Um sonho sufocante e uma conclusão brilhante.
Em 2007 resolvi executar um plano de encerrar um período de minha vida como proprietário de academia de Natação, a 4 Nados, fundada oficialmente em 1983, mas que já existia desde 1981. 4 Nados foi literalmente um sonho de minha adolescência, eu gostava de nadar e, lembro quando fui apreender, naquela época os métodos eram meio traumatizantes; meu irmão mais velho o Fernando me mandou com 4 anos na correnteza do córrego lá da Serra Negra, eu tinha crises de asma e tinha de nadar na água fria, depois foi lá no clube que ia na infância, com o instrutor, na piscina média, a oval e depois na piscina grande eram tardes e tardes de batidas de perna na pranchinha.
Depois que comecei a praticar a natação competitiva vi a distância que ela estava do mundo da aprendizagem, cheio de particularidades e etapas desconhecidas até então. Comecei a dar aulas de natação e ensinar pessoas a nadar, estudava Agronomia e era uma forma de ganhar um dinheiro para me manter. Depois de formado continuei o contato com a natação em uma pequena piscina que dávamos aulas lá no Gutierrez. Nos anos 80 e 81 foram anos de crise para minha área e meu emprego rodou; resolvi assumir a pequena escola e logo a coisa começou a melhorar. Nesse período percebi a falta de conhecimento que havia em relação a metodologia para introduzir as crianças pequenas de 0 a 6 anos na natação. Resolvi então fazer o curso de Psicologia com o objetivo de desenvolver o trabalho na natação. O resultado foi incrível, um método de trabalho multidisciplinar publicado em livro e um retorno profissional impressionante, nesses quase 27 anos tive aproximadamente 60.000 clientes que passaram por ali.
Esse trabalho foi divulgado em simpósios e congressos internacionais e nacionais de psicologia do esporte, além de ter enviado livros para todas as escolas de Educação Física do Brasil, os livros foram referencias de vários trabalhos de pós-graduação e graduação em educação física e nos trabalhos de educação esportiva infantil. A princípio pensava poder haver um hiato entre a psicologia analítica e as questões da educação e do esporte, fizemos várias tentativas para isso, mas o mundo institucional é cheio de hierarquias e dificílimo de mudar, acabamos desistindo dessa tarefa.
Porém em 2004 comecei a ter sérios problemas de saúde, coração sempre carente de cuidados que me faziam ausentar do trabalho, e uma dificuldade comercial de continuação do negócio, meu bairro havia envelhecido havia poucas crianças e a concorrência trouxe uma quantidade impressionante de academias para minha região. Cheguei à conclusão que deveria vender minha academia; “vender a minha empada caprichada pois não estava mais valendo a pena, o sonho tinha se transformado em um tipo de escravidão”, o sistema de impostos e taxas no Brasil havia me transformado em um tipo de servo e eu na verdade parecia não ter nada, apenas um feudo que deveria pagar eternamente pela ilusão de ter minha independência financeira.
E veio o projeto de fechamento da academia, planejei fazer isso em 3 anos, diminuindo as turmas, fechando piscinas, concentrando horários etc. No final vi como era uma ilusão ter um negócio pequeno no momento de nosso país, simplesmente nos tornávamos escravos do esquema a pressão por impostos, contribuições de vários sindicatos, associações etc., sufocante.
Fechei e vendi o espaço.
Realizei o objetivo, porém em minhas noites nasceu o seguinte sonho:
Eu chegava a 4 Nados, estava tudo funcionando, a Moniquinha estava lá dando aulas, a Sandra e a Dora, o Edson, o Rubinho, estava tudo normal, eu não entendia, perguntava quem era o dono da 4 Nados agora, não havia respostas. O comprador do lote, que tinha comprado o terreno para fazer o prédio tinha esquecido da dar sequência ao projeto, ninguém cobrava as contas etc., e tudo continuava como se nada tivesse acontecido.
Eu acordava agoniado, dava aquele aperto no peito e foram noites e noites desse sonho repetidas vezes.
O que era interessante é que muitas pessoas antes de fechar a escola, falaram comigo que não poderia fechar a 4 Nados pois era de utilidade pública, eu olhava as contas e o tanto de gente que aparecia para cobrar impostos e pensava assim, para mim não era mesmo.
Bom, os anos se passaram e fiquei curioso para saber o que resultou de tantos eventos para divulgar o método, livros enviados para as bibliotecas das universidades, simpósios e palestras, será que isso tinha sido a semente de uma mudança na forma de ensinar as crianças a nadarem. Basicamente no Brasil, ensinavam as crianças baseado em um método americano que ensinava crianças a partir dos 6 anos com objetivo de salvamento e o nado de crawl era o estilo 1o a aprender, no Brasil país tropical, as crianças nadavam muito mais cedo.
O fato era que como psicólogo da área de psicologia não conseguia me promover o suficiente nas escolas de educação física, elas têm até hoje os profissionais de psicologia do esporte que não precisam ter cursado um curso de psicologia e somente educação física para atuar como psicólogos. Tentamos mudar isso no Brasil, mas havia desinteresse da própria psicologia apesar de algumas escolas de psicologia começarem a ter a cadeira de psicologia do esporte também.
Enfim acredito que meu trabalho que considerava uma “obra prima” da criatividade e da pesquisa a moda tupiniquim e talvez ele tenha ficado esquecido ou copiado de forma rudimentar por alguns outros métodos que apareciam posteriormente, querendo se beneficiar economicamente do momento deles.
Desde a adolescência, sempre acreditei que o conhecimento era de todos, vinha do próprio universo, era sempre uma repetição da natureza, posteriormente descobri minha descendência indígena que reforçava mais ainda esse conceito.
Bom cerca de 17 anos depois de ter fechado a academia fui pesquisar um pouco sobre os métodos atuais de ensinar crianças a nadar e minha surpresa foi maravilhosa:
Havia no Brasil de 50 a 100 academias, clubes e escolas de natação que transmitiam o método 4 Nados, de forma parcial ou integral, trabalhando os mesmos conceitos de motivação, medalhinhas iguais para todos, os estilos ministrados ao mesmo tempo, dos mais fáceis aos mais difíceis, a presença das mães na água com os bebês sem mergulhar a força, a presença constante dos brinquedos nas aulas, etc.etc. As escolas e academias geralmente tem o nome que lembram o 4 Nados pois havia o registro da marca por 20 anos, porém terminando a empresa não renovei pois era uma coisa que não tinha sentido prático, mesmo tendo a marca, a pessoa mudava uma pequena coisa e aquilo já era considerado uma marca diferente, existem inclusive academias e escolas com o nome 4 Nados atualmente e sinto na verdade muito orgulho e a sensação que participei desse movimento para fazer o aprendizado da natação uma coisa mais saudável ou pelo menos seguindo a direção da saúde.
O método 4 Nados, tem esse nome pois vem de nossa mitologia mais arcaica, os 4 elementos da vida, Terra, Fogo, Água e Ar, simbolizam os 4 estilos de natação Peito, Craw, Costas e Borboleta, eles ficam marcados nas pessoas no momento que nascem e pelas mesmas forças cósmicas que regem o universo, são marcas que incrivelmente determinam a facilidade das pessoas de nadar um determinado estilo de natação.
Entendi pelo meu sonho que a 4 Nados não era minha, mesmo, era um desejo coletivo e universal que seria encontrado cada vez mais conforme fosse a intenção dos dirigentes de escolas, clubes e academias de satisfazer aos clientes, as crianças, e aos praticantes, transmitindo a saúde do esporte pelo amor de ensinar... a gente pode pensar o ato de ensinar sempre como um ato de reaprender e nossos métodos têm de estar abertos sempre para serem revistos e repensados de uma forma bem analítica, ce la vie...
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