Antes que viesse o sono
e acabasse com o meu dia,
veio-me um pensamento cansado,
que mal saberia dizer se era um sonho.
Pensei que a vida poderia ser comparada à noite
porque ambas nos servem para esconder mistérios.
A vida esconde algo bastante evidente,
simples, mas que nossos olhos não enchergam.
A noite também esconde alegrias,
certezas, algumas penumbras e um céu cinzento sobre estrelas reluzentes,
assim como a vida com seus momentos epifânicos,
serenidade e boas lembranças,
mas que em ambas não são contínuos.
Ora, seriam necessárias noites e vidas eternas
para se andar comparando sem se ver chegada,
pois, assim como o nascer do sol
põe fim momentâneo à insensatez noturna,
vem a morte, com sua inexorável persistência,
por fim eventual aos mistérios da vida.
As coisas que ora não vejo são mesmo bonitas.
As flores e as nuvens
são tão verdadeiras como o céu que vejo
nascer dos meus olhos tristes e vivos.
Se eu pudesse com as palavras dizer o que sinto,
certamente causar-me-ia espanto
colocar nos meus lábios,
friamente,
todos os sorrisos.
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