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O Amor Pelo Torrão Desperta a Resistência Sertaneja
Manoel Messias Belizario Neto

Sobe ao céu a fumegagem
dos suores desses entes
Juazeiros, ingazeiras
troncos, gravetos presentes
Nos beirais desses rochedos
tão mais frios, tão mais quentes.

Amedronta-lhe os lírios
Sem perfume, sem odor;
Amedronta-lhes as matas
De uma secura sem cor
Amedronta-lhes o futuro
de um passado que ficou.

Seus corpos refletem àquilo
A cruz que lhes é pesada,
A profundeza dos olhos
Comovem leões e fadas
Que tocam suas feridas
mesmo assim não fazem nada.

Rios de pedras duras
lodo que se extinguiu.
Margens, moradas de peixes
Agoras cruéis e vis
São estradas para um vento
que ninguém tocou nem viu

Só escorre nessa estrada
Dos cílios daquele ente,
Suas pupilas e íris
Desde antes, desde sempre
Escorreram pelo orvalho
Que é também inexistente

Do chão sobe a fumegagem
Ar que parece poeira
A navegar pelos vales
A navegar pelas veias
Povoando os riachos,
Povoando as ribeiras.

(Voz desconhecida)

Antigos trovões,
Tempestades, ventos
Que em outras manhãs
Causaram tormento
Se agora viessem
Nas vozes das preces
Seriam alento.

SAGA

Fechado e calado
José segue
Há tanto não via a maldição
Um olhar no céu outro na Terra
Um olhar no céu outro no chão.

Maria, Maria e outras tantas
Faz cinco orações, cinqüenta preces
Louvores, clamores Petição,
Mas nada decorre do que pede.

José em silêncio se pergunta
Se o olho da serra não tem fim
pois as rosas murchas, ressecadas
davam mal aspecto ao jardim.

Dos bípedes, quadrúpedes, o que seria?
Talvez ali mesmo sepultados,
E em seu sepulcro reescritos
Vozes de saudosos epitáfios.

Perfume atraente aos abutres,
Já sobe do chão desabitado,
a raça tão próxima, quadrúpede
Obedece à seca qual gado
E os sulcos; a vida nutre
o chão infrutífero, imprestável.

LAMENTO DA MÃE

Eu ouço no vento a voz do fim
Nessa escassez desse terreiro,
Nem lira de pássaro ou curumim
vejo apenas incolores rochedos
As nuvens insanas de mim
Ao menos nos dão algum sobejo.

Minhas proles, meus bípedes, vegetais
E àquele a quem dei minha vida
Meu ninho será que entrelacei?
Será que essa vereda é sem saída?
Será que a floresta também sente
essa dor tão calada e ressequida?

Será que os campos são culpados
de terem sido gerados no sertão?
Será que a aurora é sabedora
da dor que corrói a emoção?
talvez não sejamos contemplados,
Talvez nossa alma em procissão.

Ó Deus a desgraça que nos cerca
Que distrata silvestres e selvagens
Já não sinto as bases e minhas preces
Adormecem perante a miragem.

O escuro da fumaça no teto,
O fogo no fogão apagado,
Refletem meu silêncio e emoção
Refletem antigos verdes roçados,
Que povoam meu planeta lunar
qual pasto de um ausente gado.

O pilão e moinho chorando
imploram a presença das batidas.
Que milho, que folha servirei?
Que nada, que tudo me convida
A entrar num túnel pedregoso
Seco, quente, morno, sem saída.

Eu olho o horizonte que reflete
Meus olhos vendo cinza sem azul.
Cinco estrelas no céu na noite límpida
para o norte apontam em vez de sul.
Nem um canto me é desabitado,
Nem canto de rola ou de anu.

Qual sono que nunca foi dormido,
No choro das proles me sustento.
Cílios que navio de mil quilos
Encalham meu mar de sofrimento.
Ó Céus, ó Tu que tudo sabe.
Do mandacarú ouve o lamento.

LAMENTO DO PAI

Sigo em frente na busca de molhar
na cacimba escavada minha dor
Talvez encontre ali o meu lugar
Talvez encontre ali o meu andor
Já que o que procuro não existe,
Já que o que procuro acabou.

Na serra se encontram adormecidas
As árvores, meu roçado que seria
Meu sonho de levar para taipera
elos, radiante, alegoria.
Pedaços de pau-d'arco de Zezinho.
Cascas de juá de Maria.

Sei que o lado que alimenta nossa veias
A exigente estrela-mãe já confiscou.
Havia vida a saltitar nas rachaduras
E essa vida em nossas veias se formou.

O marmeleiro e mata-pasto me disseram
Numa manhã antes que a vida lhes fugisse
Que a clorofila que pulsava suas veias
Extintas cores dos rebentos das matizes.

Porque se fosse pra morrer a flor beijada logo
a seguir o beijo -pássaro amador.
Nenhuma flor permitiria ser beijada,
E nenhum pássaro era chamado beija-flor.

Porque se o pasto que ficasse feito mato
Pra nenhum, gado usufruir provar-lhe o gosto
O mata-pasto o mataria ali calado.
Não sobraria nenhum calo em seu rosto.

Porque se o mel nunca fosse provado
De que valia ser doce, pensar nisso.
Se não houvesse a crendice, a rezadeira,
não tiraria mau-olhado ou feitiço.

Porque nós somos o abandono, o desespero,
Porque nós somos o desespero, o abandono.
O juazeiro cresce cheio de verdura
Não perde uma só noite de sono.
Já os pardais não cantam, não têm ritmo,
E o céu expressa infindo sono.

LAMENTO DO FILHO

O chão já não atenta à brincadeira,
Porque a fome não me deixa pensar.
O olhar dos genitores dizem muito.
Àquilo que os chãos querem falar.

Sou ave, sou peixe, sou roçado.
Nasci para voar, nadar, crescer.
Meu vôo, meu espelho, meu nado,
Vejo a seca vencer.

Sou tudo o que nunca o eu sonhara,
franzino qual cipó de muçambê.
Mas sei que tudo isso passará,
Nem sei se lembrarei quando crescer.

(surgem nuvens carregadas)

MÃE
Do céu virá a luz
Sementes de alegria
E o peso dessa cruz
já não me assedia.

PAI
A Terra se encherá
Crescendo em harmonia
Meus sonhos de veredas
Que eu perdi um dia.

MÃE
A lata preparei
A lata e o fogão
pois sei que brotará
do fundo desse chão
tudo o que se pensar
Milho, arroz, emoção,
sonhos, risos, abraços
letra de canção
que nos narra tudo,
desde à Criação.

PAI
Dilúvio de vida
Brota em roçado
Pasto nascerá
Dessa vez pro gado.
O pássaro já canta
Não fica calado
Meus sonhos renascem
Num ex-chão rachado.
Os peixes revoam
Num barco alado.

FILHO
Brinco nas veredas
Fazendo caminho
Persigo meu sonho
Que desce sozinho
Meu rio de vereda
Que já foi de espinho.
Já vejo um pardal
Me chamando ao ninho.
Já sei, já lhe sigo...
Levanto cedinho.

(Os primeiros pingos caem)

CANTO DO PAI
Unem-se fazendo poesia
Abrindo o chão fazendo amor,
Trazem ao sabiá mais alegria:
A foice a enxada e o cavador.

A vitória da batalha travada
Diminui certamente a minha dor.
A dor do cavalo e do mosquito
A foice, o machado e o cavador.

Escavando, cortando, buscam dar
Ao céu, mar e terra um louvor;
as aves e peixes e humanos,
A foice a enxada e o cavador.

CANTO DA MÃE
Cabaça de cuia florescendo
sorrindo suada se alinha,
Os varais balançam dançando
Cercando o maná de nossa vinha.

Terreiro lotado tal qual milho
Que lanço às saciadas galinhas
Cantam, ouvem, ciscam como nuvem
O farto maná de nossa vinha.

Carrego satisfeita esse peso
Que encherá os potes da cozinha,
Que também compõe o musical
do farto maná de nossa vinha.

PAI
A vinha e maná tão esperados
fazem se cumprir ao curral
o objetivo destinado
Segurar cabrito, ovelha, gado
Pra que foi construído, afinal.

MÃE
A vinha e maná tão esperados,
Fazem se cumprir à lenha
Pra que foi cortada a tanto tempo
Vinha e maná são, então, senha.

FILHO
Escorre em minhas mãos e há quanto tempo
Não brinco na lama, que sabor!
Do mormaço que sobe sinto um vento
Tão maravilhoso que chegou.
no maná de nossa vinha,
Bate enxada, foice e cavador.

PAI, MÃE E FILHO (em coro)
Seguimos a secura dessa vinha
Alternando-nos em um ciclo eterno
Primaveras e outras estações
a mais dolorosa é o in(v)(f)erno
estação que contrasta à alegria
Que simples sinais diferencia
pois um deles mais tempo prevalece
fome, fuga, fogo, fuba
Paraíso logo desvanece
Na flor de chique-chique e marmeleiro
Um disfarça a dor, outro entristece
Seguimos um caminho de esperança
Por isso estamos em constante prece.

Autor: Manoel Messias Belizario Neto
www.cordelparaiba.blogspot.com

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