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Curitiba - Relato de Viagem
Flora Fernweh

Neste feriado da proclamação da República, eu e meu companheiro embarcamos em uma aventura rumo à Curitiba, capital do Paraná, e uma das mais belíssimas cidades do sul do Brasil. Após uma semana de expectativas e de organização dos preparativos, chegamos em nosso destino às 6h da manhã de sexta feira, e de pronto, já foi possível sentir a diferença de temperatura da região, famosa pelo clima ameno. Até a própria feição do ar em si é diversa daquele que sopra pelo litoral catarinense, sendo um pouco mais firme e denso.

Olhar de fora, enquanto estrangeiros, nos permite comparar a região visitada com aquela que vivemos dia a dia, de modo que também notamos diferenças no jeito mais fechado das pessoas, que parece conversarem apenas mediante provocação, além de seus traços fisionômicos, que mesclam características do povo indígena, e com frequência, traços asiáticos, e neste sentido, se observa uma certa similaridade com a aparência paulista, ainda que no tempo atual, a população do sul já esteja bem miscigenada.

A quantidade expressiva de igrejas também chamou a atenção, sendo verossímil a conclusão de que o povo curitibano é bastante devoto. No entanto, o curioso foi que não nos deparamos com cemitérios e sequer vimos algum durante nossos dois dias de passeio. Além do mais, parte significativa da história do estado do Paraná e dos municípios que o compõem deu-se sobre os passos da colonização italiana, de forma que sentimo-nos em uma região europeia.

Outra observação se refere à vegetação local, em que predominam araucárias, que são árvores-símbolo da região, e pinheiros, sendo que não há incidência de árvores latifoliadas, muito comuns em grande parte de Santa Catarina. Aproveitando o ensejo do assunto, Curitiba soube se aproveitar de maneira sábia de suas riquezas naturais e utilizá-las a seu favor como chamariz. A cidade, conhecida por seu apelo ecológico, se mostrou muito sustentável, limpa, e sobretudo, verde, apesar de urbana, histórica e cultural.

Assim, as praias quase não fazem falta, diante da quantidade de vários parques bem preservados em diversos pontos de Curitiba. Não faltam opções do que fazer no tempo livre, de modo que a cidade supre todas as expectativas de quem busca um local dinâmico pela metrópole que é, e a um só tempo, sossegado em meio aos refúgios naturais. Em uma larga comparação, Curitiba guarda semelhanças com Belo Horizonte, mas em um nível não tanto acidentado nem suntuoso, além de um pouco menos amadeirado, e com pinhão ao invés do quiabo. Guardadas as proporções, é a Beagá tingui.

Sobre o roteiro de viagem, da rodoviária no centro da cidade, fomos até a acomodação que reservamos para passar a noite no bairro Prado Velho, e pudemos deixar nossas mochilas no local antes de seguir o roteiro programado. Ficamos hospedados em um condomínio de casas muito bem localizado, não tão distante da região central, e bastante seguro, tendo em vista que dizem ter aumentado nos últimos anos a criminalidade e a violência na região.

Nosso passeio turístico começou pelo jardim botânico, eu já o conhecia quando visitei Curitiba em uma viagem do colégio na oitava série, mas o lugar é encantador, e retornar me inspirou, como boa amante de flores que sou. Fizemos um piquenique e este foi o nosso agradável café da manhã. Ainda bem cedo, estava frio e o dia foi eminentemente nublado com algumas brechas para o sol ao longo da tarde. No jardim, fomos até a estufa de vidro e me deslumbrei com o jardim das hortênsias, com o gramado bem aparado e com o toque de Monet na área verde criteriosamente conservada.

Adiante, embarcamos em um ônibus turístico que nos serviu de transporte por todo o restante do dia, era um daqueles ônibus panorâmicos que nos permitiu ver a cidade do alto e parar nos pontos de maior interesse em visitar. Certamente gostaríamos de ter visitado vários outros locais, mas com o tempo contado na cidade, tivemos que selecionar aqueles que mais desejávamos conhecer.

Paramos no Memorial Árabe, e conhecemos o seu espaço interior. Nele funciona uma biblioteca não muito grande e um espaço para eventos e apresentações, contando com um nível para exposições e vitrais que traduzem um pouco da cultura homenageada. Curioso notar que a população curitibana advém de diferentes origens étnicas, como poloneses, ucranianos, alemães, italianos, japoneses e, inclusive, árabes.

Logo ao lado, no mesmo ponto, fomos conhecer o Passeio Público, um espaço ao ar livre com área verde, espaço para caminhadas e piqueniques, um coreto transformado em um telão de 360 graus e um mini zoológico de aves, como papagaios, tucanos e ararinhas.

Seguindo o passeio, e perto do meio dia, embarcamos novamente no ônibus turístico que nos levou até o Museu Oscar Niemeyer. No caminho, vimos o Bosque do Alemão, também chamado de Bosque João e Maria, mas não paramos para visitar e conhecer as suas trilhas ante os demais passeios que já tínhamos programado. A caminho, passamos por alguns bairros nobres da região, delatados por seus casarões e pelo requinte emanado dos condomínios de luxo, aliás, percebemos que em Curitiba, os condomínios de casas são bastante tradicionais e comuns.

O Museu Oscar Niemeyer (MON), por si só, já é uma obra de arte do modernismo brasileiro, e ao chegarmos, visitamos o seu interior. A primeira exposição que visitamos era uma exposição temporária relativa ao oriente, e adiante, havia exposições de objetos homenageando os continentes africano e o asiático, também vimos uma exposição de fotos e de arte contemporânea, e conhecemos um pouco da obra de Poty, artista conhecido na região, com algumas obras espalhadas pela cidade, em um estilo que me fez recordar um pouco das xilogravuras, mas desenhadas em caneta nanquim.

O museu, também chamado de museu do olho, devido à peculiaridade de parte da estrutura externa lembrar um olho em grande escala, nos convida a visitar esse grande olho enigmático, e era, de fato, a parte do museu que eu mais gostaria de revisitar, mas desta vez, a exposição do local ainda estava em montagem, de modo que em seu interior, não tinha tanto o que se ver, e naquele momento, fui lágrima no olho envidraçado.

Depois do almoço, mais uma vez fomos de ônibus até a Ópera de Arame, e fiquei extasiada com o lugar, eu ainda não conhecia e fiquei espantada com a sua beleza original e de natural fineza. A Ópera assim se chama porque sua estrutura é formada por vigas de ferro que parecem arame, e ao lado se situa a pedreira Leminski, logo abaixo há um lago com uma concha acústica que torna o lugar ainda mais sofisticado e agradável, a depender da boa música.

A Ópera de Arame foi, sem dúvida, o lugar que mais emocionou na viagem, e assim que saímos dela e voltamos para a fila do ônibus turístico, que inclusive, já estava bem cheia, vimos um estabelecimento logo em frente à bilheteria da Ópera com um cartaz e um grande boneco inflável anunciando um “licor de merda”. Certamente, uma tática para atrair turistas curiosos, de forma que caímos nessa armadilha e fomos visitar aquela loja de souvenirs e provamos uma dose do licor, que assim se chama por se tratar de uma bebida portuguesa, e apresentar outro significado na língua de Camões.

Aproximando-se do fim de tarde, seguimos até o Parque Tanguá, que igualmente me surpreendeu pelo chafariz magnífico, pela estrutura que de plano, me fez lembrar aquelas casinhas que montávamos quando crianças, com bloquinhos de madeira e telhados vermelhos triangulares. Já parecia um parque exuberante e bastante grande assim que chegamos, mas quando nos aproximamos mais, vemos que ainda tem muito espaço verde adiante. Assim como no jardim botânico, no parque Tanguá uma parte da estrutura é feita de piso gradeado, e tenho a impressão de que também vi mais vezes na cidade esse efeito que os paranaenses devem gostar: estar no alto, mas não perder o chão de vista.

Por fim, embarcamos no ônibus e fizemos um bom trajeto até aquele que seria o último ponto de visita daquele dia, a torre panorâmica. No caminho, passamos pelo Memorial ucraniano, pelo parque Tingui e pelo bairro Santa Felicidade, de forte influência italiana e que conta com o famoso restaurante Madalosso, o maior da América Latina. Chegando na torre panorâmica, que é um mirante da cidade com uma vista de 360 graus e mantido pela empresa telefônica Oi, recebemos a informação de que a visitação já estava fechada e que a fila estava imensa, de modo que seguimos viagem até o centro histórico da cidade, circulamos a praça Tiradentes e paramos na Rua 24 Horas, no centro de Curitiba. Trata-se de uma rua comercial, semelhante a uma galeria com restaurantes e café por dentro.

Decidimos, antes de voltar para a nossa hospedagem, caminhar um pouco pela região, foi assim que entramos em um café no bairro Batel que parecia ser bastante chique, comemos um croissant de chocolate com um chá preto aromático. Logo ao lado, ficava um pequeno shopping que paramos para conhecer, mas estava bem vazio, o Shopping Crystal. Voltando para o Airbnb, nos organizamos para a manhã seguinte e jantamos um hambúrguer, que, diga-se de passagem, foi simplesmente o melhor hambúrguer que já comi na vida, sem exageros.

Na manhã seguinte, fomos conhecer o Mercado Público de Curitiba e lá tomamos o nosso café da manhã. O artista Poty, mais uma vez, estava presente em uma obra artística que coloria o lugar. Em comparação com o Mercado Público de Florianópolis, ouso dizer que o de Curitiba me agradou mais, e é de fato, um mercado, com feiras e tendas dos mais variados produtos, além de ser um local fechado e bem organizado. Diferentemente do mercado florianopolitano, que é agitado, à beira mar e é basicamente formado apenas por restaurantes que servem pratos típicos da região praiana.

Na saída, contamos com a sorte de ainda conseguir embarcar no ônibus turístico, visto que a passagem tinha duração de somente 24 horas, mas conseguimos e fomos até o ponto subsequente, que se localizava na praça Santos Andrade. De um lado da praça fica o prédio do curso de Direito da Universidade Federal do Paraná, com uma fachada fascinante, em estilo neoclássico com pilastras marcantes que chamam a atenção, e no lado diametralmente oposto, fica o Teatro Guaíra, mas apenas visitamos o seu exterior, já que não estava aberto à visitação no final de semana.

Depois caminhamos pelo centro de Curitiba e conhecemos um pouco do movimento da manhã de sábado em razão do comércio local. Visitamos dois sebos próximos à UFPR, e caminhamos pelo calçadão. Até encontramos um grafite retratando o poeta Paulo Leminski, extremamente homenageado pela cultura local, e tivemos a oportunidade de participar de alguns jogos e brincadeiras que estavam disponíveis por ali, como futebol de botão e badminton, foi um bom momento de descontração. Logo em seguida almoçamos por perto, e em seguida fomos conhecer a Universidade Livre do Meio Ambiente (UNILIVRE).

A Unilivre é uma universidade ecológica e a céu aberto, com uma proposta alternativa que se conjuga bem com as aspirações ambientais da cidade. Para chegar até lá, já começamos fazendo uma mini trilha que termina em um lago também próximo a uma pedreira. Ao lado há alguns bancos de pedra ao ar livre e um palco circular à frente, lembrando um anfiteatro grego antigo. Subimos pela estrutura fixa de madeira que leva às salas de aula e a um pequeno mirante ao topo, chegando lá, um grupo de visitantes disse que havia achado bonita a cena enquanto estávamos lá embaixo encenando uma aula no palco, e nos fotografaram, registros esses que também são dignos de um conto.

Já com as passagens de volta compradas para o fim da tarde, tentamos mais uma vez ir até a torre panorâmica da cidade e dessa vez, conseguimos, apesar de a fila estar longa em razão de haver um único elevador que comporta uma carga máxima de 5 pessoas por vez, ainda pudemos rapidamente apreciar a vista do alto da capital paranaense e inclusive, reconhecer alguns pontos que tínhamos visitado, agora sob outra perspectiva, mais elevada e em tom de despedida. Este foi o último lugar que visitamos, na saída pegamos um Uber cubano que estava morando há pouco tempo em Curitiba e conversamos sobre a cultura de lá e daqui até chegarmos na rodoviária, outro estrangeiro em terras ainda mais longínquas de casa.

Foram dois dias em que aproveitamos ao máximo o que Curitiba tinha a nos proporcionar, olhamos atentamente cada traço de beleza da cidade, conhecendo novos rumos e apreendendo os detalhes das paisagens que inebriam todo aquele que enxerga algo de belo no desconhecido. Foi um tempo de qualidade e de inspiração no exílio curitibano, em contato com a natureza, com a arte e com o coração da cidade. Em nosso retorno para casa, ainda fomos recebidos com a lua cheia em todo o seu esplendor, anunciando um feriado que restará guardado para sempre na memória e no coração, primeira grande aventura a dois.


Biografia:
Sobre minha pessoa, pouco sei, mas posso dizer que sou aquela que na vida anda só, que faz da escrita sua amante, que desvenda as veredas mais profundas do deserto que nela existe, que transborda suas paixões do modo mais feroz, que nunca está em lugar algum, mas que jamais deixará de ser um mistério a ser desvendado pelas ventanias. 
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