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Os pequenos chuviscos já começavam a embaçar os óculos da menina, mas ela parecia não se importar, já que, ao invés de sair correndo em busca de um abrigo ou de chegar mais rápido ao seu destino, como todas as pessoas a sua volta, a menina simplesmente seguiu caminhando, ora apreciando a chuva, ora ignorando o fato e se perdendo em seus próprios pensamentos.
E como se quisessem abraçar a menina, os chuviscos começaram a ganhar forma e se transformaram em uma chuva grossa e pesada. O som dos passos ao redor foi aumentando conforme as pessoas começavam a fugir da chuva e a garota olhava ao redor se perguntando o porquê de tanto desespero, afinal, era somente água.
E no seu lento caminhar ela foi seguindo e pensando na sua vida até ali. Todos os momentos passavam em sua mente como se fosse um filme. Ela analisava todas as cenas e não se reconhecia, parecia outra pessoa, parecia uma marionete sem nenhum movimento próprio.
Se perguntava o que já tinha feito por própria vontade e que não envolvesse os quereres de pessoas alheias. E quanto mais tentava se lembrar, mais ela notava que sua vida foi, quase que totalmente, vivida em prol da felicidade e satisfação de outrem. Ela quase nada fez do que queria fazer. Aliás, o que ela queria da vida? O que ela almejava? Nem ela sabia.
Continuou andando e apreciando as lágrimas que caiam do céu. Até que finalmente chegou ao seu destino. A ponte.
A garota atravessa a pista não se importando muito com os carros apressados. Quando chegou a murada, ela subiu e abriu os braços.
Pela primeira vez em sua vida ela se sentiu livre, pela primeira vez ela acreditou que realmente poderia voar.
E, de braços abertos, ela se entregou ao único destino que ela escolheu sozinha, ao seu único ato egoísta em toda uma vida.
Ela nem reparou que tinha – quase que literalmente – parado o trânsito e que algumas pessoas estavam gritando e apelando para ela descer. Ela não conseguia ouvir nada além de seus próprios pensamentos e eles estavam mais alegres do que já esteve em muito tempo.
Em uma noite ela seguiu seus desejos e no dia seguinte conseguiu atenção que nunca antes tinha recebido. Atenção de muitos desconhecidos, afinal, quase todos os jornais traziam como manchete:
“Herdeira dos Kannenberg se entrega aos braços da morte”.
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