitando para fazer suas refeições sem pagar. As casas sem moradores, e também o comércio da cidade, tudo havia se tornado um enorme restaurante gratuito. O velhaco estava então cometendo um crime, e foi obrigado a trancafiar a si mesmo naquela prisão abarrotada.
Bem, amigo leitor, toda a população da pequena cidade passou a conviver ali, enclausurada naquele galpão. Claro que havia as regras da prisão, quem cumprisse sua pena, naturalmente poderia sair dali. A menor pena era do João Maria, que havia sido trancafiado somente porque tinha pegado emprestada, por véspera da festa do carnaval, a peruca do Zé Batista. Obviamente o Zé não gostou da coisa, e deu queixa na polícia, e o João acabou sendo preso.
Pois é, João cumpriu sua pena e, no dia de sua soltura, negou veementemente sair da prisão. Toda a comunidade carcerária veio a ele tirar satisfações, dizendo que não havia motivo para um homem continuar na prisão, uma vez que cumprira sua pena, e exibia comportamento exemplar. Mas o João não quis saber, queria ficar no galpão junto com todo mundo.
Quando uma peleja não se resolve por bem, então o povo parte para a apelação, isso até que é natural. Foi montado então um julgamento, e o João era o réu. Seu crime: não querer sair da prisão. O cárcere estava muito apertado, e a comida estava pouca, não era possível ficar mantendo gente irresponsável ali. O tal João foi julgado e condenado, e sua pena foi ser solto no dia seguinte.
Logo pela manhã, os carcereiros, que também eram prisioneiros, botaram João para fora. O homem, do lado de fora, esperneou, gritou, chorou e grunhiu. Todos os encarcerados viram aquela cena, e temeram pela própria sorte. João vagou pela cidade vazia. Caminhou, sentou-se num banco, observou o vazio, e voltou para a porta da prisão implorando para que o deixassem entrar. Mas foram inflexíveis, dizendo que ele não havia cometido nenhum ilícito lá do lado de fora, o que então o excluía da classe a qual todas as pessoas no galpão pertenciam. João ficou absurdamente triste, e voltou para a cidade desabitada. Ficou andando a esmo pelas ruas durante dois dias, tentando pensar numa forma de participar do grupo que o estava excluindo... E ele teve uma idéia.
João foi até a maior padaria da cidade, apanhou um dos belos bolos que se encontravam na vitrine e saiu sem pagar, já que não havia ninguém no lugar para cobrar qualquer coisa dele. Enquanto caminhava em direção à prisão, deu umas mordidelas no bolo. Quando chegou próximo ao grande portão da penitenciária gritou o nome do dono da padaria:
— Ô Vicente!
No mesmo instante o homem apareceu alisando o bigode. O comerciante reconheceu imediatamente o bolo que João carregava, era uma das maravilhas de sua excelente padaria.
Vicente iniciou um berreiro tão absurdo que todos os encarcerados se encaminharam aos trambolhões rumo ao portão da frente. João, por outro lado, sentiu-se extremamente feliz, porque sabia no que ia dar aquela sua extravagância.
João foi acusado de roubo, o portão da prisão foi aberto e ele foi recolhido, recebendo uma nova pena.
Mas os problemas na prisão não terminaram por aí, porque desde então todos os dias alguém cumpre sua pena, e é obrigado a sair. Todos os dias alguém recebe nova pena, porque saiu e roubou alguma coisa na cidade vazia. O último a ser solto e receber nova pena foi o delegado, que, após a própria soltura, assaltou uma loja de roupas femininas e vestiu um espartilho, escandalizando todos os encarcerados, quando apareceu na frente do grande portão.


Anderson Cristiano da Costa
www.temasanderson.blogspot.com
contatanderson@gmail.com


Biografia:
Graduando em Psicologia, poeta, contista. www.temasanderson.blogspot.com
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