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Muros e Paredes
José Ernesto Kappel

Sou da Córsega,
Mas não sou de vinho,
Sou belga e cosmopolita
Mas não sou companhia
Nem de sussuros,
Nem de composturas.

Sou dono de
Vinte Muros
E Vinte Paredes,
Não sou de vidro
Nem de carmim.
Mas sou dono
de Vinte Muros
e Vinte Paredes.


Meus amigos caminham ao largo,
Meus inimigos se juntam a mim
E, escudados de lanças,
Atiram flechas e estiletes
Contra
Meus Vinte Muros
E Vinte Paredes.
Guerra de vãos!

Guerreiro de bons dotes,
Sábio,mas lépido,
Me escondo
Entre eles,
Os Vinte Muros
E Vinte Paredes

Não há um que passe,
Dois tentaram e
Pararam no décimo.
O primeiro morreu no
Terceiro Muro
E o segundo se esfarelou
Quando encontrou a
A quarta parede.

Gente de glória,
Reis e rainhas.
Já que tentaram:

Mandaram guerreiros
E tropas bem-vestidas
Mas esbarraram em
Meus muros
E deslancharam nos
Muros pintados de cera
Branca e coberto por
Fuligem bem-passada.

Do céu vieram tochas
E, íngremes, cairam por
Perto.
Da terra vieram choques,
Tropas imensas de
Guerreiros.

Mas, pobres!
Meus Vinte Muros
E Vinte Paredes
Os enchotaram
Como bem o
Fazem com os cães.

Do lado de dentro
Há Vinte Muros
E Vinte Paredes
E nenhum homem
Me alcança.

Só quem lá chegou,
Por algumas horas,
Foi a mãe-parta,
Veio de visita
Para calcular a altura
De meus muros.

Pensou e calculou
E deu 50 anos.
Mãe-parta acertou,
Eram cinquenta e quatro anos.

Depois ninguém veio mais,
Os Vinte Muros e
Vinte Paredes
Foram perdendo a razão,
razão, pobre dela,
de existir!

Meus escudos para nada
Mais serviam!
Já que homem algum
Se interessava pela
Minha proteção.

Ela, cada ano,
Se lancetava e
Tomabava grandiosa.

Até que nada mais restou.
Meus Vinte Muros e
Vinte Paredes
Perderam o dom e,
Pobres, se esfolaram em
Terra velha e saibro de rio velho.

Num belo dia,
Quando o dia era de
Bom sol e calor
Como é de feitio em
Las Palmas,
Eles tinham sumido.

E de vazio em vazio,
Senti que de nada mais
Era dono.

A idade tinha chegado
E com ela, esfolaram
Meus Vinte Muros
E Vinte Paredes.

Fui morar, de remorço,
Na casa alheia,
Perto da praia de Castelha.

E daquele dia em diante,
Voraz e atiço, passei a construir
Muros e paredes de areia, mas
Que lá no dourado do sol,
Durava uma maré.

Fui chamado, já velho,
De rei da areia,
Construtor ocupado
De paredes e muros
De areia e conchas.

E por lá fiquei.
De sol em sol, mais
Envelheci.

Até que um dia,
- e um rubor me toma -
morri coberto de areia
junto com meus Vinte Muros
e Vinte Paredes,
que a sábia maré
fez por bem levar,
Lenta e sóbria,
Como o pai carrega
O filho.

Como a lembrança
carrega a vida.

Mas onde estão,
Tal pai e tal filho?
Encondidos nos sonhos,
De meus Vinte Muros
e Vinte Paredes?

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