O gelo do uísque trincava o copo. O resto do calor humano, num barzinho no distrito seis em Paris era agradavelmente agradável. Minha gravata borboleta cinza-escuro e meus óculos redondos pareciam agradar o odor feminino que exalava dali. Nunca entendi como um livro e um andar despojado atraíam o mulherio à minha volta, quero dizer eu nunca ia no L’ Orée du Parc para paquerar as gatinhas, ou algo do tipo. Aliás, eu nunca uso "paquerar" e "gatinhas" na mesma frase, é ridículo. É ridículo ter vinte e três anos e ser tão rabugento, é ridículo ter vinte e três anos e sua única companhia ser um livro do Budowski e alguns trocos no bolso, é ridículo ter vinte e três anos e amar um protótipo de mulher. Durante um quarto do ano eu tenho levado essa vida de boêmio depravado do subúrbio. Eu sentia gosto de jasmim quando a tinha em meus braços e era como se a mais bela bailarina dançasse em meu coração enquanto eu declamava poemas clichês, mesmo sabendo que nem eu, nem ela gostávamos dessa porcaria de romance. Ela colocava minha camisa pela manhã, e ajeitava meus óculos em seu rosto de cetim, corria até a cozinha e colocava um croissant na boca. Ai Deus, mas que lábios fúnebres ela tinha! Não me entenda mal, ela não era um cadáver, e eu não era necrófilo (porra, entenda que eu não sou um Shakespeare quando o assunto é ELA), era só que eu me sentia desvanecer em seus beijos, sentia que cada essência da minha vida era sugada pela magia da minha Jasmine. Todos os domingos ela ia para a casa dos pais, e eu dava um jeito de arrumar a bagunça de casa, só que hoje eu tento arrumar a bagunça da minha vida e nem todos os domingos de todos os anos seriam o suficiente para preencher o vazio que ela deixara. Porque uma mulher como àquela não passa despercebida. Porque uma mulher como àquela não pede permissão para ir embora. Porque uma mulher como àquela quando diz que te ama, ela ama de verdade. Porque uma mulher como àquela espera mais de um cara de vinte e três anos. Porque uma mulher como àquela quer que você pule do décimo quinto andar com uma plaquinha "Casa comigo?" ao invés de um anel de diamantes, e mais do que isso: ” Porque uma mulher como àquela não escreve repetidamente a mesma coisa quando, na verdade, deveria estar esperando-a em seu bar preferido com uma roupa cafona, tomando um uísque enquanto escuta o tilintar na porta e se ajoelha quando a vê entrar.”
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