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Amor da minha vida
Luna Mia

Resumo:
crônica

Amor da minha vida
Às vezes eu ficava observando a elegância com que ele dormia no sofá: mão no bolso e a outra sobre a testa. Eu durmo toda errada, com uma perna para cada lado, de bruços e ele, com aquela pose de galã... Até para dormir... E como era gentil, companheiro, amigo inseparável. Sempre tinha um galanteio para me fazer, não me poupando elogios. Acho até que, o que o tornava tão encantador para mim, era o modo como me olhava, apaixonado, e a admiração que fazia questão de demonstrar. Tinha ciúmes de mim, mesmo depois de vinte e um anos de convívio. Meus cinquenta e seis anos, com todo o desgaste e as marcas que este mais de meio século imprimiu em meu corpo, não diminuíram a sua atração por mim. Tínhamos momentos maravilhosos, como se fôssemos jovens amantes e nos entendíamos muito bem...
Uma vez, discutimos por uma bobagem qualquer e ele disse que não iria para nossa casa na serra, naquele fim de semana e eu, orgulhosa, disse que ia, mesmo sem ele, apesar de já ser tarde, o que, realmente fiz. Fui com minha filha e meu genro, dirigindo o nosso carro. Cheguei lá com o coração apertado, já sentindo sua falta. Fui arrumar as coisas pensando nele, na nossa discussão boba e em como seria sem graça ficar lá, sem ele. Passava de meia-noite... Ouvi barulhos na varanda e lá estava ele, batendo na porta: tinha vindo de ônibus e andado um bom pedaço do caminho, na escuridão, no meio do mato, carregando uma mochila, só para estar comigo... Era meu príncipe encantado, sempre me surpreendendo, sempre demonstrando o seu amor e o zelo que tinha para comigo. Como não amá-lo, como não ser apaixonada por alguém assim, tão especial? Ele era minha alma gêmea. Ficava feliz se eu estivesse feliz, triste quando me entristecia; até dor sentia quando eu sentia algum incômodo. O amor que ele me dedicava era tão grande, que serei grata a Deus a minha vida inteira, por tê-lo colocado no meu caminho. Ele foi maravilhoso para meu casal de filhos, órfãos de pai, ainda no início da adolescência que, agora, percebem o quanto o amavam... Muito mais do que jamais haviam imaginado...
Acho que poucas mulheres foram objeto de tanto desejo, paixão, amor, dedicação, respeito, amizade e admiração. Tínhamos esta coisa de pele, de sintonia, que permaneceu conosco até os últimos dias de nossa parceria, antes desta terrível doença invadir nossas vidas. Um dia, no hospital, antes da quinta cirurgia a que foi submetido, quando eu saía do banho, peguei-o, na cama, cantarolando um trecho da canção do Cazuza. Raramente cantava, pois era um pouco desafinado e preferia assobiar umas canções muito próprias, parecidas com canto de passarinho: _ “Amor da minha vida, daqui até a eternidade, nossos destinos foram traçados na maternidade”... Fiquei tão comovida, que não contive as lágrimas quando ele disse que estava cantando para mim, e que eu era o anjo dele... Como não chorar e sentir um vazio imenso no coração? Como não morrer de saudades, olhando o seu lado da cama vazio e relembrando os momentos maravilhosos que vivemos juntos? Como vai ser não sentir o seu perfume gostoso, que me envolvia, quando ele saía do banho, todo arrumado, pronto para qualquer programação ou, simplesmente, para ficar em casa, a meu lado. Ele dizia que, para ele, bastava a minha companhia, e muitas vezes, enquanto eu ficava no computador, fazendo algum trabalho, ou navegando na internet, ele ficava sentado, na “cadeira do papai” que eu dera a ele, de presente, fazendo palavras cruzadas e conversando comigo, só para estarmos juntos, um pouco mais. Fui tão feliz com ele, que a sua ausência chega a doer na minha carne, como ferida aberta...
Durante todo o tempo em que esteve hospitalizado, nunca derramou uma lágrima, nem demonstrou desespero ou revolta... Talvez quisesse me proteger de uma dor ainda maior, se me revelasse o tanto que aquela situação o afligia... Eu, por minha vez, também fazia de tudo para que ele não me visse chorando. Só uma vez, após a sua sexta cirurgia, depois de vomitar muito, já com a garganta e a boca muito machucadas, ele me disse: “Querida, acho que vou morrer”... Apesar do esforço enorme para manter-me firme e não deixar que ele perdesse as esperanças, eu não consegui segurar as lágrimas, mas disse a ele que não era verdade... Que ele superaria aquela fase e que nós, ainda, teríamos muitos anos felizes pela frente, o que, infelizmente, não aconteceu. Ele se foi no dia 3 de setembro de 2008 a uma hora e vinte e cinco minutos da madrugada.
Estive com ele todos os dias, sem exceção, o que me conforta muito, pois pude aproveitar cada instante com ele. Quando me despedi dele, na véspera de sua morte, já não havia vida em seus olhos e, embora eu esperasse vê-lo, ainda vivo no dia seguinte, algo me dizia que Deus o levaria e o pouparia de mais e maiores sofrimentos... Ele começaria a ser sedado com morfina, tão mal estava... Em casa, não conseguia dormir e, antes de ir deitar-me, telefonei para o hospital, onde o deixara, na companhia de seus dois filhos, para saber como ele estava, e a resposta foi que ele estava sereno, dormindo, mas inconsciente, como eu o deixara. Tomei um calmante, pois, desde que ele tinha saído da primeira clínica, onde se submetera a quatro cirurgias e fui informada da natureza de sua doença, não conseguira mais dormir sem remédios. Antes de adormecer, porém, acertei o relógio para despertar cedo, de manhã, e voltar para o hospital. Era, exatamente, uma hora e vinte e quatro minutos, quando olhei o relógio, antes de adormecer. Parece até que ele me esperou dormir para poupar-me e, também, poder descansar...
Agradeço a Deus por ter-me deixado fazer parte de sua vida durante todos estes anos, que foram imensamente felizes, em sua companhia. Agradeço a Deus, também, por ter posto um fim ao seu sofrimento, já que não havia mais possibilidade de cura para ele. Segundo o seu médico, o câncer se espalhara por todo o abdômen. Espero que ele esteja bem, agora, sem dores ou sofrimentos, já que se desprendeu de seu corpo tão sofrido e consumido pela doença. Hoje ele faria 59 anos e teríamos um jantar especial, para comemorarmos seu aniversário, juntamente com nossos filhos. Não sei como são as coisas após a morte. Não sei se ele pode nos ver e sentir a falta que está nos fazendo. De qualquer forma, vou comprar flores e colocá-las na janela, para ele. Talvez elas sejam plasmadas por algum espírito amigo, e ele as receba, pois sei que não lhe faltarão amigos, lá, onde ele está agora, já que era uma pessoa tão doce, bondosa e adorável. Só sei que a nossa história ainda não terminou, porque um amor tão lindo assim não pode acabar, tem que durar “daqui até a eternidade”. Por isso, não disse adeus, quando ele se foi. Disse apenas: “Até um dia, amor da minha vida”.


Este texto é administrado por: Maria Lefevre
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