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20 minutos e ponto final
Alice Isabel

Resumo:
A pressa da personagem tem um ponto final inesperado.

07h:40min.
Vinte minutos até a hora de sair, pensa ela ao olhar o relógio. Ficara acordada toda noite. Desde o amanhecer tomava xícaras e xícaras de café para manter-se desperta e conseguir sair para trabalhar.
Só dezenove minutos agora.
Vai ao banheiro, despe-se e entra no box, toma uma ducha fria, seca o corpo, larga a toalha no chão, veste jeans, camiseta e sapatilhas. Não seca os cabelos, pois logo já não terá mais do que uns 15 minutos até ficar pronta.
Pega o notebook que lhe fizera companhia na madrugada infindável, acessa seu e-mail, abre uma nova mensagem, tecla o nome dele no destinatário e começa a escrever.
Não esqueceu das últimas palavras ditas por ele na noite anterior e uma frase não sai de sua cabeça: “O amor a gente engole”, gritara ele, vestindo o casaco, pegando as chaves do carro e fechando a porta.
“Como assim? A gente engole um amor? Assim, como? ” Ela divagava...
Ela não queria terminar daquela forma. Na verdade, ela não imaginou sua vida sem ele.
Depois de algum tempo parada olhando a porta fechada, ligou no celular dele. Umas duas, três, infinitas vezes. Ele não recebia. Sinal fora de área. Esperou mais um tempo. Ligou no telefone da casa e a mesma coisa. Ele não atendia. Esperou mais um tempo do tempo que havia esperado, enviou uma mensagem, duas, três. Ele não respondia. No meio da madrugada desistiu de ligar. Desistiu de escrever mensagens. Desistiu de dormir. Desistiu...
07h:50min.
“Creio que me iludi. Me atirei ao amor como alguém que se joga em um mergulho sem fim. ” Pensava ela agora ao mesmo tempo em que digitava rapidamente diante da tela.
“Eu não estou bem e não me fiz entender. Mas eu tenho este defeito de muitas vezes não dizer tudo que estou pensando ou sentindo. Por não querer incomodar ou não querer empatar a outra pessoa com minhas amolações todo tempo. Eu possuo esta falha de não falar por medo de ser mal compreendida, por receio de que não tenham paciência de me escutar... por pânico de algo que possa interromper o que existe de bom na minha vida”, continuava ela batendo no teclado freneticamente. “Agora penso que tens razão. Não há nada mais o que falar. Chego a acreditar que tu ponderas melhor do que eu. Resolve as coisas melhor do que eu. Toma decisões melhor do que eu. Falastes tudo que tinha para ser dito. E eu ali tentando achar uma saída e tu já a tinhas determinado, mas eu não queria enxergar. Não desejava ver os fatos que tu apontavas tão racionalmente. Eu não queria... pela simples razão de que não sei engolir um amor. E isso era uma das coisas que eu tinha para dizer. Mas tu não me escutavas mais e eu já nem gritava mais. Então agora me conta como se engole um amor? Qual é o segredo para se afogar um amor e tocar a vida como se ele não houvesse existido. Qual a fórmula para que se desapareça com um sentimento de tanto tempo e que não enfraqueceu. Qual o caminho a seguir depois de escutar que tu não querias mais outro amor na vida e depois de alguns dias, tu não desejares cuidar deste amor... me conta como se engole um amor. Com água? Aguardente ou outra bebida qualquer... com um café amargo ou um chá de ervas? Com lágrimas? Remédios ou uma viagem... Conta, pois eu não sei. Só o que sei é que já não sei o que dizer de tudo isso. Sinto muito, porém não me sinto culpada sozinha. Nunca há um único culpado em uma situação. Onde existem duas pessoas envolvidas, cada uma tem suas razões e suas argumentações, mas quando um dos dois não deseja mais resolver a questão, então não há mais o que se falar. Estou confusa, triste e chateada. Não consigo racionalizar e nem sei mais o que escrevo. Depois que passar toda a desordem na minha cabeça e toda a tristeza no coração, vou encontrar um jeito de engolir o amor... ou não! Mas isto não depende mais de mim. Depende de nós. De ti. Especialmente de ti. Só que já se passaram horas e o teu silêncio me respondeu. ”
07h:55min.
E o silêncio, que diz tudo e não diz nada, não foi suficiente para ela. Deixou o texto ali, incompleto, sem assinatura e salvo na pasta de rascunho. Estava atrasada. Pegou a bolsa, as chaves do carro e o casaco. Saiu batendo a porta, as janelas abertas e as cortinas ao vento. Desceu as escadas correndo e entrou no hall da garagem. Tinha em mente só o trajeto que faria e estava decidida a descobrir como se engole um amor. Ligou o carro, deu marcha ré, depois primeira, manobrou em direção à saída do prédio, abriu o portão da garagem com o controle e saiu sem olhar para a direita ou para a esquerda. Só sabia a rua para onde iria, visualizava o edifício de fachada moderna e o número do apartamento que iria digitar no interfone.
08h:00min.
O barulho que se escutou a seguir foi ensurdecedor. Um acidente em frente ao prédio em que ela morava seria notícia de capa do jornal da tarde: “Choque entre veículos causa a morte da motorista do automóvel no local. A mulher saia da garagem de seu prédio e provocou a colisão com um caminhão de entregas”.
Ela esquecera o celular sobre a mesa do corredor e, entre tantas mensagens enviadas naquela madrugada, uma havia sido respondida. Com a pressa de sair ela não leu. Dizia: “Vamos almoçar juntos? Estou chateado, triste e confuso. Posso te buscar às 13h? Eu não consigo engolir todo este nosso amor. Me perdoa por ontem. Beijos. Te amo.”


Biografia:
Escritora amadora.
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