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Uma boa educação: Busca em Platão e Aristóteles
Edimilson dos Santos Gonçalves

Resumo:
Este artigo pretende traçar uma perspectiva de alguns problemas que estão presentes na educação brasileira atualmente. Buscando responder a questões como “O que seria uma educação essencial?” nas perspectivas de autores antigos como Platão e Aristóteles. Usarei como base as discussões sobre a reforma do ensino médio que estão sendo debatidas atualmente no Brasil. Para isso busquei perspectivas sobre a educação vindas de autores como Arthur Schopenhauer e Jean- Jacques- Rousseau, além de análises sobre a filosofia antiga do autor Pierre Hadot.

Uma boa educação: Busca em Platão e Aristóteles

Edimilson dos Santos Gonçalves - 16/0118255

Resumo: Este artigo pretende traçar uma perspectiva de alguns problemas que estão presentes na educação brasileira atualmente. Buscando responder a questões como “O que seria uma educação essencial?” nas perspectivas de autores antigos como Platão e Aristóteles. Usarei como base as discussões sobre a reforma do ensino médio que estão sendo debatidas atualmente no Brasil. Para isso busquei perspectivas sobre a educação vindas de autores como Arthur Schopenhauer e Jean- Jacques- Rousseau, além de análises sobre a filosofia antiga do autor Pierre Hadot.
Palavras-chaves: Educação, Reforma do Ensino Médio, Boa Educação, bem em si mesmo, Formação.


Abstract: This article intends to draw a perspective of the problems that are present in the current Brazilian education. Seeking to answer such questions as: What is an essential education, and perspectives of ancient authors like Plato and Aristotle. I will use as a basis the discussions about a high school reform that are being debated in Brazil. For example, Arthur Schopenhauer and Jean-Jacques-Rousseau, as well as analyzes of an ancient philosophy author Pierre Hadot.
Keywords: Education, High School Reform, Essential Education, Good Education, Formation, Well in itself.


Um dos problemas mais recorrentes e discutido atualmente é a educação. Como uma base fundamental para a vida de qualquer pessoa, a educação é o foco principal dos sistemas de governo que visam um desenvolvimento social e econômico, dinâmico e bem estruturado. É através de uma boa educação que as pessoas encontram a base para se tornarem o que são. Ou seja, é um processo formativo, que abrange todas as experiências e conhecimentos no qual cada pessoa é submetido, e forma assim o modo como a pessoa irá ver o mundo e se portar diante dele.
     O Brasil atualmente sofre um grande dilema em relação a educação. Estiveram em pauta medidas que visam reformar o ensino médio, com atenção principalmente na área profissional do processo formativo das pessoas e deixando de lado a formação dos conhecimentos práticos, que desenvolvem o senso crítico e a autonomia de cada pessoa. Áreas do conhecimento como Filosofia, Educação Física, Sociologia, artes entre outras, deixaram de ser obrigatórias nas grades do ensino médio.
Tal reforma causou um grande debate na sociedade, e trouxe a tona vários tipos de questionamentos sobre o que deveria ser essencial para o processo formativo das crianças e adolescentes no Brasil. Desses debates, foi percebido que existem duas perspectivas principais, sobre qual seria a melhor forma de se educar. Por um lado, pessoas que defendem a reforma, acreditam que a educação oferecida pelo estado deveria ser restritivamente para a formação técnica e profissional, e que disciplinas como Filosofia ou sociologia nada acrescentavam para a formação dos alunos. Já as pessoas que são contra a reforma, acreditam que tais matérias são essenciais para a formação não só profissional, mas também ético-social, de cada indivíduo.
     Sendo assim, no que consiste um boa educação? Essa é uma questão que está intimamente ligada com a vida das pessoas, não somente nas sociedades modernas, mas também nas sociedades antigas. Muitos filósofos modernos tentaram discorrer sobre o que seria um boa educação, ou uma educação essencial. Rousseau (1968) em sua obra, O Emílio, provavelmente foi um dos que mais se dispuseram a falar sobre um boa educação. Valorizando o estado de natureza e se atentando a uma educação que começa desde o nascimento, vendo as crianças como crianças, e traçando um percurso que para Rousseau (1968), seria a melhor forma de educar e formar um ser humano, que consegue ser um ser autônomo, livre e igual, em uma sociedade redigida por um contrato social. Porém, Rousseau (1968) não foi o primeiro. Nota-se em sua obra grande influência de pensamentos vindos de Platão e Aristóteles. Que por volta de 428 a.C já pensavam em uma processo formativo de um ser humano. As contribuições e as maneiras de pensar um processo formativo de um ser humano provavelmente tiveram seu inicio com esses pensadores.
     Percebe-se que a discussão sobre o que seria uma educação essencial, ou uma boa educação não só se restringe às sociedades modernas. Muito antes de serem fundadas as escolas e um sistema educacional regido por um sistema político, alguns pensadores antigos se propuseram a pensar sobre a educação. Platão em sua obra, A República, ao imaginar uma cidade perfeita acaba criando o que seria uma educação essencial. Tudo o que seria essa educação de Platão é extremamente rico, e reflete bem nas atuais discussões sobre o que seria uma boa educação.
     Platão, ao pensar em sua obra sobre a justiça, acaba traçando um processo formativo de cada indivíduo que irá fazer parte de seu estado perfeito, Paideia. Werner Jaeger (2010), em seu texto, Paidéia: A Formação do Homem Grego, fala que para que uma pessoa tenha uma boa educação, ela deve ser justa. Portanto a justiça seria a base fundamental de uma boa educação. Porém, o que é ser justo? Platão primeiramente diz que cada indivíduo é dotado de alma e que a alma é dividida em 3 partes. Cada parte da alma é responsável por uma parte daquilo que seria o indivíduo, e que justifica suas ações. A primeira parte é chamada de concupiscência, ela é responsável pelas paixões e desejos, a segunda seria o ímpeto, que tem como característica a coragem, o agir instintivamente, a terceira parte da alma é a chamada racional, é a parte mais pura e a que merece mais atenção, pois somente a partir dela a pessoa poderá controlar as outras duas partes da alma. Sendo assim, uma pessoa justa é aquela que consegue controlar bem as partes volitivas da alma, a concupiscência e o ímpeto, através da parte racional.
     A educação de Platão traçada por Jaeger (2010) remete a um processo formativo completamente íntimo, onde a pessoa acaba por conhecer a si mesmo, para que assim pratique ou se torne aquilo que, para Platão, seria uma pessoa justa. Sendo assim, como Platão contribuiria para as discussões recentes sobre a educação? Platão ao pensar um estado perfeito, se baseia em tal estrutura de justiça, no controle de cada parte da alma, e espelha seu estado em cima dessa justiça. O estado ideal de Platão então, é aquele no qual os cidadãos justos, que fazem parte desse estado, fazem aquilo que lhe são atribuídos da melhor forma possível, ou seja, de forma justa. Platão ao definir que cada pessoa deve fazer suas funções de forma justa, implica que cada pessoa nasce com um determinado papel, e que a execução desse papel, da forma mais perfeita, seria a estrutura de um estado justo. Uma pessoa que nasce com o papel de ser guerreiro,ou seja com um grande domínio natural da sua parte impetuosa da alma, não deve buscar outras profissões, que não seja aquelas designadas para ele, como professor por exemplo.
     Portanto,o processo formativo de cada pessoa exposto por Jaeger (2010), ilustra uma formação baseada em um conhecimento aprofundado de si, e o desempenho de uma papel na sociedade, que deve ser feito da melhor forma possível. Será que as reformas do ensino médio seguem esse caminho? Devo dizer que seria impulsivo afirmar isso, já que a educação que Jaeger (2010) expõe, consiste em um conhecimento aprofundado de si mesmo, fazendo assim com que a pessoa se torne justa, e somente assim consiga seu papel no estado ideal definido por Platão. Não seria papel das disciplinas reflexivas, como a filosofia ou a arte, aprofundar esse conhecimento próprio? Como exposto por Pierre Hadot (2014), em seu livro Exercícios Espirituais e Filosofia Antiga, a filosofia, desde a antiguidade tem como característica, uma área do conhecimento que se assemelhou muito mais a uma forma de vida do que a uma disciplina estritamente técnica e instrumental. A filosofia aqui aparece muito mais como um bem em si mesmo do que como um meio para algo, diferente das disciplinas valorizadas pela reforma.
     A forma de ver a educação como um bem em si é definitivamente importante para pensar sobre como ver a educação. Colocando a educação como um meio para algo, a reforma visa somente a formação de trabalhadores, que por mais que sejam qualificados tecnicamente, não passarão por um processo formativo que definirá aquilo que são e como devem agir. Schopenhauer (2009), em seu livro, A arte de escrever, crítica o conhecimento adquirido como um meio para algo, e não como um fim em si mesmo. Ele critica as pessoas que buscam conhecimento pelo dinheiro ou por um status social. Diz Schopenhauer:

Quando observamos a quantidade e a variedade dos estabelecimentos de ensino e de aprendizado, assim como o grande número de alunos e professores, é possível acreditar que a espécie humana dá muita importância a instrução e a verdade. Entretanto, nesse caso, as aparências também enganam. Os professores ensinam para ganhar dinheiro e não se esforçam pela sabedoria, mas pelo crédito que ganham dando a impressão de possuí-la. E os alunos não aprendem para ganhar conhecimento e se instruir, mas para poder tagarelar e para ganhar ares de importantes.(SCHOPENHAUER, 2009, P. 19, §1)

     Schopenhauer (2009),como um pessimista de sua época, diz que ser humano está propenso a infelicidade e ao sofrimento. Um exemplo que o autor dá é sobre os desejos das coisas materiais. Por mais que consigamos satisfazê-las ainda restaram diversos outros desejos que surgiram após esses, e muitos não poderão ser saciados. Isso faz com que a pessoa nunca se sinta realizada, e que inevitavelmente, acabe por ser infeliz. O intelecto para Schopenhauer (2009), então, tem um papel importante nesse mundo caótico. Somente o intelecto poderia dominar a vontade. Caberia ao intelecto conhecer e dominar as paixões e desejos para que assim se possa evitar o sofrimento. A crítica então cai sobre as pessoas que buscam a felicidade por meio do dinheiro ou status. Arthur acredita que mesmo com o meio para realizar todos os desejos, de nada servirá, se a pessoa não possuir um conhecimento para usufruir desse meio da melhor forma possível. Portanto um conhecimento que tenha valor por si só é a melhor forma de se conseguir a felicidade.
     Aristóteles, também valoriza um bem em si mesmo, e critica a visão das coisas como um meio para algo. Diz Aristóteles, em seu livro Ética nicomaqueia: “A vida [...] dedicada ao comércio e contra a natureza, e é evidente que a riqueza não é o bem que buscamos; com efeito, ela só existe em vista do lucro e é um meio para outra coisa” (Ética nicomaqueia, A 5, 1096 a 5-7.). Giovanni Reale (1997), em seu livro História da Filosofia Antiga, expõe os pensamentos de Aristóteles em relação à felicidade. Para se alcançar a felicidade em Aristóteles a pessoa deve ser virtuosa, ou praticar a virtude. Para que a pessoa seja virtuosa deve procurar sempre o justo meio, entre o excesso e a pouca quantidade dos sentimentos ou em sua forma de agir. Sendo assim, um pessoa virtuosa é aquela que ao se deparar com uma situação, como por exemplo uma amizade, deve atentar-se para que a amizade não seja nem exagerada demais nem simplista demais. Uma pessoa virtuosa procuraria então o justo meio dessa amizade, que seria uma amizade que receberia a quantidade certa de intensidade. Aristóteles também, como Platão, acredita que a alma é a porta estrutural para a formação de um indivíduo. Será aquela quem irá decidir como a pessoa irá se portar diante de sua vida, principalmente em relação a si mesmo, e as pessoas.
     A divisão da alma de Aristóteles se distribui da seguinte maneira: A primeira parte, chamada de vegetativa, e aquela na qual estão atribuídas o controle e a administração das partes do corpo, na qual a pessoa não tem controle, como os órgãos vitais (coração, intestino, circulação sanguínea), ela é a parte da alma que menos se pode ter controle consciente. A segunda parte chamada de sensitiva, que está encarregada pelas paixões e desejos, e a parte intelectual, que é a portadora da racionalidade, e tem como dever controlar a parte sensitiva da alma. O justo meio então e o controle da parte intelectual da alma sobre a parte sensitiva. É a racionalidade agindo sobre as paixões e as vontades, tornando a pessoa justa, para que somente assim alcance a eudaimonia (felicidade). ‘O verdadeiro bem do homem consiste nessa obra ou atividade de razão, e, mais precisamente, no perfeito desenvolvimento e atuação dessa atividade. Esta é, pois, a “virtude” do homem, e aqui deve ser buscada a felicidade.’ (REALE, 1997, p. 409)
     Aristóteles, define duas virtudes como Virtudes Dianoéticas, que são virtudes puramente racionais. A primeira delas é a sabedoria (phrónesis), que consiste em saber coordenar corretamente a vida e os hábitos do ser humano, tornando-o capaz de deliberar entre o bem e o mal. A outra e a sapiência (sophia), que é uma virtude mais elevada que a sabedoria, pois ela remete a ciência de algo além do ser humano, algo metafísico (Deus, cosmos). “A sabedoria consiste em saber dirigir corretamente a vida do homem, isto é, em saber deliberar sobre o que é bem ou mal para o homem.” (REALE, 1997, p. 417-418).
     Portanto, o conhecimento como um bem em si, e não como um meio para algo, seja dinheiro, status, ou o que for, é a melhor forma de se formar um ser humano em suas competências. Para que se torne um ser autônomo, definido por Rousseau (1968), que define uma educação desde o nascimento até a fase adulta. Um ser justo (Platão) que tem um controle sobre as partes mais impulsivas da alma, e desempenha seu papel de forma justa em uma sociedade ideal. Um pessoa virtuosa (Aristóteles) que consegue controlar as suas paixões e usar a racionalidade para deliberar sempre o justo meio, não buscando formas de agir, sentimentos ou paixões que sejam exageradas ou inferiores ao que seria virtuoso. A reforma do ensino médio segue um caminho oposto, valorizando o conhecimento técnico como um meio para algo, uma relação de interesses, que não visam a formação da pessoa como ser humano e cidadão, mas simplesmente como uma peça a ser utilizada pelo Estado. Cabe às disciplinas como a filosofia, artes, educação física e sociologia, possibilitar para a formação desses estudantes a possibilidade de deliberar uma forma de agir, a partir de um conhecimento em si, sua postura em sociedade, formando autonomamente uma conduta de vida baseada em conhecimentos, puros, que são bens em si mesmos.

Referências Bibliográficas
ROUSSEAU, Jean-Jacques. Emílio ou da educação, Trad. Sérgio Milliet, São Paulo: Clássicos Garnier, Difusão Européia do Livro, 1968.
STRECK, Danilo R. Rousseau & a educação. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. (Coleção Pensadores & Educação)
PLATÃO. A república. 2. tir. São Paulo: Martins Fontes, 2009.
JAEGER, Werner. Paideia: a formação do homem grego. São Paulo: Martins Fontes, 2010.
HADOT, Pierre. Exercícios Espirituais e Filosofia Antiga. É Realizações editora, 2014.
SCHOPENHAUER, Arthur. A arte de escrever. Rio grande do Sul: L&PM Editores, 2009.
ARISTÓTELES. Ética a Nicômacos. 4. ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2001.
REALE, Giovanni. História da filosofia antiga. v. 2. São Paulo: Edições Loyola, 1997.


Biografia:
Estudante de Psicologia pela Universidade de Brasília, atualmente no terceiro semestre. Teve experiência nos cursos de Direito pelo Centro Universitário Unieuro, e Filosofia pela Universidade de Brasília. Tem dedicado sua formação principalmente voltada à área educacional, desenvolvimento humano e interesse em pesquisas relacionadas a aspectos cognitivos e inteligência artificial.
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