AS ELEIÇÕES ALÉM DAS URNAS
A responsabilidade da escolha
Artigo apresentado como requisito parcial para aprovação na disciplina Metodologia da Pesquisa Científica, do I semestre do Curso de Direito da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia ministrada pelo Prof. Dr. Joaquim Perfeito.
RESUMO
O artigo aborda o fenômeno da compra de votos no contexto histórico e apresenta dados de um levantamento empírico realizado através de uma pesquisa de opinião após as eleições gerais em Vitória da Conquista no ano 2006. São discutidas questões relacionadas ao significado da compra de votos no conjunto das questões ligadas à lisura do processo eleitoral. Procurou identificar quais ambientes oferecem mais resistência ao fenômeno da compra de votos e quais indivíduos são mais vulneráveis. Confirmaram-se hipóteses, mas também mostramos que algumas concepções são francamente errôneas.
Palavras- chave: eleições; compra de votos; consciência
INTRODUÇÃO
A questão da administração imparcial do processo eleitoral diz respeito à clareza e à transparência das regras, bem como à sua implementação neutra na competição eleitoral. Para este objetivo a independência da instância que organiza o processo eleitoral pode ser crucial. Vitória da Conquista reflete o avanço do Brasil em relação às questões da lisura do processo de administração das eleições. Duas etapas decisivas para isso foram a criação da Justiça Eleitoral em 1932 e a introdução do voto eletrônico entre 1996 e 2000- plenamente empregada aqui na cidade. A primeira foi o divisor de águas entre a administração de eleições viciadas pela ingerência política e uma instância independente para organizar e implementar o processo eleitoral. A recente informatização- que aliás, como bem pontuou a Presidente da 34ª seção, da 39ª Zona eleitoral de Vitória da Conquista, Mônica Veridiane, tem tido uma boa aceitação entre os eleitores, inclusive os mais idosos e os deficientes visuais têm elogiado o novo sistema - do processo eleitoral eliminou a questão pendente de fraudes na apuração e totalização dos votos.
Enquanto avançamos em um lado, por outro parecemos ainda viver em meios a coronéis e seus votos de cabresto. Não muito longe. Bem ao contrário: debaixo de nossas narinas.
Nas últimas eleições, tem-se realizado pesquisas para dimensionar a extensão do fenômeno da compra de votos no Brasil. Tais levantamentos, pioneiros no país, têm ajudado a esclarecer melhor a incidência do problema.
Imbuídos pelo clima eleitoral deste ano de 2006, realizamos uma investigação na micro-região de Vitória da Conquista para aquilatar a incidência da sedução dos eleitores por parte de candidatos, que não raramente oferecem dinheiro e favores administrativos em troca de voto.
Segundo Speck (2003), “as avaliações tanto de leigos como de especialistas sobre a relevância do fenômeno da compra de voto vão desde a visão otimista, de que estaríamos diante de um fenômeno de dimensões meramente folclóricas, até a afirmação que a presença generalizada da prática de compra de votos colocaria em questão a integridade das eleições”. As pesquisas sobre essa prática foram desenvolvidas por nós com a finalidade de trazer mais luz sobre um tema tão relevante e tratado com tanto subjetivismo.
Hipótese lançada no princípio de nosso projeto, de nossos estudos, constatamos que na concepção popular a corrupção eleitoral incide exclusivamente sobre a população de baixa renda e de baixo nível de escolaridade. Um primeiro resultado surpreendente da pesquisa refere-se exatamente à influência modesta da instrução sobre as duas modalidades de compra de voto. Em relação à renda, devemos igualmente reavaliar algumas idéias pré-concebidas. Mais uma vez, as incidências das duas modalidades de compra de voto apresentam uma distribuição relativamente uniforme em quase todas as faixas de renda.
Durante nossa investigação, deparamo-nos com uma barreira: dificilmente os entrevistados manifestaram-se de forma aberta à pergunta direta sobre eventual venda do voto a um candidato nos últimos pleitos. Dificuldade esta advinda de um certo constrangimento, pois a prática da compra de votos incrimina todos os envolvidos ou os compromete moralmente.
Mas ficou muito evidente nas falas, tímidas, mas bastante reveladoras, dos eleitores, quer humildes, quer mais abonados, que existe um compromisso moral para com o candidato, que constrói com esse eleitor uma relação de confiança, mecanismo que se revela eficiente contra possíveis traições.
METODOLOGIA
Na primeira etapa de realização da pesquisa, foi utilizada parte do questionário-modelo do IBOPE relativo à compra de votos no Brasil. Esse, foi adaptado ao universo eleitoral de Vitória da Conquista, mais precisamente, aos distritos do Iguá, José Gonçalves e Pradoso, que totalizam 6.667 (seis mil, seiscentos e sessenta e sete) eleitores.
Num segundo momento, com a garantia de uma boa representatividade, foram entrevistados 1,5% desse total:
Campo: 30/09/2006 a 01/11/2006
Universo: Eleitores (a partir dos 16 anos).
Amostra: 100 respondentes em 3 distritos de Vitória da Conquista.
Margem de erro: 2,2 pp., intervalo de confiança de 95%. Em cruzamentos: máximo de 4 pp.
ANÁLISE DOS DADOS
Os resultados da pesquisa apresentada a seguir devem ser observados neste contexto. A pergunta sobre a proposta de um favor administrativo em troca do voto foi respondida positivamente por 10,1% dos entrevistados e 6,6% afirmaram ter recebido uma oferta em dinheiro para vender o seu voto. No total, 13,9% dos eleitores receberam uma das duas propostas de negociar o voto.
INTERPRETAÇÃO DOS DADOS
Esses números encontrados na micro-região de Vitória da Conquista, traduzem a manifestação do fenômeno analisado, consoante com resultados mais gerais (nacionais), mostrando sua linear e constante ocorrência.
No que diz respeito ao grau de instrução do eleitor, o levantamento vem mostrar que, contrariamente ao senso comum, o nível de instrução tem pouca relação com a vulnerabilidade ao uso da máquina e à oferta de compra de votos.
Também no que diz respeito à renda familiar, a incidência de ofertas de compra de votos mostra-se essencialmente uniforme. Já o uso da máquina para fins eleitorais mostra-se significativamente mais freqüente quando focalizado sobre os eleitores de renda mais baixa.
Em relação à incidência das propostas de compra do voto por sexo, praticamente não há diferenças entre homens e mulheres.
Um fator que apresenta uma correlação maior com a corrupção eleitoral é a idade. Enquanto os jovens abaixo de 40 anos recebem propostas acima da média entre os mais idosos estes números diminuem significativamente. Verificando assim que quanto mais jovem o eleitor, mais vulnerável é para ofertas de compra de voto.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O avançar das pesquisas, revelou a existência de situações em que o eleitor passa ao papel de ativo no fenômeno da negociação do voto: ele mesmo solicita ao candidato uma recompensa material para o seu voto. Ato também passível de punição, previsto no artigo 299 do Código Eleitoral de 1965: “Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita: Pena – reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa”.
Levantamentos como este apontam para a existência de um problema com a realização de eleições que deveria estimular as autoridades, em especial o Tribunal Superior Eleitoral, a aprofundar o diagnóstico. Caberia ao TSE realizar tais pesquisas, para identificar onde a compra de votos e o uso da máquina são mais freqüentes para concentrar ali as ações de prevenção e repressão. Com efeito, devido às dimensões e disparidades do país, o alcance de uma pesquisa como a presente é necessariamente limitado, por razões materiais, pelo tamanho da amostra - a representatividade deste levantamento é apenas regional- mas ela é válida e prova que o assunto ainda tem que ser muito discutido e essa prática combatida.
Todo cidadão ou cidadã que souber da ocorrência de atos de compra de votos ou de desvios administrativos com fins eleitorais pode informar o fato imediatamente ao Ministério Público Eleitoral. à polícia e até mesmo ao Juiz Eleitoral.
REFERÊNCIAS
SPECK, Bruno Wilhelm. A compra de votos: uma aproximação empírica. Campinas, 2003. 19 f. Departamento de Ciência Política, Universidade Estadual de Campinas.
ANEXO
Questionário
1. Qual é a idade do senhor (a)?
2. Qual é o seu nível de escolaridade? Até que série o senhor (a) estudou?
3. Qual é a renda mensal da família?
4. Durante o ano de 2006, algum funcionário público ou intermediário ajudou o(a) sr(a) a resolver problemas na administração, estipulando como condição que o(a) sr(a) votasse em algum candidato? Sim/Não/NR/Não houve eleição (DF). (IBOPE, 2004)
5. Durante a campanha para as eleições de 2006, algum candidato, diretamente ou através de algum cabo eleitoral ou outro intermediário, ofereceu algo ao sr(a) pessoalmente pelo seu voto? (CASO SIM) E o quê foi oferecido? (ADMITE RESPOSTAS MÚLTIPLAS) Dinheiro/Alimento (incluindo cesta básica)/Vestuário (incluindo pares de sapatos etc.)/Materiais de construção (telha, tijolo, cimento etc.)/Outro tipo de oferta/Não recebeu oferta/NS-NR. (IBOPE, 2004).
|