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TRÊS MULHERES, TRÊS ESCOLHAS
n-
SUELI COUTO ROSA

Resumo:
A partir de uma frase de Mia Couto criou-se três contos sobre três mulheres diferentes.

TRÊS MULHERES, TRÊS ESCOLHAS

Há mulheres que procuram um homem que lhes abra o mundo. Outras buscam um que as tire do mundo. A maior parte, porém, acaba se unindo a alguém que lhes tira o mundo.
Mia Couto in Contos do nascer da terra.

Conto 1-Cora
Cora nunca havia se casado. Apaixonou-se, algumas vezes, por homens mais pobres, não bem vistos por sua família abastada. Precisou desistir deles ou foi abandonada por eles. Seu temperamento controlador e manipulador a afastava das pessoas. Mesmo aquele que mais a amou não suportou sua impertinência! Partiu para a grande cidade e a deixou rancorosa.
Cora não era bela, mas tinha certo encanto. Pequena, magra, de rosto fino e nariz um tanto romano, se destacava por seus olhos miúdos e próximos. Quando menina havia tido um pequeno estrabismo, o que contribuía para um certo charme no olhar. Assim, Cora se sentia bela, mais bela e poderosa que suas amigas e primas. Esta era sua força, embora também, sua fraqueza. Porque Cora era arrogante e tinha dificuldade em ser doce e gentil. Isto só acontecia diante de pessoas poderosas ou com dinheiro. Cora não tinha consciência de seu temperamento bipolar. Para ela era tudo ou nada. Tudo, desde que do jeito dela e nada, que significava sempre, uma certa vingança. Cora nunca perdoava.
Foi assim que Cora conheceu um homem poderoso, bem mais velho e casado. Aproximou-se como que buscando conselhos e envolveu-se de tal forma que o único jeito de tê-lo definitivamente seria tendo um filho com ele. O homem poderoso a rejeitou e não assumiu o filho. Sua família desesperou-se. Ela não estava pronta para ter um filho fora do casamento. Cora, teimosa e dominadora, teve seu filho que acabou sendo criado pela avó. Porém, Cora não perdoou o pai de seu filho. Passou a maior parte de sua vida processando-o para obter sua compensação. Cobrava o amor fracassado com a única forma que lhe parecia justa. Dinheiro. Ganhou na justiça, mas perdeu a chance de ser feliz com seu filho. Este, por mais que desejasse, nunca conseguiu conviver com ela. Cora nunca conseguiu viver como desejava. Nunca ficou pobre, mas também nunca se rodeou de amigos que a amassem. Sua escolha a tirou do mundo. Cora, hoje, está em um asilo, revoltada e abandonada.

Conto 2-Paulina
Paulina era uma mulher que esperava muito da vida de casada. Seu sonho era encontrar seu grande amor e casar-se em grande pompa! Para isto, definiu muitas formas de encontrá-lo, na verdade, caçá-lo. Mesmo não sendo de uma família com muito dinheiro, Paulina fingia que isto não a afetava. Ela precisava encontrar um jeito de sair daquela pequena cidade e daquela vida pequena, sem pompas. Um bom casamento seria a saída.
Paulina gastava muito em salões de beleza e novas roupas. Seu pai, um mecânico, não sabia mais como fazer para pagar o cartão de crédito. Paulina dizia que era um investimento nela. Paulina era bonita, chamava a atenção por ser magra, alta e de cabelos e olhos claros. Não gostava de estudar, mas era inteligente a ponto de perceber, rapidamente, as fraquezas dos outros, principalmente dos homens. Sabia jogar seu charme e tirar suas concorrentes do caminho. Por isso Paulina precisava estar nos lugares onde seu futuro marido estaria. Havia apenas um caminho: frequentar lugares chiques e se fazer passar por uma pessoa com dinheiro.
A ‘internet’ seria o caminho. No seu perfil, as fotos a apresentavam sempre linda, bem vestida, em locais de beleza e de lazer. Aprendeu a fazer “Photoshop” para se mostrar nos lugares mais destacados. Foi assim que conheceu Roberto. Ele também, além de bem-apessoado nas fotos, dizia ser um grande investidor, que viajava pelo mundo. Paulina tudo fez para conhecê-lo. Convenceu o pai para enviá-la para a capital, para fazer um curso. Hospedou-se com parentes e marcou o encontro no café de um grande e reconhecido hotel. Ela faria de tudo para conquistar Roberto. Mostrou-se uma excelente atriz e convenceu-o de que era uma pessoa de posses, que seu pai possuía uma rede de agência de carros no interior e que ela estava ali para buscar novos investidores. Paulina era esperta. Preparou-se muito bem para não deixar falhas em sua encenação.
Roberto logo se interessou por ela. Os encontros foram calorosos e envolveram-se de verdade. Paulina, convenceu os pais a fazer o casamento sonhado. Seu pai se endividou e comemorou o casamento em um hotel de uma cidade vizinha, com todas as pompas. Roberto parecia amar Paulina e também mostrava ser um homem de posses. No entanto, não trouxe muitos familiares ao casamento. Alegou que todos viviam fora do país.
A vida dos dois era focada neles: sexo, viagens e mentiras. Uma noite, depois de passarem mais de um mês em um hotel, Roberto disse que iriam pegar o trem para um novo lugar. Voltariam dali a dois dias. Sem malas. Paulina, como sempre, o seguiu. Chegaram a uma nova cidade. Comeram em um restaurante e Roberto a convenceu a saírem sem pagar, como se fosse uma brincadeira. Dormiram em um hotel mais simples, desta vez. Saíram sem pagar. Agora, viviam fugindo. Roberto descobriu que Paulina não tinha dinheiro. Discutiram e foram para uma nova estação de trem. Roberto colocou Paulínia sentada em um banco e disse que iria comprar as passagens. Nunca mais apareceu. Deixou Paulina, ali esperando, com frio, com fome e sem ter para aonde ir. O mundo de Paulina desabou.
Conto 3-Sônia
Sônia já tinha uma vida profissional, bem sucedida e nunca havia em viver de sonhos. Era uma mulher de pé no chão, voltada mais para o trabalho e aos pais. Sônia não era bonita, porém não era feia. Tudo nela revelava sua personalidade forte e organizada. Das roupas ao modo de se pentear tudo revelava uma mulher prática, moderna, objetiva. Sempre no mesmo peso, cabelos longos e sempre em ordem, roupas de marca, mas sem nenhuma ostentação, carro sempre novo e boas amizades de trabalho.
Quando mais jovem, Sônia teve um noivo. Porém, decidiu não se casar. Ele não era muito trabalhador e nem muito interessante para conviver. Na verdade, Sônia já havia encontrado o seu amor. Era um amor proibido. Alguém que era a síntese do homem ideal: lindo, bem-sucedido, de boa convivência. Porém, casado. Portanto, só podiam ser amigos e o eram. Quando podiam, falavam de suas experiências, de seus desejos e perceberam que ambos queriam a mesma coisa da vida: planejar o futuro para viver com conforto. Porém, seu amigo lhe contou um desejo: se pudesse, queria conhecer o mundo, outras culturas, outros lugares. Para o seu amigo, a velhice devia ser como encontrar o cais depois de uma longa viagem.
Entretanto, para Sônia, realista, a vida tinha que seguir seu ritmo, porém sem riscos. Afastou-se um pouco do amigo para não ter ilusões. Não queria viver um amor platônico. Era preferível ficar só. Aquele amigo lhe mostrava o mundo sob outro prisma, porém preferia enfrentar a sua realidade. Não adiantava pensar em um homem casado.
Os anos se passaram. Sônia foi sentindo que faltava algo em sua vida. Faltava tempero, sal. Tudo era muito rotineiro porque tudo estava em ordem. Perguntava-se sempre: o que está faltando se já fiz tudo como planejei? Para Sônia, o inesperado e o fora do contexto era sempre ruim. Não se sentia segura. Entretanto, agora estranhava este sentimento de vazio. Afinal, não fez tudo como queria?
Como a vida não avisa, o inesperado aconteceu. O seu amigo apareceu na porta de sua casa. Como quem não quer nada, lhe disse que ficou viúvo há um ano. Havia se aposentado e deixado os seus filhos bem. Agora, queria completar sua vida a seu modo. Disse, inclusive, que achava que não ia viver muito tempo mais e que desejava realizar seu plano final. Viajar pelo mundo. Ela estaria disposta a ir com ele?
Sônia percebeu que este homem era o único capaz de fazê-la balançar suas convicções. Contudo, será que valia a pena correr o risco e viver o desconhecido?

Sueli Couto Rosa, Setembro 2020


Biografia:
Socióloga, professora universitária aposentada, escreve poesias, crônicas e contos, aproveitando seu tempo livre.
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