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Febeapá século XXI
(Reflexões sobre o mundo contemporâneo - parte 4)
Roberto Queiroz

Stanislaw Ponte Preta estava certo desde 1966: o Brasil nunca passou de um grande Febeapá. O quê? Você nunca ouviu falar em Febeapá, o festival de besteira que assola o país? Então você, além de não-leitor (classe gigantesca que habita nossas verdejantes terras), é um típico brasileiro: desinformado e prepotente como todo bom brasileiro que se preze e bata no peito.

Febeapá são três volumes de pura anarquia. Uma tentativa satírica de repensar o Brasil, tentando tirá-lo da condição de república de bananas na qual sempre se encontrou. Infelizmente, aqueles tempos, não nos trouxeram nada mais do que amargas cicatrizes e discursos falaciosos que tentam idolatrar uma gente que não merece menção sequer no rodapé da história nacional. Mas não é disso que eu quero falar aqui...

Vim falar do hoje, do agora, do ululante desastre em que vivemos nesses últimos quatro anos. E a imagem que passa pela minha cabeça, após testemunhar toda a desgraça e caos que nos auto-infligimos em tão pouco tempo é: vivemos um Febeapá contemporâneo. Digo mais: institucionalizamos o besteirol como modus operandi e conduta para nossas vidas. E quem é minoria e não pretende seguir tal comportamento ou postura é engolido pela massa festiva, babaca, ignorante.

São tempos de Copa do mundo e torcidas alienantes posam de patriotas e choram enquanto fingem o hino nacional com sua mão direita no peito. Pobres lágrimas! Torcemos por versões estrangeiras de brasileiros milionários que não estão nem aí para nossos problemas. Nosso mais importante jogador, mais interessado em chuteiras coloridas, cabelos exóticos e namoradas globais, não passa de um reles cai-cai, à la Ortega (para quem nunca ouviu falar no nome: foi o pior jogador que eu vi vestindo a camisa da seleção argentina até hoje). "E o resto da seleção?", perguntarão. Tirando Philippe Coutinho, dá para chamar de resto mesmo. Lá se foram tempos de Romário, Pelé, Zico e companhia limitada. Futebol hoje, meus caros amigos, é business e nada mais.

Mudando de um polo para outro, o que pensar de nossa cultura pop? Bando de mal-formados, cheios de pose, caras, bocas, vozes estridentes, músicas sexistas. No teatro, tem até Jesus Cristo sendo interpretado por um transexual. Ah! E um festival de stand-up comedies bobalhões cujo único interesse é ver as plateias país afora rindo como hienas tresloucadas. (Detalhe: teve até atriz de pele clara sendo escolhida para interpretar a cantora Ivone Lara e sendo boicotada!). Na sétima arte nacional a situação não melhora nada. Até porque nossos espectadores não conhecem o verdadeiro cinema do seu país. Eles conhecem, isso sim, enlatados estereotipados produzidos por emissoras de tv que já emburrecem a nação há anos com suas programações absurdas. Tá bom ou quer mais?

Tá bom nada. Falta falar da categoria "cidadão brasileiro". Coloquei assim, entre aspas, não para enaltecê-lo, tecer-lhe loas, mas por puro deboche e cinismo. Nunca foi tão louco ser cidadão desse país!

Somos um povo que não conhece a própria língua (e adora aprender novas gírias que facilitem o processo de comunicação verbal), adora idolatrar artistas estrangeiros que são mais bunda, grito e pose para foto do que voz e talento (que o digam as atrações de festivais como Rock in Rio e Lolapalloza, só para ficar nos mais óbvios e conhecidos), finge de patriota em todo ano de eleição, mas é incapaz de não furar uma fila ou armar alguma pra cima de alguém (e depois prega o velho discurso de "tenho raiva dos corruptos, por que essa gente não morre de uma vez?") e como se tudo isso não fosse o suficiente, enaltece diariamente a máxima de que "produto nacional não presta; bom mesmo é mandar importar".

O Brasil (ainda) tem jeito? Já jogamos a toalha de vez? É melhor relaxar e gozar, porque melhor do que está não vai ficar? Quem espera sempre alcança? A esperança é a última que morre? Ainda pode piorar? Meu Deus! Para o ônibus que eu quero descer agora... Perguntas, perguntas e mais perguntas. Respostas? Se levarmos em consideração nosso histórico de tomada de decisão nesses 518 anos, é melhor não cruzar os dedos, pois pode demorar.

A sensação que (me) fica é a de que estamos dentro de um túnel que se recusa a encerrar e somos todos claustrofóbicos. Mas tem um problema pior: a grande maioria prefere encarar essa claustrofobia como uma festa que nunca termina. Então, vamos celebrar. Vamos! Vamos! O mundo pode acabar amanhã e eu não quero terminar desse jeito, triste, levando a vida a sério...

O Febeapá contemporâneo corrói nossas esperanças, nos desestabiliza, nos transforma em palhaços de um espetáculo pobre, imaturo, reles caricatura da verdade. Como se sai disso, dessa depressão social sem precedentes ?

Se Stanislaw Ponte Preta (o notório jornalista Sérgio Porto) estivesse vivo, o procuraria para tirar essa dúvida ou, ao menos, pedir uma dica. Precisamos sobreviver quando deveríamos estar subvertendo a ordem dos fatos. Nos acovardamos. E de covardia o povo brasileiro entende como poucos. Enquanto o novo caminho ou resposta ou solução não vem, pode por favor o último que sair apagar a luz?

Se tem uma empresa que eu não quero ficar devendo um centavo nesse país é a Light...


Biografia:
Crítico cultural, morador da Leopoldina, amante do cinema, da literatura, do teatro e da música e sempre cheio de novas ideias.
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