O despertador toca, está bem na hora de me preparar.
Preparar para o quê? O que se reserva no meu futuro próximo? Ou mistura danada de ansiedade, felicidade e vontade de alcançar o meu objetivo. É num escovar dos dentes, tomada de banho e arrumação de todo o meu conjunto de imagem que venho a me tornar mais segura, na convicção de que sou a pessoa certa e que conseguirei o meu tão sonhado pão de cada dia.
Passa o tempo, passo a cidade que moro e daí chego no meu destino. A recepcionista me dar um lindo sorriso acompanhado da expressão "bom dia!". Já fico bem mais tranquila, pois penso que ela teve esse atendimento só comigo, embora sabendo que é com todos, pois faz parte de sua obrigação ser simpática. Mas como é natural de todo ser-humano e como não sou diferente, adoro saber que pelo menos com ela o feeling bateu.
Com isso, o relógio vai sendo ainda mais observado e daí começa a dormência de um lado e do outro no cruzar de cada perna. Os dedos não sabem se convergem ou se ficam como as boas cavalgadas de cavalo, sobre o braço da cadeira. Faço-me as primeiras perguntas: como será lá dentro? Quais perguntas ele ou ela vai me fazer? Saberei responder? Sou capaz de conseguir e ser a escolhida, para ser a próxima miss simpatia da recepção? Pela beleza estou bem certa que sim, até porque aprendi desde a infância conversa com o espelho, espelho meu e pelo menos é o que ele me diz todos os dias.
Ponteiros na direção horária me informam que já faz uma hora que espero a entrevista. É quando finalmente um esplêndido homem de terno grafite com sua linda pasta e perfume irreconhecível passa por mim e com muita educação me dar um bom dia, se direciona e fala com a atual miss simpatia da recepção, numa voz bem baixinha perguntando "essa é a candidata?". A carismática mulher faz um gesto que combina imediatamente com um sim do balbuciar de seus lábios, que desbravam um som não ouvido, mas bem entendido. Assim, o gracioso homem se dirige para a sua provável sala, entra e ponto. Dai tudo volta a ser como a menos de 10 minutos a trás. Começo a ficar inquieta, pois a pressão nos vasos sanguíneos só aumenta. Que seleção é essa que demora tanto para acontecer? Mas para frustração de minha pergunta a resposta vem logo em seguida com a voz da atendente me chamando e comunicando que poderei entrar, pois seu chefe havia chegado e estava a minha espera dentro da sala. A inquietação começa a misturar com adrenalina. Faço um gesto de que entendi e assim entro na tão esperada sala.
Daí percebo que de fato o homem que havia me cumprimentado pouco tempo antes na recepção poderá, sim, ser aquele pelo qual serei ou não muito grata. Com isso, começam os tão famosos cumprimentos e perguntas, bem parecidas com as que já ouvi em outras entrevistas. Mesmo sentada, procuro manter a postura ereta, pernas cruzadas, mãos juntas segurando uma caneta, para evitar que transpareçam o meu real estado de espírito. Cabeça firme, com o olhar bem fixo no meu entrevistador. Tento demonstrar segurança e objetividade nas respostas as perguntas feitas. E com uma tentativa de quebrada de gelo feita pelo meu entrevistador, dou uma risada fasseira e gentil, para demonstrar que entendi o recado e que preciso me soltar mais. Procuro colocar os meus valores em jogo, nesse momento sou um produto que acaba de estar em oferta e que precisa ser vendido, só assim o lucro aparecerá. Mesmo após algumas tentativas de mostrar o contrário de como me sinto no momento, transparecendo a calma ao invés do nervosismo, parece que a entrevista se encaminha para o término. O formoso rosto do entrevistador começa a demonstrar interesse no eu produto. Por fim, é feito mais uma pergunta que me faz refletir e demorar um pouco mais para responder, até porque nunca havia escutado antes. Como não posso demorar muito, respondo de maneira clara, coesa e firme. Com isso, o recrutador estende a mão em minha direção, agradece pela participação e avisa que entrarão em contato. Em seguida, aperto-lhe a mão, agradeço a atenção e oportunidade, lhe informando que ficarei aguardando seu telefonema, que por ventura será feito, claro, por outra pessoa.
Despeço-me dele, em seguida da recepcionista e assim mais calma, já com sensação de honra ao mérito vou para casa aguardar o telefonema, que para minha não surpresa toca duas horas após, com o sim e convite a fazer parte da organização. O furacão de sentimentos felizes parecem chegarem todos de uma só vez. O tão sonhado emprego consegui. As horas de treino em frente ao meu espelho valeram a pena. Agora, é só fazer cumprir com o que prometi e esperar retorno desse início de relação interpessoal e profissional. Vitória é o sabor do fruto emprego, colhido com muito cuidado e preparo, tanto emocional, quanto educacional. Poucos entendem isso e terminam sendo infrutíferos. Ainda bem que fiz o contrário, colocando em prática os anos de ensinamentos feitos pela escola e minha família. Quem faz isso nunca fica sem fruto.
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