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Tempo para um recomeço
TIAGO ALVARENGA

O que seria da humanidade sem os grandes arquitetos e sem as grandes construções do mundo? Queria com essa pergunta achar um lugar para ir, um lugar para viajar, um lugar para me encontrar ou me perder. Pensei em vários locais, espalhados pelos quatro cantos do mundo. Pensei em Praga, na República Checa, ou alguma cidade do Peru, ou da China. São tantos os lugares e feitos que marcaram o mundo antigo, que eu não saberia mesmo escolher. Talvez o moderno me trouxesse mais conhecimento para o mundo atual, mas não contente, queria mesmo era navegar em outros mares, outros rios. Queria deserto, areias e calor. Queria ir a lugares em que, nem meu bom inglês facilitasse minhas caminhadas.
Cheguei ao Cairo. Aeroporto lotado, extrema desorganização. Estava perdido. Enquanto esperava um guia, policiais me cercavam e pediam propina. Foi caótica essa primeira visão de um dos locais mais antigos da humanidade. Os turbantes são mesmo a maioria por aqui. Fantástico! Pareciam alegorias, ornando todas as cabeças. A caminho do hotel, fui conhecendo a cidade através da “janelinha” do ônibus e não demorou muito para que eu avistasse as pirâmides. O tempo claro, meio esfumaçado, embaçava a imagem, mas mesmo assim os cabelinhos do meu braço já se arrepiavam e, em mim, se iniciava uma onda de sentimentos que, de tanta emoção, eu não conseguia distinguir. Afinal, eram as Pirâmides do Egito que meus olhos enxergavam.
A terra socada, misturada com areia, era o solo típico, tanto nas ruas e becos, quanto nos locais em que se viam, agrupados, os cabritos, burrinhos e camelos. O trânsito era realmente intenso, com muitos carros, caminhões e muita buzina. As motocicletas passavam com três passageiros. Capacete? Para quê? Logo imaginei que aquilo era um mundo sem lei. Desafiavam o perigo com largos sorrisos estampados no rosto. E eu também, obviamente, ria muito com todo aquele caos, pois, de fato, era muito engraçado não ver sinais de trânsito, nem faixas pintadas no chão. A lei parecia ser feita de buzinas e bom senso.
O sol “rachando” na cabeça, 45°C, e uma fila indiana de camelos — um desses passeios turísticos, com animais, à beira do rio Nilo — ajudava a compor a exuberante paisagem, já formada pela água escura do rio, que batia nas grandes pedras cinzas, e, acima, por uma árvore solitária, após a qual, ao redor, se estendia um forte verde e, enfim, o deserto, infinitas dunas de areia misturadas a um amarelo envolvente, simplesmente uma pintura.
O tecido egípcio é tradicionalmente uma marca registrada do país, e pode ser encontrado em todas as esquinas. Visitei uma comunidade de mais ou menos 200 habitantes, uma vilinha em que a rua principal se assemelhava a uma feira livre, onde os artesanatos, tecidos e lembranças eram comercializados, constituindo parte das atrações turísticas do local. Havia uma única escola, em cujas proximidades se misturavam crianças e adultos, com sandálias, túnicas e aquele pano cobrindo a cabeça — costume, e também proteção contra o sol. Próximo, no interior de uma capela, os mais velhos rezavam, cada um a sua oração, com muita concentração. Em meio a esse turbilhão de curiosidades, o mais engraçado foi um café com ervas, servido durante uma suposta aula, parte do roteiro turístico, na qual tentavam nos ensinar a pronúncia daqueles “desenhos” que eles chamam de letras. Eram visões e acontecimentos simultâneos que me faziam conceber minha própria visão do local. E eu queria “mastigar” e absorver toda aquela cultura e paisagens diferentes. Até uma garrafa de coca-cola, com o rótulo escrito em árabe, eu tive que experimentar para matar a sede no deserto. Aquele mundo era diferente de tudo o que eu já tinha visto. Aquilo era velho demais para ser verdade, e era curiosa toda aquela antiguidade.
O ponto mais alto dessa viagem foi o cruzeiro, que levou quatro dias subindo o rio Nilo, junto a uma esquadra composta por dezenas de outros barcos do mesmo tipo, uma espécie de navio de três andares. Viver dentro de um barco como aquele, tendo todo um dia pela frente em seu interior, pode gerar uma estonteante sensação de prisão, mas nada que não se amenize pelo grande alívio de se chegar até a proa do barco e ver aquele rio, o mesmo sobre o qual tantas vezes vi citações em livros de geografia, entre outros como o Mississipi, nos Estados Unidos, o Rio Negro, o São Francisco, o Tâmisa. Eu estava no Nilo.
Estava no Rio Nilo, e meus pensamentos já estavam no Rio Jordão, onde Jesus Cristo havia sido batizado. Ali, naquela proa, meus pensamentos voavam e meus olhos avistavam bem longe o pôr-do-sol, em meio às árvores. E eu já querendo estar em Israel. Minha vontade era batizar-me ou mergulhar no rio Jordão. Com uma roupa branca, eu correria por aquelas areias e pularia na água santa. O sonho foi tão bem desejado que o grande dia chegou.
Batizado no Rio Jordão
Uma fila, e nela, todos de branco, parecendo estar ali pela fé. Porém não era mais que um roteiro de viagem. Mas mesmo assim, pagando por aquilo, ao chegar ali, na margem do rio, na minha vez de tocar aquela água com os pés e pisar com vontade aquela areia, senti uma sensação agradável como nenhuma outra. A vida ali parecia reinar, os peixinhos pareciam se alimentar da nossa primeira pele. Eram tantos deles beliscando meus pés que, depois de algum tempo, aquilo parecia uma massagem confortável — resolvi deixar os pés imersos naquelas águas claras e limpas. Não havia como fugir ao pensamento. A energia ali era muito forte e meus pensamentos viajavam na lembrança do maior filósofo de todos os tempos. Naquele momento, Jesus Cristo estava mais presente do que nunca. Nada se compara àquela energia, uma verdadeira experiência religiosa. Eu não entendi o que aquela senhora dizia quando colocou a mão em minha cabeça, mas com certeza eram as palavras bíblicas, ditas ao batizar uma pessoa. E então ela me deitou, de forma que meu corpo ficasse todo submerso no rio Jordão. Foi uma experiência diferente, que me levou a perceber uma mudança espiritual, e saber, com certeza, que era ali o ponto final para essa vontade de conhecer outro mundo. Fui batizado às 15 horas, num dia de domingo, no rio Jordão. Era hora de entrar no ônibus e enfrentar mais fila. Mas antes, corri para ver o rio mais uma vez e aproveitei para tomar “duas mãos” de água para matar a minha sede, e também para levar um pouco do rio comigo.

***

Texto publicado no livro “Lugares, viagens e aventuras” www.revistagriffe.blogspot.com


Biografia:
Tiago Alvarenga Graduado em Publicidade e Propaganda. Viveu dois anos em Londres, onde passou boa parte do tempo escrevendo seu primeiro livro: Diário de um motorista de elevador — ainda não publicado. Amante de viagens, em 2009 desbravou o Egito e Israel em busca de vivência e conhecimento, experiências que mudaram de vez seus pensamentos a respeito do tempo e da vida. Atualmente mora em Belo Horizonte.
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